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segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Der Spiegel: Oito anos depois, investigações sobre morte de Arafat levantam mais dúvidas que certezas

Yasser Arafat

As circunstâncias misteriosas da morte de Yasser Arafat são agora tema de uma investigação criminal na França. Mas se for verdade que o líder palestino foi envenenado, então quem poderá estar por trás de seu assassinato?

Suha Arafat diz que sabia o tempo todo. Alguém como Yasser Arafat não morre tão facilmente porque seu corpo de repente desiste, muito embora estivesse com 75 anos de idade. Alguém como ele precisa ser assassinado, envenenado ou exposto à radiação, por parte de inimigos ou rivais. Embora muitos tenham suspeitado da mesma coisa, nunca houve nenhuma prova. Oito anos depois da morte do lendário líder palestino, parecia que as coisas continuariam assim.

Mas então, há dois meses, o Instituto de Física de Radiação com sede em Lausanne, Suíça, anunciou que havia encontrado uma possível contaminação com uma quantidade fatal de polônio 210 na roupa íntima de Arafat, sua escova de dente e chapéu. O isótopo de metal pesado radioativo não tem gosto e é quase indetectável. Uma dose de 0,1 microgramas já é fatal.

Suha Arafat, sua viúva que hoje tem 49 anos, concedeu as amostras com a assistência da Al jazeera, a rede de televisão sediada no Qatar. Desde então, o que durante anos foi simplesmente uma teoria da conspiração, tornou-se um caso criminal legítimo – especialmente depois que Suha Arafat entrou com uma queixa criminal e os promotores franceses lançaram uma investigação de assassinato na semana passada.

“Finalmente saberemos a verdade”
É difícil localizar as mulheres que fizeram tudo isso acontecer. Até o taxista demorou para chegar através de ruas sinuosas até a casa de Suha Arafat em Malta, a meia hora de carro da cidade de Valletta. A casa pouco chamativa num morro tem um jardim na frente, pequeno demais para dar festas. Um carro compacto coreano está estacionado do lado de fora.

Suha Arafat vive aqui com sua mãe há mais de dois anos. Sua filha de 17 anos, Zahwa, frequenta um colégio interno na França.

A viúva abre a porta usando um vestido e sapatos baixos. Ela parece muito mais uma dona de casa do que a suposta bruxa que os palestinos odeiam desde que seu marido, que eles achavam que deveria ter se casado somente com a causa palestina, casou-se com ela – um muçulmano convertido que nasceu cristão palestino em Jerusalém e foi criado como católico – em 1990. Mas, mais do que qualquer coisa, ela é odiada desde 1995, quando se mudou da Faixa de Gaza para Paris porque achou a vida lá mais confortável.

Suha Arafat fala sobre a suspeita que ela carrega consigo desde 12 de outubro de 2004. Este foi o dia em que a doença de Arafat começou, quando ele teve diarreia e reclamou de dores no estômago e tonturas. Os sintomas logo pioraram e o deixaram magro como um cabo de vassoura. Por fim, usando um conjunto de moletom e um gorro de lã, Arafat foi levado da cidade de Ramallah na Cisjordânia para um hospital militar perto de Paris, onde morreu em 11 de novembro. Na época, muitos já achavam que a morte não parecia natural.

Durante uma recente entrevista no estúdio da Al Jazeera, Suha Arafat pediu uma investigação. Agora, sentada em sua sala de estar, onde um retrato de Arafat está pendurado na parede, ela sente que está finalmente se aproximando seu objetivo. “Estou muito confiante”, diz ela, “de que o caso inteiro chegará a um final positivo em pouco tempo e que finalmente saberemos a verdade.” Não se trata de apenas de pensamento positivo, diz ela, observando que há motivos palpáveis para ser tão otimista.

Uma vez que o polônio 210 tem uma meia vida de 138 dias, as coisas precisam ser feitas rapidamente. Portanto, o corpo de Arafat será examinado nas próximas semanas, acredita Saad Djebbar, um dos advogados de Suha Arafat em Paris. Numa entrevista à televisão, ele disse que o sistema legal francês tem jurisdição para isso porque o assassinato começou nos territórios palestinos e terminou na França. Ele então acrescentou a curiosa declaração de que Suha Arafat quer evitar que a Autoridade Palestina obstrua a investigação.

A peça que falta no quebra-cabeça
Esta é uma acusação que irrita Tawfik Tirawi, ex-chefe de inteligência de Arafat, porque também é dirigida contra ele. Durante os últimos dois anos, Tirawi liderou a comissão oficial palestina encarregada de investigar a causa da morte de Arafat. Desde que o escândalo envolvendo um possível envenenamento por plutônio veio à tona, ele foi forçado repetidas vezes a explicar porque foi a Al Jazeera, e não ele, que teve a ideia de analisar melhor a roupa íntima de Arafat.

Durante os três anos anteriores à sua morte, o cerco israelense impediu Arafat de deixar o Mukatta, a sede de seu governo em Ramallah. Naquele período, Tirawi se encontrava com Arafat quase que diariamente. “Eu vi muito claramente como as coisas ficaram cada vez piores com ele”, diz. “Primeiro, ele teve manchas no rosto, depois começou a vomitar com frequência, perdeu peso, e a pele de seus pés se dissolveu e ele só conseguia usar sandálias.” Depois acrescentou: “sempre tivemos a certeza de que os israelenses haviam envenenado Arafat”.

Segundo Tirawi, foi apenas um acidente o fato de a Al Jazeera descobrir a última peça que faltava do quebra cabeça. Ele alega que sua comissão investigou o caso incansavelmente, mas que suas atividades foram secretas, porque essas coisas obviamente são mantidas longe dos olhares do público. Embora ele não esteja disposto ou não possa discutir as descobertas da comissão, diz que ela foi razoavelmente bem sucedida.

Não só Suha Araaft, mas também muitos palestinos em Ramallah veem as coisas de forma diferente. Eles acreditam que os funcionários da Autoridade Palestina nunca fizeram um esforço real para solucionar o mistério em torno da morte de Arafat. A primeira comissão investigativa foi dissolvida seis meses depois da morte de Arafat e só foi renomeada em 2010.

Com tudo isso, os palestinos tiveram bom motivos para olhar para isso tudo mais de perto. Afinal, o relatório clínico francês de 558 páginas sobre a morte de seu herói nacional levanta mais dúvidas do que fornece respostas. Por exemplo, por que Suha Arafat se recusa a permitir que uma biópsia de fígado seja realizada? Por que ninguém pediu que fosse realizada uma autópsia? Como pode ser que até os melhores médicos na França não descobriram a causa dessa estranha infecção, que fez com que o sangue coagulasse e levasse a um derrame? Será que o governo francês quer manter secreta a causa da morte?

Além disso, por que há tanta coisa faltando no relatório, e por que parece que “alguém brincou com ele”, como disse Avi Issacharoff, repórter do jornal israelense Haaretz? Da mesma forma, ele também acha estranho que, enquanto jornalista israelense, ele foi o único a publicar o relatório médico secreto francês, em vez de Suha Arafat ou a Autoridade Palestina.

Incoerências e rumores
Há muitas incoerências e muitos rumores. Eles começam com a alegação de que Arafat morreu de Aids ou de que os rivais de Arafat o envenenaram, e há muitos mais. Ainda assim, ao procurar um motivo para assassinar Arafat, é difícil ignorar Israel.

Em 2002, o então primeiro-ministro Ariel Sharon disse ao jornal israelense Ma'ariv que se arrependia de não ter assassinado Arafat quando as forças israelenses invadiram o sul do Líbano em 1982. Em 2003, o então vice-primeiro-ministro Ehud Olmert disse que o assassinato era uma opção para se livrar de Arafat. Mas há alguma prova?

Quando questionados sobre isso, funcionários israelenses dizem: “não tem nada a ver com a gente”. Por exemplo, Dov Weissglass, que foi chefe de gabinete do então primeiro-ministro Ariel Sharon, diz: “não matamos Arafat quando o terror chegou ao ápice, então por que o mataríamos em 2004, quando ele estava sentado isolado no Mukataa e sua influência polítia já estava desaparecendo?”.

Entretanto, polônio 210 não é algo que se pode encontrar na mercearia. Há apenas alguns países capazes de produzi-lo, e fazer isso requer um reator nuclear. Além disso, há relatos de que Israel tinha algum polônio no passado.

Outra questão é: por que tudo isso está vindo à tona agora, oito anos depois da morte de Arafat e seis anos depois da morte de Alexander Litvinenko, ex-agenda da KGB e oponente do Kremlin, que se tornou a primeira vítima famosa de um envenenamento por polônio?

A busca pela verdade
Suha Arafat diz que é motivada pela busca da verdade. Mas também pode ter algo a ver com o fato de que, além de ser amplamente desprezada em Ramallah, ela também caiu em desgraça na França e na Tunísia, onde está sob investigação por transferências suspeitas de dinheiro e por corrupção. Também há um rumor persistente de que ela teve algum envolvimento no desaparecimento de US$ 300 milhões depois da morte de Arafat. Em todo caso, certamente seria oportuno para ela assumir agora o papel da viúva vingando a morte do marido em nome do povo palestino.

O entusiasmo pela investigação é mais moderado em Ramallah, em parte porque algumas pessoas lá suspeitam que a Al Jazeera quer ajudar a derrubar o presidente palestino Mahmoud Abbas. Mas, é claro, funcionários palestinos também sabem que podem tirar vantagem da busca pelo suposto assassino de Arafat. No momento, não há negociações de paz com Israel, a economia está em queda e continuam existindo profundas divisões entre o Hamas e a Fatah, os grupos palestinos rivais que dominam a Faixa de Gaza e a Cisjordânia, respectivamente. Sob essas circunstâncias, seria um momento perfeito para ter notícias de um mártir envenenado para desviar a atenção do impasse político e da desorientação.

Por esses motivos, o debate pode dizer mais sobre a situação palestina hoje do que sobre a morte de Arafat. “Até hoje, evitamos acusar Israel de ser responsável pela morte de Arafat”, diz Nimar Hamad, conselheiro político de Abbas. “Mas se encontrarmos polônio em seu corpo, é 99,9% de certeza de que foi Israel. Isso nos ajudaria porque provaria que Israel não quer a paz”. Ele acrescenta que ele pediria a nomeação de um tribunal especial “como o que deveria explicar a morte do ex-primeiro-ministro libanês Rafik al-Hariri. Mas as provas são mais claras no caso de Arafat do que no de Hariri”.

Quando questionado como seria a situação para os palestinos se Arafat ainda estivesse vivo, o general Tirawi disse reservadamente: “a situação provavelmente seria mais difícil”. Nimar Hamad, por outro lado, só sorri. Não há praticamente ninguém hoje em dia que gostaria que Arafat ainda fosse presidente. De fato, a maior parte das imagens do rosto de Arafat onipresentes nas ruas desapareceram.

Cheio de entulho
Hoje em dia, não é possível nem visitar o mausoléu de Arafat num canto do Mukataa. A entrada está cheia de entulho e há homens empurrando carrinhos de mão. Esta é a reforma mais recente no esforço de transformar a sede de Arafat, cheia de buracos de bala, numa sede oficial de governo com boa aparência.

“Não está terminado”, diz um segurança, enxotando os visitantes. As guirlandas foram retiradas, e o guarda de honra está em outro lugar. Dentro do mausoléu em forma de cubo, há apenas uma pedra memorial sobre uma cripta que abriga o caixão. O caixão não guarda só o corpo de Arafat, mas também o segredo por trás de sua morte – embora talvez não por muito mais tempo.

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