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quarta-feira, 6 de julho de 2011

Luta nas Montanhas Nuba enfatiza fratura política no norte do Sudão

Crianças com ferimentos de estilhaços de explosão estão deitadas sobre camas de metal nos hospitais. Milhares de outras estão espremidas em cavernas e pedregosas margens de rios, fugindo dos jatos de guerra e bombardeiros que caçam no céu. Os vilarejos estão vazios, as plantações abandonadas. Ao menor sinal de um avião, as pessoas se escondem nos arbustos, em pânico.

“Apenas deite-se, ou você pode ser morto”, alertou Nagwa Musa Konda, diretor de uma organização de ajuda local, à medida que o ruído do avião se aproximava.

Apesar de um acordo assinado há poucos dias para trazer a paz para esta parte central do Sudão, o país parece estar escorregando inexoravelmente numa guerra.

Os jovens aqui nas Montanhas Nuba estão sendo mobilizados em milícias, marchando para as montanhas para treinar. Todos os carros nessa região, incluindo veículos humanitários, são cobertos com lama que serve como camuflagem contra os bombardeios incansáveis, dizem os moradores. E forças da oposição prometem levar sua luta adiante até ganharem alguma forma de autonomia, e não se detêm pela pressão do governo para oprimi-las.

“Será uma longa guerra”, disse Ahmed Zakaria, médico das Montanhas Nuba que recentemente deixou seu emprego para se tornar um guerrilheiro de oposição. “Queremos um estado secular e democrático onde possamos ser livres para nos governar. Como o Curdistão”, disse Zakaria, sorrindo. “E lutaremos por isso.”

O conflito está encobrindo um dos maiores eventos na história do país: a independência da parte sul do país e a criação de dois Sudões. Em apenas uma semana, o Sudão do sul vai se separar oficialmente do norte, na conclusão de décadas de guerra civil e anos de negociações internacionais para evitar mais derramamento de sangue.

Mas a luta nas Montanhas Nuba, que ficam no território do norte, enfatiza o quão fraturado ainda é o Sudão. As mesmas demandas que são feitas por guerrilheiros da oposição aqui foram o combustível para um grande conflito – e um grande sofrimento – em vários outros cantos do norte do Sudão, onde o governo está determinado a manter um poder firme sobre um país de grupos diversos clamando por seus direitos.

Nas poucas cidades dessa paisagem vasta de montanhas com curvas de nível e vilarejos de telhado de palha, o governo do norte tem reunido tanques, lançadores de foguete, artilharia e milhares de soldados e milicianos aliados, para pressionar os líderes Nuba a se desarmarem ou para se preparar para uma ofensiva logo que a chuva acabe dentro de alguns meses.

Enquanto as encostas dos morros estiverem escorregadias e lamacentas, o governo não pode fazer mais do que lançar bombas, como reconhece estar fazendo. Mas oficiais do governo dizem que sua luta é apenas contra os guerrilheiros da oposição, não contra civis, argumentando que os relatos generalizados de mortes de civis são mentiras destinadas a reunir as nações ocidentais contra o Sudão.

“O governo está tentando controlar e tomar conta das pessoas para dar paz e segurança e na verdade derrotar e remover todos os traços dos rebeldes da área”, disse Rabie A. Atti, porta-voz do governo. “Nós não somos contra essas pessoas.”

Mas como já mostraram há muito tempo os conflitos na região ocidental de Darfur e no sul do Sudão, as contra-insurgências costumam se espalhar muito.

Num pequeno hospital nas montanhas aqui em Lewere, uma ala inteira está cheia com vítimas que dizem que estavam num poço, pegando água, quando foram bombardeadas. A maioria é de crianças. Seus gemidos passam pelas janelas de tela, junto com os odores pungentes de solução antisséptica e carne em decomposição.

Do lado de dentro, Winnasa Steven, uma garota de 16 anos, contorcia-se numa cama. Do seu quadril, os médicos tiraram um pedaço de metal de 7 centímetros, que sua mãe guardou enrolado num papel branco.

“Estou sentindo muita dor”, disse Winnasa.

Ao lado dela, uma criança pequena chorava, com o rosto coberto por bandagens. Não longe dali, uma garotinha tomava colheradas de mingau. A mãe tentava não olhar para o buraco na perna da menina.

As tensões vêm crescendo nas Montanhas Nuba desde uma disputada eleição em maio. O candidato do partido do governo, Ahmed Haroun, que foi indiciado com acusações de crimes de guerra em Darfur pelo Tribunal Penal Internacional, conqusitou o governo do Kordofan do Sul, o estado que abriga as Montanhas Nuba, por uma margem de 6,5 mil votos de um total de 400 mil, derrotando um popular líder Nuba que antes era guerrilheiro.

O Carter Center endossou a eleição, mas as pessoas aqui protestaram, dizendo que o governo havia alterado os números porque o Kordofan do Sul é muito importante para ser perdido. Ele tem os depósitos de petróleo mais produtivos no norte e faz fronteira com o sul, o que o transforma numa base útil para as milícias que acredita-se amplamente serem armadas pelo norte. O Kordofan também tem terra fértil, minerais e goma arábica, um ingrediente de inúmeros produtos ocidentais.

Esta área tem uma história de opressão – e resistência. O povo Nuba foi escravizado por seus vizinhos há centenas de anos, bombardeado pelos britânicos e subjugado pelo norte. As pessoas aqui não são árabes como os nortenhos, e muitos são cristãos. Dezenas de milhares de guerrilheiros Nuba juntaram-se aos rebeldes do sul durante a guerra civil entre o norte e o sul. São esses guerrilheiros aliados ao sul que se recusam ao desarmamento, e os conflitos começaram em junho.

Em Kadugli, a maior cidade da região das Montanhas Nuba, muitas testemunhas dizem que o Exército Sudanês e milícias árabes aliadas foram de casa em casa, metodicamente, executando civis. Kamil Omer El Amin, um oficial de agricultura Nuba, descreveu o que aconteceu com seu amigo Philip.

“Ele dirigiu até o complexo da ONU”, disse Amin. “Os agentes da inteligência disseram-lhe para sair do carro. Ele se sentou. Eles atiraram em seu peito.”

Funcionários da ONU confirmaram o assassinato mas disseram que o número assustador de soldados do norte os deixou impotentes para impedi-lo, muito embora o assassinato tenha ocorrido do lado de fora de uma base da ONU.

Muitos profissionais Nuba fugiram para os topos das montanhas controlados pela oposição.

“Passamos duas semanas lá, bebendo uma coisa que mal se pode chamar de água”, disse Caddy Ali, que trabalhava para um projeto financiado pelo Banco Mundial.

Ali disse que o acordo assinado na terça-feira entre os líderes da oposição aliados ao sul e o governo, que delineou passos para o compromisso político e um cessar-fogo, não teve sentido algum.

“Nós nunca iremos perdoá-los agora”, disse ela. “você sabe quantas pessoas eu vi morrer bem na minha frente?”

Funcionários de ajuda humanitária disseram que centenas de civis foram mortos nos bombardeios. O Exército Sudanês também está bloqueando estradas e bombardeando pistas aéreas, essencialmente cortando o fornecimento de alimentos.

“Essas pessoas vão morrer de fome”, disse um funcionário ocidental de ajuda humanitária.

Na quinta-feira, um grupo de funcionários de ajuda Nuba parou o carro para colher alguns “deleib”, uma fruta selvagem que se parece com um coco.

“Era com isso que os guerrilheiros sobreviviam nos anos 90”, disse Zakaria.

Parece que algumas pessoas estão se preparando para viver disso novamente.

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