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sexta-feira, 11 de março de 2011

A última lição política do chefe do Pentágono

Secretário de Defesa dos EUA, Robert Gates e ministro de Defesa da China, Gen. Liang Guanglie, participam de cerimônia em Pequim, na China
Foi no dia 25 de fevereiro, na academia militar de West Point. O orador era o secretário da Defesa, Robert Gates. Ele se dirigiu, pela última vez nessa função, à nova turma de “cadetes” da escola – a futura elite das forças armadas dos Estados Unidos.

De terno escuro, com o rosto um tantinho inchado, timbre de voz anasalado de nativo do Kansas, o secretário de Defesa se deixa levar, por um instante. Em breve ele deixará o Pentágono. Ele pode dizer o que bem pensa. Não tem nada a perder, e entrega seu testamento político: “Se o próximo secretário da Defesa aconselhar o presidente americano a enviar novamente um forte contingente militar para um país da Ásia, do Oriente Médio ou da África, então ele precisa ir se tratar.”

Os Estados Unidos estão guerreando há dez anos no Afeganistão, país da Ásia; eles ainda têm milhares de homens no Iraque, país do Oriente Médio; eles hesitam em intervir na Líbia, país da África.

A lição do professor Gates é clara. Ela é transmitida continuamente na mesma noite, por todas as cadeias de televisão: as duas guerras decididas por George Bush filho – do Afeganistão e do Iraque – foram erros. Declarar uma terceira na Líbia seria outro erro. E é um republicano falando. Ex-diretor da CIA, sovietólogo endurecido na guerra fria, Gates pertence ao campo dos “realistas” em política externa. Ele nunca acreditou nas bobagens neoconservadoras sobre a necessidade de se exportar a democracia pela força.

Sem dúvida, ele concordou com a intervenção no Afeganistão no dia seguinte ao atentado de 11 de setembro de 2001: tratava-se de abater o regime taleban que abrigava e apoiava a Al-Qaeda. Mas, embora não tenha dito nada na época, ele certamente se opunha à aventura iraquiana lançada em 2003, da mesma forma que a maioria dos ex-colaboradores do presidente Bush pai, seu mentor na política.

Foi pelos conselhos destes últimos que Bush filho, embaraçado em sua desastrosa guerra do Iraque, decidiu em 2006 chamar “Bob” Gates para o Pentágono, para substituir o catastrófico Donald Rumsfeld. Gates tinha uma dupla missão: tirar o mais rápido possível os americanos do Iraque, e estabilizar a situação no Afeganistão para também sair de lá o quanto antes.

Como uma homenagem prestada às qualidades desse pequeno homem de cabeça fria, o democrata Barack Obama lhe pediu para permanecer em seu posto quando chegou à Casa Branca em janeiro de 2009. Hoje, com uma missão quase cumprida no Iraque, mas longe disso no Afeganistão, Gates quer voltar à universidade. É considerado um dos maiores secretários da Defesa dos trinta últimos anos, e deve deixar seu cargo dentro de algumas semanas. Mas, enquanto isso, ele tem uma última batalha. Ele dá o tom ao debate em Washington sobre a oportunidade ou não de intervir na Líbia –  de uma extrema reticência.

Apoiar a rebelião anti-Gaddafi declarando uma zona de exclusão aérea acima do território líbio? “É preciso ir direto ao ponto: isso supõe que se ataque primeiramente a Líbia”, destruir sua defesa antiaérea e seus aeroportos. É um ato de guerra. Se for preciso fazer isso – Londres e Paris tentam convencer Washington a realizar uma ação de apoio militar pontual, então os Estados Unidos escolherão a opção mínima.

Eles evitarão tudo aquilo que pareça de perto ou de longe com um início de intervenção terrestre: nenhum novo corpo expedicionário americano na terra do islã; nada de “conselheiros” no terreno. Nada que possa dar a impressão de que os Estados Unidos estejam entrando em mais um conflito no mundo árabe-muçulmano. É essa a “herança” do Iraque (e do Afeganistão).

Washington está com um humor neo-isolacionista. Há uma “síndrome afegã-iraquiana”, assim como houve uma “síndrome vietnamita” nos anos que se seguiram à queda de Saigon em 1975. Sinal clínico manifesto: uma reticência pronunciada a qualquer nova ação armada no exterior.

Não há somente isso por trás dessa atitude. Nas revoltas que estão ocorrendo no mundo árabe, os Estados Unidos deram a impressão de hesitar, de tergiversar, de não ter diretrizes. Em Bahrein, eles apoiam o regime e os manifestantes, assim como no Iêmen. No Egito, eles acabaram fazendo pressão sobre Hosni Mubarak para que ele saísse. Na Tunísia, eles logo abandonaram Ben Ali. Mas, no final, Obama tomou uma decisão: os Estados Unidos devem estar do lado daqueles que lutam por suas liberdades.

O realismo de Barack Obama é misturado a um idealismo. No “Washington Post”, David Ignatius, autoridade em Casa Branca e Oriente Médio, escreveu: “No centro dessas convicções de Obama sobre o estado do mundo, existe essa certeza de que a mudança é inevitável e desejável, e de que os Estados Unidos devem estar do lado das novas forças que estão moldando o mundo.”

Ora, o vigor das revoltas árabes, especialmente as de Túnis e do Cairo, provém de sua autonomia. Elas não são dirigidas de fora; elas não são motivadas por considerações de política externa (Israel); elas não são feitas em nome de uma ideologia (socialismo, islamismo, terceiro-mundismo, etc.). Usando um anglicismo, diria-se que elas são puramente “domésticas”.

Elas marginalizaram a Al-Qaeda e deram um golpe na glorificação da violência jihadista. Tudo isso seria ameaçado por uma intervenção maciça na Líbia. A Al-Qaeda se encontraria em território conhecido para denunciar a ingerência neocolonialista e criticar a presença de “infiéis” na terra do islã.

Britânicos e franceses concordam. Eles defendem a ideia de ataques direcionados, limitados, para jogar ao chão as aeronaves líbias. Principal vítima da “síndrome afegã-iraquiana”, o Pentágono se encontra muito mais reservado.

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