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quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Como o Iraque subsidia o Estado Islâmico

O Estado Islâmico gera toda sorte de fundos para financiar seu império terrorista – contrabandeando petróleo, cobrando impostos dos moradores locais, saqueando tesouros arqueológicos e pedindo resgate por reféns. Mas a principal fonte de receita geralmente não é mencionada: os fundos destinados aos funcionários públicos iraquianos.

Pelo menos 5 milhões de pessoas são empregadas pelo governo iraquiano e é razoável presumir que uma parte significativa do orçamento de US$ 102 bilhões do Iraque para 2015 será destinada aos salários e pensões desses funcionários públicos. E dezenas de milhares de funcionários do governo ainda recebem salários de Bagdá, apesar de viverem e trabalharem em cidades controladas pelo Estado Islâmico. Entre eles estão médicos, professores, enfermeiros, farmacêuticos e todo o espectro de funcionários municipais.

Apesar da partição do país, a maioria desses funcionários públicos iraquianos continua comparecendo ao trabalho como antes. Segundo o jornal árabe "Asharq Al-Awsat", com sede em Londres, os funcionários dos departamentos elétrico e de água da cidade de Fallujah, controlada pelo Estado Islâmico, cumprem suas funções regulares sem serem molestados pelos seus novos governantes.

E funcionários públicos ainda precisam ser pagos. Por exemplo, Bagdá fornece cerca de US$ 130 milhões todo mês para pagamento de todos seus funcionários em Mosul, segundo o chefe do comitê de finanças do conselho provincial de Nineveh, que foi forçado a fugir após a tomada pelo Estado Islâmico. Podemos estimar que o tesouro iraquiano pagou mais de US$ 1 bilhão a esses funcionários desde a queda da cidade, em junho.

O sistema financeiro oficial caiu desde que a milícia jihadista assumiu o controle dos bancos, de modo que emissários do departamento são enviados a território iraquiano ou curdo. Eles coletam o dinheiro dos salários e voltam para distribuí-lo.

Esse transporte regular por indivíduos de confiança se tornou rotineiro em alguns lugares, mesmo nas linhas de frente. Referindo-se a essas práticas, um oficial iraquiano controlando um posto de controle militar fora de Fallujah notou recentemente: "Há uma estranha coexistência entre o EI e as autoridades do governo".

Evidentemente, o Estado Islâmico gera renda significativa ficando com parte desse tráfico de dinheiro. Segundo a estimativa de um pesquisador, o Estado Islâmico confisca até 50% dos salários dos funcionários públicos. Naturalmente, a organização monitora as distribuições: em um bairro de Mosul, por exemplo, um guarda jihadista é designado a aguardar pelo retorno do indivíduo de confiança com o dinheiro. O trabalho dele é ficar com a parte "daqueles que não aparecem".

Por que Bagdá persiste com esse sistema? Afinal, a maioria dos funcionários públicos xiitas ou outros não sunitas no território mantido pelo Estado Islâmico foi assassinada ou forçada a fugir, deixando para trás os funcionários sunitas, alguns dos quais podem até apoiar os militantes.

Há uma justificativa humanitária, já que esses salários ajudam as pessoas a sobreviver no inverno, mas o Iraque também alega que precisa mostrar que não abandonou seus funcionários públicos. Mas é difícil aceitar esse argumento, considerando que os funcionários curdos ficaram sem salário por um ano devido às disputas por petróleo que, por um tempo, levaram Bagdá a congelar os fundos destinados ao Governo Regional do Curdistão.

Também pode haver uma explicação cultural mais profunda presente no Estado iraquiano. Apesar da turbulência ao longo da última geração, a mentalidade socialista do Partido Baath de que o emprego público é um emprego vitalício protegido ainda está profundamente arraigada na sociedade iraquiana. Cortar todos esses funcionários é anátema para o espírito dessa cultura. A inércia burocrática é uma força poderosa.

Todavia, Bagdá está gastando uma boa parte de seu orçamento para manter à tona um sistema frágil que beneficia seu inimigo mais temido. Além de fornecer dinheiro ao Estado Islâmico, essa política também permite que os hospitais nas áreas ocupadas permaneçam abertos (mesmo que carentes de suprimentos médicos), apesar de agora atenderem principalmente os combatentes jihadistas.

Há vários passos que Bagdá poderia dar para bloquear esses fundos. Cortar imediatamente milhares de funcionários públicos causaria grandes dificuldades, especialmente agora que o combustível para aquecimento está escasso. Mas uma ação que o governo iraquiano poderia tomar seria depositar esses salários em juízo, que poderiam ser sacados quando os funcionários fugissem permanentemente do território do Estado Islâmico.

Outra medida seria obrigar cada indivíduo a receber sua renda pessoalmente junto ao governo iraquiano. Isso causaria um caos no fluxo de receita do Estado Islâmico. Outra tática seria persuadir as tribos sunitas a exigirem que o Estado Islâmico reduza sua parte, causando dissidência dentro do território do Estado Islâmico.

Todas essas políticas correm o risco de submeter pessoas inocentes, pegas em uma situação já terrível, a dificuldades ainda mais graves. A solução real, é claro, é retirar essas cidades do controle do Estado Islâmico.

Estrangular os recursos financeiros do Estado Islâmico é uma das formas de degradar o grupo e, no final, destruí-lo. A organização jihadista já está sofrendo com os preços mais baixos do petróleo e o dinheiro que pode extorquir da população local em dificuldades é limitado. Isso torna ainda mais importante deter o rio de dinheiro que flui de Bagdá para o serviço público controlado pelo Estado Islâmico. É uma situação politicamente insustentável que deve ser impedida de um jeito ou de outro.

(Aki Peritz é um ex-analista de contraterrorismo da CIA e coautor de "Find, Fix, Finish: Inside the Counterterrorism Campaigns that Killed bin Laden and Devastated Al Qaeda".)

*O artigo acima não traduz a linha de raciocínio desse blog.

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