A nova fábrica gigante de aviões da Boeing, de US$ 750 milhões, é o orgulho da Carolina do Sul, o maior investimento individual já feito em um Estado que está mais associado a antigas fábricas têxteis do que à manufatura de ponta. Em apenas poucas semanas, 1.000 trabalhadores começarão a montar o primeiro dentre o que esperam que sejam centenas de 787 Dreamliners.
Isto é, a menos que o governo federal acabe com tudo.
Em um caso que está enfurecendo a população da Carolina do Sul e se tornou célebre entre legisladores republicanos e pré-candidatos presidenciais, o Conselho Nacional das Relações do Trabalho acusa a Boeing de se mudar ilegalmente para a Carolina do Sul, por causa das greves realizadas por funcionários sindicalizados em sua principal base de manufatura na área de Seattle. O conselho está pedindo a um juiz que ordene que a Boeing transfira a produção do Dreamliner –e os empregos associados– para o Estado de Washington.
As empresas podem, em geral, mudar uma fábrica para onde quiserem, apesar de leis federais as proibirem de fazê-lo caso a mudança envolva punir os funcionários por exercerem seus direitos protegidos por lei federal de sindicalização e greve. Em várias ocasiões, os executivos da Boeing mencionaram as greves como motivo para a mudança para a Carolina do Sul – mais diretamente, quando um disse ao “Seattle Times” que o “principal fator” na decisão foi que “não podemos arcar com uma paralisação no trabalho a cada três anos”.
A ação legal incomum, impetrada em abril em prol do principal sindicato da Boeing, se transformou em uma conflagração política, alimentada pelos profundos ressentimentos entre Norte e Sul, democratas e republicanos, trabalhadores sindicalizados e não sindicalizados, e fãs e adversários do governo.
Os pré-candidatos presidenciais republicanos condenam o caso como símbolo da agenda liberal do presidente Barack Obama, porque ele nomeou os principais integrantes do conselho das relações do trabalho. Nesta semana, Mitt Romney chamou o caso do conselho de eliminador de empregos. Newt Gingrich propôs cortar a verba do conselho e Tim Pawlenty disse que o caso lembra “a União Soviética nos anos 70”.
Em um momento de grande ansiedade econômica, o caso levanta questões sobre o papel do governo federal em promover – ou impedir – investimento corporativo e criação de empregos.
Diante de muita pressão, Obama disse na quarta-feira que não discutiria detalhes do caso, porque o Conselho Nacional das Relações do Trabalho é uma agência independente.
Mas, “de modo geral, as empresas precisam de liberdade para se mudar”, ele disse. “Nós não podemos arcar com mão-de-obra e empregadores lutando o tempo todo, em um momento em que estamos competindo com a Alemanha, China e outros países que desejam vender produtos em todo o mundo.”
Líderes empresariais e do governo no Sul insistem que o conselho das relações do trabalho está minando a vantagem competitiva da Boeing e estão particularmente irritados com o fato de as autoridades aparentemente estarem favorecendo as fábricas e trabalhadores sindicalizados.
“Este é um assunto importante, porque o desenvolvimento econômico no Sul tem acelerado devido ao aumento de fábricas não sindicalizadas”, disse Merle Black, um professor de ciência política da Universidade Emory. “Este caso ameaça diretamente o modelo de desenvolvimento econômico do Sul.”
Para a Carolina do Sul, a fábrica da Boeing significa muito mais do que apenas milhares de empregos criados direta ou indiretamente. A Boeing é uma empresa de destaque e os líderes estaduais esperam que sua presença ajude a apagar a imagem da Carolina do Sul como um local atrasado industrialmente.
“A Boeing foi um sonho que se materializou para a Carolina do Sul”, disse a governadora Nikki R. Haley em uma entrevista. “Eles vieram e trouxeram a esperança do sonho americano para este Estado, por meio da criação de empregos reais, de boa qualidade.”
Esses tipos de emprego são difíceis de aparecer na área de Charleston.
“Todo mundo com quem converso aqui está empolgado com esta fábrica”, disse um funcionário, Wayne Gravot. Em um recente dia na fábrica, que é do tamanho de 12 campos de futebol, ele e cinco colegas de trabalho estavam praticando a perfuração em fibra de carbono – um material composto leve, mas tão duro quanto metal, usado em grande parte do corpo do Dreamliner.
“É um bom emprego, um emprego seguro”, disse Gravot, 45 anos, um veterano da Força Aérea e pai de dois. Há não muito tempo, ele foi demitido de uma empresa de aparelhos médicos e não deseja ficar desempregado de novo.
O resultado do caso poderá permanecer incerto por anos, ao tramitar pelo Conselho Nacional das Relações do Trabalho e por tribunais de apelação. Se a Boeing perder, ela poderia ser ordenada a transferir sua linha de montagem do Dreamliner da Carolina do Sul para o Estado de Washington.
Como veem Haley e os representantes da Carolina do Sul no Congresso, os burocratas federais não têm direito de tomar o prêmio do Estado ou de dizer a uma empresa global onde instalar uma fábrica.
Assim como muitos republicanos, Haley considera Obama responsável. “Ele não deu um tapa apenas na Carolina do Sul; ele deu um tapa em uma grande empresa que escolheu se instalar aqui”, ela disse. “O presidente fala sobre fazer algo para criar empregos – e é a última coisa que ele está fazendo aqui.” Os integrantes do conselho, no entanto, afirmam que nunca discutiram o caso com a Casa Branca.
Para aumentar o senso de descrença entre muitos aqui na Carolina do Sul, o conselho impetrou o caso quando a nova fábrica estava quase concluída. A previsão é de que a produção tenha início em meados de julho.
O caso deriva de uma queixa impetrada no ano passado pela Associação Internacional de Maquinistas e Engenheiros Aeroespaciais, afirmando que a Boeing estava retaliando ilegalmente contra seus membros no Estado de Washington por exercerem seu direito de greve. Esses trabalhadores já entraram em greve cinco vezes desde 1977, incluindo uma paralisação de 58 dias em 2008.
Christopher Corson, o consultor jurídico dos maquinistas, disse: “A Boeing infringiu a lei e há consequências quando alguém infringe a lei”.
Os executivos da Boeing negam ter violado qualquer lei trabalhista, insistindo que o principal motivo para terem escolhido a Carolina do Sul foi custos de produção mais baixos. Na quinta-feira, um juiz de lei administrativa em Seattle negou o pedido da Boeing para que rejeitasse o caso.
Connie Kelleher, uma porta-voz dos maquinistas, disse que o sindicato não está buscando o fechamento da fábrica na Carolina do Sul. Em suas negociações de acordo com a Boeing, o sindicato sugeriu que a empresa mantenha a fábrica em operação, trazendo de volta a produção de peças transferidas para outros países para a Carolina do Sul –uma ideia que a Boeing e analistas do setor consideram irrealista.
Para os maquinistas, há muito em jogo. Eles temem que se permitirem que a produção do Dreamliner prossiga na Carolina do Sul, então grande parte da futura expansão da Boeing transcorrerá lá.
Para a Carolina do Sul, fragilizada pelo fechamento das fábricas têxteis e de móveis, a fábrica é igualmente vital.
“Essas coisas surgem na melhor das hipóteses uma vez por década”, disse Douglas P. Woodward, um professor de economia da Universidade do Sul da Califórnia. “É a maior coisa que aconteceu à Carolina do Sul desde a BMW.”
De fato, a BMW abriu perto de Spartanburg em 1994, com 1.200 funcionários. Desde então, as vagas de trabalho expandiram para 7 mil e as autoridades dizem que a fábrica já criou 21 mil empregos indiretos. A população da Carolina do Sul espera uma trajetória semelhante com a Boeing.
“Se a Boeing decolar, a Carolina do Sul decolará com ela”, disse Woodward.
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