"Guernica, cidade de 5.000 habitantes, foi literalmente arrasada. Crateras de bombas podem ser vistas nas ruas. Simplesmente maravilhoso", escreveu o comandante da Legião Condor, Wolfram von Richthofen, sucintamente em seu diário. Não havia nenhuma palavra sobre as centenas de mortos.
Ondas de bombardeiros e caças se seguiram. Eles lançaram explosivos, bombas de fragmentação e bombas incendiárias; um total de 31 toneladas de munições caiu sobre Guernica naquele dia. Por duas horas e meia, aviões de guerra alemães e italianos bombardearam a cidade, "com uma brutalidade que nunca tinha sido vista antes", como disse o presidente da "República Autônoma" Basca Jose Antonio de Aguirre, três dias mais tarde. "Eles queimaram a cidade e usaram metralhadoras contra as mulheres e crianças, que fugiam em pânico, resultando em diversas mortes."
Juntando as pessoas para a matança
Juan Guezureya lembrou-se da tarde devastadora em uma entrevista no ano de 1974 com dois repórteres britânicos: "Os dois aviões voavam de um lado para o outro, de uma altura de cerca de 30 metros, como pastores alemães voadores tocando a manada de pessoas para a matança."
De acordo com uma reportagem de guerra de George L. Steer, no jornal Times de Londres dois dias depois, a estratégia parecia clara. Primeiro, escreveu, bombas pesadas e granadas foram lançadas para deixar as pessoas em pânico. Depois, os tiros de metralhadora para levá-las aos subterrâneos. Finalmente, as bombas incendiárias para destruir seus esconderijos.
As conseqüências do ataque foram aterrorizantes. Quase três quartos dos prédios da cidade foram destruídos, e o centro foi quase completamente aniquilado. "Quando entrei em Guernica, após meia noite", escreveu Steer em seu relatório, "as casas estavam caindo de todos os lados, e era totalmente impossível, até para os bombeiros, entrarem no centro da cidade. Os hospitais Josefinas e Convento de Santa Clara eram montanhas luminosas de brasas, e as igrejas, exceto a de Santa Maria, foram destruídas; as poucas casas que ainda estavam de pé estavam condenadas. Quando voltei a Guernica naquela tarde, a maior parte da cidade ainda estava queimando, e novos incêndios tinham se iniciado. Cerca de 30 mortos estavam jogados no hospital arruinado."
O número de vítimas é apenas estimado. O governo basco disse que 1.654 moradores haviam sido mortos e 889, feridos. Investigações posteriores admitem um total muito mais baixo - entre 200 e 300 vítimas. O que está claro, entretanto, é que Guernica foi uma das primeiras cidades a ser destruída por um bombardeio - um ataque que não tem preocupação com mulheres, crianças ou idosos. Três anos antes da destruição do Coventry e oito anos antes da explosão de Dresden, os pilotos da Legião Condor romperam o preceito militar básico de não atingir os civis.
Violação gritante
"Para a força aérea alemã, Guernica foi um teste de como se pode disseminar o horror e o sofrimento com ataques a cidades", disse ao Spiegel Online Wolfgang Schmidt, especialista em aeronáutica do Instituto de Pesquisa em História Militar em in resultandocidade e usaram metralhadores contra as mulheres e criancas as e a morte choveu na cidade.
ram em Potsdam. "É claro que o bombardeio de Guernica foi uma violação gritante de direitos humanos e teve caráter terrorista. Era fato aceito que civis seriam vítimas."
O repórter Steer escolheu palavras mais explícitas para descrever o ataque: "A ofensiva contra Guernica não tem paralelos na história militar", escreveu no Times. "Guernica não era um objetivo militar. Uma fábrica próxima à cidade que produzia material de guerra não foi atingida. O objetivo do bombardeio era aparentemente a desmoralização da população civil e a destruição do berço da raça basca."
A reação internacional que se seguiu ao ataque foi intensa. O mundo todo queria saber quem havia sido o responsável pelo ato vergonhoso. Os nacionalistas, liderados pelo subseqüente ditador espanhol Francisco Franco, alegaram que os republicanos em fuga haviam destruído a cidade. Quando o ministro de defesa nazista Werner von Blomberg perguntou ao líder da Legião Condor quem participara do ataque, ele recebeu uma resposta audaciosa:
"nenhum alemão".
Os militares, entretanto, enviaram especialistas à cidade ocupada para coletar restos suspeitos da chuva de bombas. Os pilotos também receberam ordens para nada dizer sobre o ataque. Em um esforço para completar a farsa, o comandante da força expedicionária alemã, que ajudava Franco de forma não oficial, passou um rádio para Berlim indicando que a Legião Condor tinha atirado contra tropas do inimigo em retirada na região de Guernica e na própria cidade.
Testando táticas sob condições realistas
Quando a farsa não convenceu, o exército alemão alegou que o ataque havia sido uma necessidade tática. O alvo da operação, disseram após o fato, era meramente destruir pontes para a cidade para cortar a retirada de soldados inimigos. Mas como o mundo descobriu pelo comandante da aeronáutica na época, Hermann Göring, nos tribunais de Nuremberg após a guerra, a missão do exército na Espanha também era de ganhar experiência e prática.
Houve uma "oportunidade de testar sob fogo se o material fora desenvolvido de forma adequada", disse Göring. Em 2003, o Spiegel publicou um documento que há muito se pensava perdido, que provava que a razão principal para os alemães lutarem na península ibérica era testar armas e táticas modernas sob condições realistas.
O documento secreto foi produzido por Joachim von Richthofen, não relacionado ao seu comandante do mesmo nome. Ele escreveu um relatório para a Legião Condor sobre a eficácia de bombas alemãs, espanholas e italianas e forneceu sugestões sobre como seu desempenho poderia ser melhorado. Ele descreveu Guernica como uma operação planejada: "Primeiro vieram as bombas incendiárias, que atearam fogo em uma série de telhados". Depois, "os explosivos pesados, de 250 kg", para "destruir canos de água e assim impedir a extinção do fogo". Ele reclamou que o número de alvos atingidos não foi terrivelmente alto e poderia melhorar. Ele não disse nada, entretanto, sobre o fato de inúmeras pontes e fábricas terem sobrevivido intactas.
Desde então, ficou claro que os alemães viam a Guerra Civil espanhola meramente como um gigantesco campo de treinamento. Cerca de 19.000 soldados nazistas -oficialmente, todos eram voluntários- passaram pela zona de guerra. "Dois anos de experiência de combate são muito mais úteis do que 10 anos de treinamento em tempos de paz", resumiu um general alemão.
O comandante da Legião Condor, Wolfram von Richthofen, eventualmente chegou à posição de marechal na máquina militar de Hitler. Ele morreu semanas após o fim da Segunda Guerra Mundial. Em seu diário sobre a operação espanhola, anotou no dia 28 de abril de 1937: "À noite, chegou o relatório que Guernica havia sido totalmente destruída. Até agora, não há planos para amanhã."
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