quinta-feira, 1 de dezembro de 2011
Paquistão abandona EUA no diálogo sobre o Afeganistão
O governo do Paquistão, pressionado por sua cúpula militar, disse que não irá à conferência sobre o futuro do Afeganistão, que se realizará na próxima segunda-feira (5) em Bonn, Alemanha. Esse boicote é uma resposta a um ataque das tropas da Otan, com o apoio de soldados afegãos, ocorrido no sábado em território do Paquistão, no qual morreram 24 soldados desse país.
A ausência de Islamabad nessa cúpula representa uma afronta à Casa Branca, que busca formas de garantir a estabilidade do Afeganistão e seu governo legítimo depois que retirar de lá suas tropas em 2014. As relações entre EUA e Paquistão atravessam seu pior momento desde que os dois países se aliaram depois dos atentados terroristas de setembro de 2001.
"Se não posso proteger a soberania do meu país, como se pode dizer que há um respeito mútuo e um interesse comum?", disse em uma entrevista na televisão o primeiro-ministro paquistanês, Yusuf Raza Gilani. O presidente afegão e aliado de Gilani, Hamid Karzai, lhe pediu por telefone que considere sua negativa a participar em Bonn. Nessa cidade se reuniram as potências internacionais em novembro de 2001, para escolher e apoiar um novo governo de Cabul depois da queda dos taleban. Ali o Ocidente escolheu Karzai como presidente. Dez anos depois, espera-se que o mesmo cenário sirva para iniciar o processo de paz. Participarão da conferência EUA, China, Rússia e Irã, entre outros.
Sobre o incidente ocorrido na madrugada de sábado (26), há versões contraditórias. O Pentágono afirma que quando um comando de operações especiais dos EUA sob o comando da Otan patrulhava a fronteira do Afeganistão, na região de Mohmand, foi atacado do solo paquistanês. Os soldados americanos pediram apoio aéreo e tentaram avisar as forças de segurança paquistanesas. Como não receberam resposta, seus comandos ordenaram o ataque por terra e por ar, que durou duas horas.
O Paquistão nega que tenha havido um ataque inicial de seu território. A Otan e o comando central dos EUA ordenaram o início de duas investigações. No ataque morreram 24 soldados paquistaneses. Imediatamente o exército do Paquistão ordenou o fechamento de duas das principais rotas de abastecimento do exército americano, que ligam o porto de Karachi com o sul e o leste do Afeganistão, que não tem saída para o mar.
A irritação do Paquistão é na realidade a irritação de sua cúpula militar, que detém o poder no país. Os comandantes militares já deram um toque de atenção ao governo civil na semana passada, quando forçaram a demissão do embaixador paquistanês em Washington, Husain Haqqani. O diplomata havia enviado uma carta ao ex-chefe do Estado-Maior Conjunto, almirante Mike Mullen, pedindo a ajuda dos EUA para manter o exército sob controle e evitar um possível golpe militar. Então ficaram a descoberto as tensões existentes entre os militares e o frágil governo civil de Islamabad.
O exército paquistanês e os serviços de inteligência militares, a mais poderosa agência de espionagem do Paquistão, mantêm estreitos laços com a insurgência afegã. Deram refúgio aos taleban, a membros da Al Qaeda e à rede Haqqani, que o Pentágono considera o pior inimigo das tropas no Afeganistão. Quando os EUA aniquilaram Osama bin Laden em maio, em Abottabad, o fizeram nas imediações de uma zona militar. As agências de inteligência americanas duvidam de que a cúpula militar paquistanesa não soubesse quem morava naquele complexo fortificado.
Esses laços turvos, entretanto, não significam que os EUA considerem o Paquistão um inimigo. Os dois países são formalmente aliados. E a diplomacia americana está fazendo esforços para atrair Islamabad para as negociações de paz. Sabe que precisará dela quando as últimas tropas americanas saírem do país e deixarem o frágil governo de Cabul dependente de um exército mal formado, pior pago e dado a deserções. Se Washington tinha a esperança de se apoiar no Paquistão para sair do Afeganistão, as imagens desta semana de paquistaneses queimando imagens de Obama, como costumavam fazer com Bush, indicam que esses planos podem estar longe de se tornar realidade.
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