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segunda-feira, 19 de março de 2012

Alain Juppé: "Por enquanto, uma investida militar na Síria não é uma opção"


O ministro francês das Relações Exteriores, Alain Juppé, enfatiza uma transição política na Síria e a firmeza de Paris sobre a questão nuclear iraniana.

Alain Juppé
Le Monde: O senador americano John McCain perguntou recentemente: “Quantas mortes serão necessárias na Síria para finalmente agir? 10 mil? 20 mil?”. O que o Sr. pensa a respeito?

Alain Juppé: Naturalmente, é um pesadelo. Esse regime enlouqueceu. Nós apoiamos Kofi Annan para que instaure sua missão, mas não seremos enganados pelas manobras sírias. O regime de Damasco entrou em um vale-tudo sanguinário. Continuo a pensar que por enquanto não existem opções militares. Está fora de questão nos lançarmos em uma operação dessas sem uma ordem das Nações Unidas, e as condições para uma ordem como essa não estão reunidas.

Então que outro tipo de intervenção do Conselho de Segurança podemos considerar? Acreditei ter percebido no discurso de Sergey Lavrov, ministro das Relações Exteriores russo, uma ligeira evolução. Mas, por enquanto, isso não levou a Rússia a de fato mudar e aceitar uma resolução que nos daria a base jurídica para uma intervenção da ONU.

Devo acrescentar que a situação, objetivamente, é bem diferente daquela que vimos na Líbia. Há opositores cuja atitude enfraquece gravemente a oposição - tanto que eles continuarão a brigar e se opor uns aos outros, dentro e fora. Fazemos de tudo para tentar reuni-los em torno do Conselho Nacional Sírio (CNS), e convencê-los a serem mais inclusivos, a receber os alauítas, cristãos. Eles não conseguem.

Le Monde: É possível considerar aquilo que os russos estão sugerindo? Abrir mão da exigência de uma transferência de poder na Síria, para conseguir com que suspendam esses atos de violência?

Juppé: O plano da Liga Árabe não prevê a saída de Bashar al-Assad do poder. É seu afastamento e, mais precisamente, a designação de seu vice-presidente para negociar a iniciar a transição. É realmente o mínimo.

Reconheço que existe um verdadeiro dilema. Podemos bloquear uma resolução que não passaria de uma resolução humanitária, sem nenhuma dimensão política, correndo o risco de deixar que os massacres continuem? Ou é preciso aceitar esse acordo pouco glorioso, correndo o risco de perpetuar o regime?

É extremamente difícil. É por isso que na segunda-feira (12) houve uma forte pressão na ONU para que se seguisse esse caminho, de Ban Ki-moon, dos britânicos e dos americanos.

Le Monde: O Sr. dá a entender que a França se recusou a se contentar com uma espécie de medida pela metade...

Juppé: Tenho dois limites. Não posso aceitar que os opressores e as vítimas sejam apresentados no mesmo plano. Portanto, a iniciativa da suspensão das hostilidades deve vir do regime. O segundo: não podemos nos contentar com uma declaração humanitária e um cessar-fogo - é absolutamente necessário que se faça uma referência a um processo de acordo político com base na proposta da Liga Árabe.

Le Monde: Foi subestimada a capacidade de resistência do regime sírio?

Juppé: Provavelmente. Pensávamos que haveria mais deserções, e mais rápidas. Isso está começando a rachar. É preciso ver que esse regime não recua diante de nenhuma espécie de barbárie. As famílias dos embaixadores ou as dos generais são pegas como reféns, pura e simplesmente. Eles são ameaçados, caso haja deserção, ou represálias. Talvez a selvageria desse regime tenha sido subestimada. O mesmo vale para a personalidade de Assad.

Le Monde: A França é a favor de que armas sejam entregues - por quem quer que seja - à oposição?

Juppé: Não. Isso infelizmente me lembra de um outro debate que tivemos, em outros tempos, sobre a ex-Iugoslávia. Era preciso manter o embargo sobre as armas? Correndo o risco de castigar os bósnios diante dos sérvios? Nós havíamos tomado uma decisão dizendo: não vamos facilitar uma escalada militar, portanto não entregamos armas. Nesse caso, estamos mais ou menos no mesmo esquema: entregar armas equivaleria a lançar a Síria em uma guerra civil que pode ser terrível, pois vemos a determinação de cada uma das comunidades.

Lamento ver que a hierarquia cristã, católica ou ortodoxa, continua a se associar com Bashar Assad. Nós entendemos os temores dos cristãos, mas o futuro deles será melhor em uma Síria democrática.

Le Monde: Com a Síria, estamos diante dos limites da política de intervencionismo instaurada em outros casos?

Juppé: De certa maneira, por causa do bloqueio imposto por dois membros permanentes do Conselho de Segurança. Mas vamos perseverar. Na Costa do Marfim, na Líbia, isso funcionou. Independentemente do que digam da situação na Líbia hoje, tenho orgulho daquilo que foi feito. Foi necessário, senão Gaddafi teria massacrado o povo de Benghazi e continuaria oprimindo. Há circunstâncias em que o Conselho de Segurança é eficaz, como no Timor, onde contiveram uma guerra.

Le Monde: O Sr. mencionou o Irã no Conselho de Segurança. Após a visita de Binyamin Netanyahu aos Estados Unidos, no início de março, o Sr. teve a impressão de que o risco de Israel descambar para uma investida militar havia recuado?

Juppé: Não. Tampouco tive a impressão de que ele tenha avançado. Dentro do grupo E3+3, as seis potências encarregadas da questão, estamos dispostos a retomar o diálogo, sem condições prévias. Os iranianos estão sempre com um comportamento ambíguo. Devem-se fazer concessões para iniciar um processo de negociação? A França é de uma grande firmeza. Não haverá espaço para pré-condições iranianas ou retiradas de sanções enquanto as condições estabelecidas pela Resolução 1929 não forem atendidas.

Le Monde: A política da França às vezes é considerada rígida demais, excessivamente contrária a acordos...

Juppé: Como muitos parecem estar dispostos a fazer acordos, pelo menos nós somos a garantia de que esses acordos não serão excessivos. De qualquer forma, em Israel consideram que a França é um país firme em suas convicções e em suas atitudes, e que é mais protetor para Israel.

Le Monde: A França, ao contrário dos Estados Unidos e do Reino Unido, nunca disse que todas as opções estavam sobre a mesa. Se houver uma investida militar, a França condenaria essa ação? Ela se recusaria a tomar parte?

Juppé: Não quero me colocar em situações que não estão ocorrendo. O presidente, em seu discurso para a ONU em setembro, disse que se a segurança de Israel fosse ameaçada, a França ficaria ao lado de Israel.

Le Monde: Isso quer dizer que a França não descarta tomar parte de uma ação militar assim que fosse deflagrada?

Juppé: Não. Só em caso de Israel ser atacado é que ficaríamos do seu lado, não para ajudá-lo a atacar outros países.

Le Monde: Em 2011, a França interveio na Líbia e na Costa do Marfim. Em um mundo em processo de mudança, seria a força militar um atributo essencial de poder para a França?

Juppé: Há momentos em que, para fazer a lei prevalecer, é preciso usar a força. E isso é uma constante histórica. A Europa poderia se inspirar nisso, continuando a adotar uma verdadeira política de segurança e de defesa coletiva.

Le Monde: Recorrer a essa ferramenta militar é um componente do sarkozysmo?

Juppé: Não. É um componente do gaullismo. Uma defesa nacional capaz de proteger nossos interesses é uma constante do gaullismo, hoje encarnada por Sarkozy.

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