Jyrki Katainen |
Numa entrevista à Spiegel, o primeiro-ministro finlandês, Jyrki Katainen, 40, urge os países sul-europeus afetados pela crise a dar uma licença bancária para o fundo de resgate do euro. A eurozona, diz ele, é como uma família em que alguns membros quebraram sua promessa de respeitar as regras.
Spiegel: Sr. Primeiro-ministro, muitas pessoas acham que vários países têm de sair da eurozona. Elas estão certas?
Katainen: Posso entender esse sentimento. Mas ainda espero que isso não aconteça. Seria um grande salto no desconhecido. Todos nos beneficiaremos se isso não acontecer.
Spiegel: Mas a ansiedade está aumentando. Seu colega italiano Mario Monti disse numa entrevista à Spiegel na semana passada que muito controle democrático dos governos por parte dos parlamentos nacionais tornou “mais provável” que a Europa se divida. Esta também é sua visão?
Katainen: Não. Nós na Finlândia discutimos abertamente os vários aspectos no parlamento. Esta é a essência da democracia. Não há diferença entre a posição do governo e a posição da maioria do parlamento.
Spiegel: O primeiro-ministro italiano reclamou especificamente da Finlândia. Se um governo que comparece a uma reunião de cúpula da UE para salvar o euro segue a linha estabelecida por seu parlamento de uma forma “inteiramente mecânica”, então isso deixa o euro em risco, ele alega.
Katainen: A posição do governo finlandês não será diferente sem parlamento. Nós somos a favor de usar dinheiro do fundo de resgate europeu da forma mais eficiente possível. Sustentamos essa posição no parlamento e somos apoiados pelos parlamentares.
Spiegel: No parlamento finlandês, há um forte partido de oposição que se autointitula Verdadeiros Finlandeses. Ele está urgindo a Finlândia a deixar a eurozona e a UE.
Katainen: Os Verdadeiros Finlandeses não têm influência sobre a posição do governo. Mas até este partido não está mais pedindo uma retirada da eurozona. Isso é, em todo caso, o que ele disse em resposta à minha pergunta no parlamento quando o último pacote de resgate foi aprovado. De acordo com a última pesquisa de opinião, dois terços de todos os finlandeses eram a favor do euro. Mas é claro que estamos preocupados com o tamanho dos pacotes de resgate europeus.
Spiegel: Vocês não têm que se preocupar porque são o único país na Europa que negociou acordos colaterais com a Grécia e a Espanha em troca de ajuda financeira.
Katainen: Quando formamos nossa coalizão de governo há mais de um ano, sentimos que era necessário limitar nossas reivindicações sobre outros países europeus. Temos que pagar um preço pelo colateral no que diz respeito ao fundo de resgate do ESM (Mecanismo de Estabilidade Europeia), em contraste com outros países, temos de pgar nossa fatia inteira em uma parcela. Nós ficamos do lado do euro. Só pedimos tratamento especial no que diz respeito ao colateral.
Spiegel: Outros países também não teriam objeções a efeitos colaterais em troca de mais alguns bilhões de ajuda. Mas você acha que é realista que todos recebam colateral suficiente por seus resgates?
Katainen: Minha resposta honesta: provavelmente não. Mas pode ajudar a resolver o problema se os países em dificuldades emitirem títulos cobertos que sejam apoiados por um colateral pertencente ao estado. Temos que fazer tudo o que está em nosso poder para que a Espanha e a Itália continuem a receber dinheiro no mercado privado de capital.
Spiegel: A Finlândia também estava em crise nos anos 90 e, graças a esses títulos colateralizados, conseguiu sair sem ajuda externa.
Katainen: Correto. Nós usamos títulos de propriedade da agência nacional de financiamento de habitação como colateral, e isso permitiu que reduzíssemos significativamente as taxas de juros. Além disso, conseguimos cortar os gastos públicos em 10% da produção econômica dentro de um curto período de tempo. Nunca esqueceremos esta experiência formativa.
Spiegel: Será que a Espanha e a Itália também conseguirão emergir da crise por conta própria?
Katainen: No mínimo, a proposta que fizemos na última cúpula da UE poderá ajudar. No momento, provavelmente não vale a pena para os países em dificuldade vender títulos estatais quando os preços estão tão baixos. Em vez disso, eles podiam usar esses holdings para garantir empréstimos e mais tarde vendê-los no mercado.
Spiegel: Monti recentemente o visitou. O que ele teve a dizer sobre sua proposta?
Katainen: Ele não se comprometeu. A Itália e a Espanha estão introduzindo reformas estruturais grandes que simplesmente não estão sendo reconhecidas no mercado. Títulos cobertos poderiam ser uma solução aqui para fazer uma ponte num período incerto até que o mercado reconheça as reformas.
Spiegel: A Espanha atualmente tem a oferecer taxas de juros de quase 7% em seus títulos soberanos de longo prazo. Os espanhóis estão pedindo uma solidariedade mais significativa por parte dos europeus. Os finlandeses estão preparados para oferecer isso?
Katainen: As taxas de juros são injustas em relação às reformas que os espanhóis introduziram ou, pelo menos, anunciaram. Então temos de pensar o que podemos fazer para combater o pânico nos mercados.
Spiegel: Por exemplo, a compra de títulos soberanos, que a Finlândia até agora rejeitou?
Katainen: Nós temos uma visão muito crítica disso. O Banco Central Europeu comprou títulos soberanos no mercado secundário – e isso só ajudou brevemente em cada ocasião. Nós não estamos sendo anti-europeus ao rejeitar isso. Precisamos encontrar outras formas e meios. As soluções precisam ser eficientes e sustentáveis.
Spiegel: Apesar de centenas de bilhões de euros que os europeus juntaram, o fundo de resgate será usado rapidamente se, digamos, tiver de resgatar a Espanha.
Katainen: Em pouco tempo, teremos um debate sobre como poderemos apoiar mais a defesa. Não podemos esperar isso razoavelmente de nossos cidadãos. Precisamos usar o dinheiro disponível da forma mais inteligente possível.
Spiegel: Você pode imaginar o financiamento direto de países como a Espanha através de compras de títulos no mercado primário por parte do ESM?
Katainen: A compra de títulos soberanos no mercado primário poderá ser parte de uma solução sustentável.
Spiegel: O euro foi pensado originalmente para unir as pessoas da Europa. Agora, ele está forçando a Europa a se dividir no norte orientado para a estabilidade e no sul que está pedindo cada vez mais dinheiro.
Katainen: A Europa é como uma família na qual todos os membros prometeram respeitar as regras. A crise revelou que isso não aconteceu. Nós finlandeses achamos isso injusto. Não se esqueça que muitos finlandeses também foram afetados pela crise e estão desempregados. Nós estamos pedindo portanto regras mais rígidas e um monitoramento maior de direitos para a Comissão Europeia em Bruxelas. As pessoas precisam sentir que as coisas estão sendo feitas de uma forma justa.
Spiegel: Em reação à crise, grandes planos estão sendo feitos atualmente em Bruxelas. Estados membro devem desistir de uma certa quantidade de soberania, e algumas pessoas estão pedindo um ministro europeu das finanças. Você acha que isso é uma coisa boa?
Katainen: Sou contra novas instituições. Com frequência, nós tentamos resolver os problemas europeus com novas agências. É a Comissão Europeia que precisa ser fortalecida. Quando os países não aderem às regras, ela precisa intervir. Todas as regras do jogo precisam ser respeitadas. E cada estado precisa assumir a responsabilidade por sua própria economia.
Spiegel: Na última cúpula da UE em Bruxelas, houve uma coalizão efetiva formada pelos países do sul, que buscou conseguir mais dinheiro e garantias do norte. Não chegou a hora de criar uma aliança do norte composta pela Finlândia, Alemanha e Holanda, que são por fim os países que devem pagar?
Katainen: Sou a favor da unidade europeia. Mas é natural que os países com interesses semelhantes falem uns com os outros. Precisamos de uma Europa sustentável. Ficamos muito preocupados quando os fundos de resgate do euro são usados de forma ineficiente. Foi isso que eu também disse para Monti. Eu não sei se ele concorda. Mas ele conhece nosso ponto de vista.
Spiegel: O que você acha da ideia de dar uma licença bancária ao ESM, o que daria a ele um poder de fogo ilimitado para salvar a Europa?
Katainen: Somos contra isso. Uma licença bancária significaria que não haveria mais nenhum limite. Ela aumentaria o fardo para um grau que a ajuda não mais teria crédito. Eu acho que não há truques simples para resolver a crise.
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