Militares do Exército de Libertação Popular |
Durante um banquete e feriado para a liderança militar da China no início deste ano, um general poderoso bebeu demais e ficou furioso com o que ele acreditava ser um movimento indireto para evitar sua promoção para o topo do corpo dirigente militar.
O general, Zhang Qinsheng, extravasou sua fúria na frente do presidente Hu Jintao, de acordo com quatro pessoas a par do acontecimento. No banquete, ele até empurrou um general que brindava; Hu se distanciou com desgosto.
A ira do general foi um entre vários acontecimentos este ano que alimentaram preocupações entre os líderes do Partido Comunista em relação ao nível de controle que eles exercem sobre os militares, que estão ficando mais críticos e desejando uma influência maior sobre a política.
Com a transição de liderança da China a poucos meses de acontecer, o partido está respondendo com uma campanha altamente visível contra a deslealdade e a corrupção, exigindo até que todos os funcionários reportem seus bens financeiros.
“Autoridades do partido perceberam que os militares estão se intrometendo nas questões políticas”, disse um cientista político com laços no alto escalão do partido. “Embora o partido controle as armas, a expressão de pontos de vista de dentro do poder militar sobre questões políticas aumentou para um nível alarmante”.
Ele, como outros que concordam em discutir questões internas do partido, falou sob condição de anonimato por temer represálias.
Alguns generais e marechais pediram veementemente para que o governo reafirme o controle sobre o Mar do Sul da China, foco de disputas territoriais cada vez mais rancorosas entre vários países do sudeste asiático e a China, onde os espíritos nacionalistas estão em ascensão entre o público e os políticos. E no início deste ano, líderes de Pequim se alarmaram por conta dos laços entre generais e Bo Xilai, integrante do Politburo que perdeu prestígio.
A necessidade do partido de manter um poder estável sobre os militares cada vez mais extrovertidos é um dos motivos pelo qual Hu, seu principal líder civil, deve sustentar sua posição como presidente da Comissão Central Militar por até dois anos depois que ele deixar o título de chefe do partido no outono, de acordo com pessoas informadas sobre as discussões políticas. Seu sucessor nomeado, Xi Jinping, ainda assumirá os postos de Hu como chefe do partido e chefe de estado, mas terá que esperar para se tornar o chefe dos militares da China.
Os dois predecessores de Hu exerceram controle sobre os militares depois de deixar seus outros títulos civis. Mas alguns informantes do partido concordaram que um entrega hesitante pode levar à criação de centros rivais de poder, dividindo a lealdade dos generais. Nenhuma decisão final foi tomada em relação a Hu ficar. Mas se isso acontecer, então Xi poderá se ver com espaço limitado para expandir sua base de poder, muito embora ele tenha um histórico militar maior do que Hu.
Hu vem construindo uma rede de lealistas no exército promovendo generais em ondas. Pelo menos 45 oficiais foram promovidos a generais por Hu desde setembro de 2004, quando ele se tornou chefe da comissão militar. Cerca de metade das promoções aconteceram desde julho de 2010. Quatro dos 45 estão agora entre os 10 generais que estão na comissão.
Um oficial que subiu rapidamente com o apoio de Hu foi Zhang, que ainda poderá estar disputando um lugar na comissão apesar de sua crise de bebedeira. Quando o antecessor de Hu, Jiang Zemin, conservou seu posto militar de 2002 a 2004, a inimizade faccional cresceu em relação a muitos temas. O mesmo poderá acontecer com Hu e Xi, que foi promovido para vice-presidente da comissão militar em 2010. Jiang entregou seu posto a Hu só depois que os conflitos entre os dois intensificaram.
“O que acontece com os militares é o seguinte: quem quer que me promova é meu chefe”, disse um membro da elite do partido que se encontra com os generais regularmente.
Essas divisões não podem ser debilitantes num serviço militar cada vez mais profissional, dizem analistas.
“Eles preferem resolver essas diferenças num processo de construção de consenso”, disse Dennis J. Blasko, oficial aposentado da inteligência do exército dos EUA e ex-attaché militar da embaixada norte-americana em Pequim. “Eu vejo a liderança do ELP como racional, pragmática e realista”, acrescentou, referindo-se ao Exército de Libertação do Povo.
Entretanto, as conversas com oficiais sugerem que alguns podem sentir uma afinidade com Xi que não tinham com Hu, filho de um comerciante de chá que lutou na sombra de Jiang para conquistar respeito. Xi, 59, é o “príncipe” filho de um reverenciado líder da guerrilha comunista que cresceu em Pequim com familiares militares. Ele está entrando no papel de liderança com relações mais próximas dos militares do que qualquer um desde Deng Xiaoping.
“Quando aqueles da 'segunda geração vermelha' chegarem ao poder, haverá um sentimento pessoal, uma ligação tradicional”, disse um oficial sênior.
O primeiro emprego de Xi foi como auxiliar de Geng Biao, um camarada de seu pai na guerrilha que se tornou ministro da defesa da China em 1981. Xi mais tarde teve posições de comando em unidades militares enquanto serviu como líder civil nas províncias de Fujian e Zhejiang em oposição a Taiwan, que a China ainda considera como parte do país. E ele é casado com Peng Liyuan, uma cantora célebre de uma trupe do exército que tem o equivalente a uma insígnia de major general.
Mesmo antes de assumir seu posto na comissão militar, Xi teve reuniões informais ocasionais em Pequim com vários generais, inclusive Liu Yuan e Liu Yaxhou, de acordo com Li Mingjiang, especialista em política chinesa que vive em Cingapura.
No que diz respeito à ideologia, Xi é um enigma. Mas com a ascensão da China cresceu uma certa assertividade na região, e Xi sentirá a pressão de ir nessa direção. Ele será “mais duro em termos de proteger os interesses da China”, disse Li. “O fato de que ele tem algum passado militar dá a ele mais confiança na tomada de decisão.”
Há sinais de que alguns generais acreditam que têm influência sobre Xi. No ano passado, o general Liu Yazhou, comissário político da Universidade de Defesa Nacional, enviou um belicoso major general, Zhu Chenghu, para Cingapura para liderar um estudo sobre o sistema autoritário mais flexível do pequeno país. Liu, que foi promovido a general por Hu em 30 de julho, planejou apresentá-lo para Xi para defender um sistema unipartidário mais liberal como forma de fortalecer o estado, disse um acadêmico que se encontrou com o grupo.
Liu Yuan (que não tem relação com Liu Yazhou), outra figura poderosa na rede de generais de Xi, é filho de Liu Shaoqi, que foi escolhido por Mao para assumir o posto de líder supremo antes de ser expurgado e abandonado à morte na prisão. Num ensaio publicado em 2002, Xi lembrou-se de como ele se conectou com Liu Yuan quando eles receberam postos civis de condado em 1982.
“Nós concordamos antes mesmo de conversar”, escreveu Xi. “Ambos queríamos pegar o caminho da integração com os trabalhadores e camponeses.”
Apesar de sua posição favorecida, Liu Yuan foi pressionado este ano por autoridades do partido por causa de suas conexões com Bo. De fato, a questão de Bo colocou funcionários civis em alerta para essas ligações secretas. Quando o escândalo começou a se desenrolar em fevereiro, Bo alertou alguns líderes do partido viajando para a província de Yunnan para visitar a sede do 14º Grupo do Exército, a unidade que havia sido comandada por seu pai.
Alguns dizem que o escândalo prejudicou as perspectivas de promoção de Liu Yuan. Mas sua popularidade foi evidente em abril, quando ele conquistou uma alta posição numa pesquisa de oficiais sênior, de acordo com um intelectual do partido próximo a ele. Para guardar sua carreira, o general se distanciou de Bo e declarou seu apoio a Hu, que havia anteriormente promovido-o a general.
Esta foi uma das muitas maneiras pelas quais Hu, dizem os analistas, tentou reunir oficiais das famílias de elite que poderiam fazer com que ele estendesse sua influência até a aposentadoria.
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