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terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Cães no serviço militar continuam a exibir sinais de transtorno de estresse pós-traumático


Segundo estimativas, mais de 5% dos 650 cães utilizados pelas forças de combate norte-americanas no Iraque e no Afeganistão lutam contra estresse pós-traumático 


Os especialistas em comportamento daqui receberam um chamado de um médico no Afeganistão. Seu paciente tinha enfrentado um tiroteio e agora estava encolhido sob uma cama, se recusando a sair.

 Aparentemente, nem mesmo os brinquedos para mastigar funcionavam.

Transtorno de estresse pós-traumático, pensou o dr. Walter F. Burghardt Jr., chefe de medicina comportamental do Hospital Militar Daniel E. Holland para Cães Trabalhadores da Base Lackland da Força Aérea. Especificamente, TEPT canino.

Se alguém precisava de evidência do papel exercido pelos cães na linha de frente da guerra atualmente, aqui está a mais recente: os soldados de quatro patas e focinho úmido, usados para farejar minas, rastrear combatentes inimigos e evacuar prédios, estão sofrendo problemas mentais causados pelo combate tanto quanto seus pares humanos.

Segundo algumas estimativas, mais de 5% dos aproximadamente 650 cães militares utilizados pelas forças de combate americanas estão desenvolvendo TEPT canino. Dentre eles, aproximadamente metade provavelmente será afastada do serviço, disse Burghardt.

Apesar dos veterinários há muito diagnosticarem problemas comportamentais em animais, o conceito de TEPT canino tem apenas 18 meses de idade e ainda está sendo debatido. Mas ele ganhou força entre os veterinários militares, que estão vendo padrões de comportamento problemático entre os cães expostos a explosões, tiroteio e outras violências ligadas ao combate no Iraque e no Afeganistão.

Como os seres humanos com o mesmo transtorno, cães diferentes exibem sintomas diferentes. Alguns se tornam hipervigilantes. Outros evitam prédios ou áreas de trabalho onde antes se sentiam à vontade. Alguns sofrem mudanças acentuadas de temperamento, se tornando incomumente agressivos com seus treinadores, ou grudentos e tímidos. Mais importante, muitos param de cumprir as tarefas que foram treinados para realizar.

“Se o cão é treinado para encontrar explosivos e parece que está funcionando, mas não está, não é apenas o cão que está correndo risco”, disse Burghardt. “Passa a ser também uma questão de saúde humana.”

O fato de as forças armadas estarem levando a sério o TEPT canino ressalta a importância dos cães trabalhadores nas guerras atuais. Antes usados apenas como sentinelas, os cães militares – a maioria pastores alemães, seguidos por malinois belgas e labradores – agora atuam em várias tarefas especializadas.

Eles são amplamente considerados as ferramentas mais eficazes para detecção de artefatos explosivos improvisados, usados com frequência no Afeganistão. Geralmente feitos com fertilizantes e produtos químicos, contendo pouco ou nenhum metal, essas bombas enterradas podem ser quase impossíveis de achar com detectores de minas comuns. Nos últimos três anos, esses explosivos foram a principal causa de baixas no Afeganistão.

O Corpo de Marines também começou a usar cães treinados para rastrear combatentes do Taleban e fabricantes de bombas. E comandos das Operações Especiais treinam seus próprios cães para acompanhar as equipes de elite em missões secretas – como a ação dos SEALs da Marinha que resultou na morte de Osama Bin Laden no Paquistão. Em todas as forças, mais de 50 cães militares foram mortos desde 2005.

O número de cães trabalhadores no serviço ativo aumentou de 1.800 em 2001 para 2.700, e a escola de treinamento com sede em Lackland está ocupada, preparando cerca de 500 cães por ano. Assim como o hospital Holland, a versão canina do Pentágono do Centro Médico Walter Reed do Exército.

Burghardt, um senhor magro de 59 anos que se aposentou no ano passado como coronel da Força Aérea, raramente vê seus pacientes. As consultas com os veterinários no campo geralmente são feitas por telefone, e-mail ou Skype, e frequentemente envolve vídeos.

Em uma série de vídeos que Burghardt usa para treinar os veterinários a diagnosticarem a TEPT canino, um pastor late descontroladamente ao ouvir som de disparos, que antes tolerava em silêncio. Outro pode ser visto inspecionando confiantemente o interior de carros, mas então se recusando a entrar em um ônibus ou prédio. Outro fica sentado indiferentemente sobre uma barreira, então, após finalmente responder ao chamado de seu treinador, foge de um grupo de soldados afegãos.

Em cada caso, segundo a teoria de Burghardt, os cães estavam associando um objeto, veículo ou pessoa a alguma violência que testemunharam.

“Se você quiser imaginar o que estavam pensando”, ele disse, “poderia ser algo como: ‘Quando vejo este tipo de indivíduo, as coisas explodem, então fico perturbado’”.

O tratamento pode ser complicado. Como os pacientes não podem explicar o que está errado, os veterinários e treinadores precisam supor quais foram os eventos traumatizantes. Os cuidados podem ser tão simples quanto afastar um cão das patrulhas e dar a ele muitos exercícios, brincadeiras e treinamentos gentis de obediência.

Os casos mais sérios recebem o que Burghardt chama de “contracondicionamento de dessensibilização”, que expõe o cão a uma distância segura da imagem ou som que pode provocar uma reação – um disparo, uma explosão ou um veículo, por exemplo. Se o cão não reagir, ele é recompensado, e o gatilho –“a aranha na caixa de vidro”, como Burghardt o chama– é deslocado progressivamente mais próximo.

Gina, uma cadela com TEPT que foi tema de reportagens no ano passado, foi tratada com sucesso com dessensibilização e foi liberada para voltar à ativa, disse a sargento Amanda Callahan, uma porta-voz da Base Peterson da Força Aérea, no Colorado.

Alguns cães também são tratados com os mesmos medicamentos usados para combater ataques de pânico nos seres humanos. Burghardt afirma que os medicamentos são particularmente eficazes quando ministrados logo após os eventos traumatizantes. O labrador que se escondia sob a cama após um tiroteio, por exemplo, recebeu Xanax, um medicamento contra ansiedade, e em questão de dias ele passou a trabalhar bem de novo.

Os cães que não se recuperam rapidamente retornam para suas bases de origem para tratamento a longo prazo. Mas se continuarem exibindo sintomas após três meses, eles costumam ser aposentados ou transferidos para tarefas diferentes, disse Burghardt.

Assim como os seres humanos, há muito debate a respeito do tratamento, com pouca pesquisa orientando os veterinários. Lee Charles Kelley, um treinador de cães que escreve um blog para a “Psychology Today”, chamado “Meu animal, meu eu”, diz que os medicamentos deveriam ser usados apenas como opções temporárias.

“Nós não sabemos nem mesmo com funcionam nas pessoas”, ele disse.

No mundo dos cães civis, um crescente número de especialistas em comportamento animal parece estar endossando o conceito do TEPT canino, dizendo que isso também afeta animais domésticos que passaram por acidentes de carro e até mesmo eventos menos traumáticos.

O dr. Nicholas H. Dodman, diretor da clínica de comportamento animal da Escola Cummings de Medicina Veterinária, da Universidade Tuft, disse que escreveu a respeito e trata há anos cães com sintomas como de TEPT –mas não chamava de TEPT até recentemente. Ao ser perguntado se o transtorno podia ser curado, Dodman disse que provavelmente não.

“Trata-se mais de administração”, ele disse. “Os cães nunca esquecem.”

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