Paris e Berlim criam um grupo de trabalho bilateral para reformar a União. O novo organismo conjunto tomará decisões "sobre Espanha e Grécia"
Angela Merkel e François Hollande |
Assim que voltou de suas férias, Hollande decidiu reconstruir o eixo franco-alemão. Desse modo, as duas capitais, Berlim e Paris, formarão um grupo de trabalho bilateral e permanente, que segundo o ministro da Fazenda francês, Pierre Moscovici, tomará "decisões sobre a Grécia e a Espanha" e sobre as reformas estruturais da zona do euro.
À falta de conhecer os resultados, o movimento limita o funcionamento do diretório que foi conhecido como Merkozy e que manejou de maneira errática e autoritária as rédeas europeias nos últimos cinco anos. "O giro foi decidido. Voltemos à situação anterior, quando França e Alemanha eram o motor da UE. A fase das bravatas de uso eleitoreiro terminou", afirmou na quarta-feira (29) uma fonte do Ministério da Fazenda francês, no sempre bem informado semanário "Le Canard Enchainé".
O semanário confirmava assim o adiantado pelo jornal "Le Monde": Hollande e Merkel concordaram em solucionar antigas rixas e querem decidir sozinhos o futuro da zona do euro. O ressurgimento do eixo ficou discretamente amarrado entre a quinta-feira 23 e a segunda 27, durante várias visitas a Berlim da cúpula maior francesa. Primeiro Hollande se encontrou com Merkel na chancelaria, e ambos pactuaram vigiar mais de perto o governo de Atenas e negar-lhe mais tempo para aplicar os cortes. Na segunda, Moscovici, braço-direito de Hollande, se reuniu com seu homólogo, Wolfgang Schäuble, em Berlim e ambos projetaram um método de trabalho para as próximas semanas e meses.
O grupo de trabalho terá duas cabeças visíveis, como na fase Merkozy. Segundo publica "Le Monde", serão Ramón Fernández, diretor do Tesouro e um sarkozista de origem mexicana, e o secretário de Estado alemão, Thomas Steffen.
Depois de insistir durante semanas em que são os 27 membros da União Europeia e que são as instituições europeias que devem decidir juntos o destino do continente, o discurso dos socialistas franceses remete agora aos estribilhos do antigo regime. "O grupo bilateral se encarregará de refletir sobre a implementação das decisões sobre a Grécia e a Espanha", manifestou-se Moscovici na última segunda-feira, reforçando a imagem excludente do diretório Merkhollande. O objetivo, acrescentou o ministro, é levar a "uma posição comum o Conselho Europeu de 18 e 19 de outubro" e que "França e Alemanha sejam os pilares das reformas estruturais" da zona do euro.
A aliança, na realidade, começou a ser forjada durante a última cúpula de Bruxelas, quando Paris e Berlim decidiram dividir a presidência do Eurogrupo. Se Merkel for reeleita no próximo ano, Schäuble e Moscovici serão os próximos responsáveis pelo fórum de ministros do euro durante os próximos cinco anos. Ambos assumirão o lugar do atual presidente, o luxemburguês Jean-Claude Juncker, quando este se retirar. Schäuble e Moscovici exercerão dois anos e meio cada um.
A um ano das eleições federais alemãs, previstas para setembro de 2013, a impressão palpável em Paris é de que a chanceler aumentou a pressão sobre a frágil França para impor uma solução alemã à crise europeia. Em curto e longo prazo. Parece evidente que Merkel quer reforçar os tratados e a unidade da zona do euro enquanto pilota com mão de ferro a crise grega e espanhola para salvaguardar os interesses dos bancos alemães.
A simbiose vai ganhando corpo e Hollande se expressa com palavras cada vez mais parecidas com as que pronuncia Merkel. Na segunda-feira, falando no Palácio do Eliseu diante de seus embaixadores, indicou que "a vontade francesa é que a Grécia continue no euro" e que "o euro é irreversível", e acrescentou que uma maior "integração solidária" deve levar "à união política" da Europa.
A incógnita passa por saber o efeito que a volta do eixo terá sobre os países apurados pela crise. Até agora, Hollande parecia se comportar diante da chefe alemã como paladino do crescimento, açoite da austeridade e voz da esquerda e do sul. No entanto, hoje dá a impressão de que é mais contrário a defender a Grécia e a Espanha do fundamentalismo do Bundesbank.
Uma razão é que os últimos dados (crescimento zero pelo terceiro trimestre consecutivo e 41.500 desempregados a mais em julho, em um país com cerca de 5 milhões de desempregados ao todo) agravam o panorama francês. Por outro lado, as pesquisas situam o índice de popularidade de Hollande abaixo de 50%.
Outro motivo alegado - como revela o semanário "Le Canard Enchainé" é que seu primeiro-ministro, o germanófilo Jean-Marc Ayrault, teme que um distanciamento da Alemanha seja catastrófico para os interesses de Paris: "Bastaria uma declaração desagradável de um dirigente alemão sobre nossas previsões de crescimento para que a França fosse castigada pelos mercados".
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