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quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Jabhat al-Nusra transforma rebeldes em inimigos

Combatentes da crescente franquia da Al Qaeda na Síria entram repetidamente em choque com outras brigadas rebeldes, tomando cidades, substituindo cruzes nas igrejas por bandeiras pretas e dando aulas para ensinar as crianças sírias sobre a importância de enfrentar os "infiéis", o que significa qualquer um que não seja muçulmano sunita.

Desde que o grupo, o Estado Islâmico no Iraque e Síria (Isis, na sigla em inglês), anunciou sua presença na Síria neste ano, ele despontou como a principal força de combatentes estrangeiros ingressando no país, explorando o caos da guerra civil enquanto tenta estabelecer a base para um Estado islâmico.

"Eles querem criar um Estado jihadista ou um território jihadista, e obviamente qualquer coisa que possa favorecer isso é bem-vinda, como a derrubada do regime Assad", disse Bruce Hoffman, diretor do Centro para Estudos de Segurança da Universidade de Georgetown. "Eu não acho que eles ambicionem tomar todo o país, apesar de que ficariam contentes com isso."

Apesar dos rebeldes sírios terem inicialmente acolhido o grupo como um poderoso aliado na guerra civil contra o presidente Bashar Assad, muitos agora se ressentem por ele ter colocado sua agenda jihadista internacional à frente da luta para derrubada do governo. Ativistas antigoverno dizem que detestam a brutalidade do grupo e a imposição de códigos sociais rígidos, e até mesmo outros rebeldes islâmicos dizem que o foco da luta deve permanecer na mudança do regime.

As tensões provocam combates frequentes entre os grupos rebeldes, o que mina o esforço para combater o governo e pode complicar os esforços para eliminação das armas químicas da Síria. Uma equipa da Organização para a Proibição de Armas Químicas chegou a Damasco na terça-feira para discutir com as autoridades sírias a logística da destruição do arsenal químico do país. Representantes do grupo disseram que manter seu pessoal seguro em meio a uma guerra civil em andamento será extremamente difícil.

A ascensão dos grupos extremistas exacerbou a instabilidade na Síria. O Isis atacou bases rebeldes para capturar suprimentos e desviou grupos rebeldes no mês passado para a tomada de Azaz, uma cidade estratégica próxima da fronteira turca, levando a um tenso cessar-fogo. Na semana passada, combatentes da Al Qaeda tentaram invadir uma aldeia na província de Idlib para sequestrar alguns rebeldes, deixando 20 mortos de ambos os lados, incluindo o comandante líbio dos jihadistas.

"Nós queremos manter a Síria unida como um país de liberdade e igualdade", disse via Skype o líder de um grupo rebelde islâmico contrário ao Isis chamado Suqour al-Sham, que disse se chamar Abu Bashir. "Eles querem formar um Estado islâmico unido ao Iraque."

Em uma declaração de áudio divulgada online na noite de segunda-feira, um porta-voz da Al Qaeda defendeu o grupo, dizendo que suas contribuições para a luta anti-Assad não são devidamente apreciadas e negando que ele iniciou as lutas contra outros grupos rebeldes.

"Aqueles que buscam colocar o grupo de lado são muitos, devido a crenças e doutrinas incorretas", disse o porta-voz, Abu Mohammed al-Adnani al-Shami. "Eles são ávidos por poder e pelas coisas sem valor deste mundo."

Analistas dizem que o grupo é uma ressurreição e prolongamento da Al Qaeda no Iraque, cuja insurreição alimentada pelo sectarismo levou o país até a beira de uma guerra civil em 2006 e 2007, antes do grupo sofrer grandes derrotas pelas mãos de combatentes tribais e de tropas americanas.

Na Síria, entretanto, o grupo encontrou um vasto território que caiu nas mãos dos rebeldes perto das fronteiras norte e leste da Síria e que é um ambiente ideal para se reagrupar e promover sua agenda.

A área não tem Estado e é coberta por uma fraca colcha de retalhos de conselhos locais e grupos rebeldes que lutam para administrar suas cidades, frequentemente competindo uns com os outros por recursos. Isso dá ao grupo uma ampla área para trabalhar sem inimigos imediatos. A porosidade das fronteiras iraquiana e turca também facilita para o grupo trazer suprimentos e combatentes.

Brian Fishman, um ex-diretor de pesquisa do Centro de Combate ao Terrorismo em West Point e atualmente membro da Fundação Nova América, disse que esses fatores dão à Al Qaeda um ambiente mais favorável na Síria do que jamais teve no Iraque.

"As condições na Síria estão maduras para o Isis há algum tempo", ele disse.

O grupo é comandando por um iraquiano chamado Abu Bakr al-Baghdadi. Seus combatentes vêm de todo o mundo árabe, da Tchetchênia e da Europa, comandados por emires locais aos quais eles juram lealdade, segundo rebeldes em contato com o grupo.

Apesar dos combatentes lutarem ao lado dos rebeldes contra o governo, os rebeldes dizem que o grupo parece se concentrar em áreas já tomadas de Assad, mesmo que isso signifique expulsar os rebeldes.

"A ideia é que eles estão tentando controlar as áreas que já foram libertadas", disse Thaer Shaib, um combatente rebelde da província de Idlib. "Nós vamos para a linha de frente, libertamos as áreas e deixamos poucos combatentes para trás visando avançar, e então eles chegam e nos atacam pelas costas."

Por todas as áreas espalhadas que os jihadistas estrangeiros controlam ao longo da fronteira norte da Síria, eles proibiram fumar em público e atacaram as aldeias curdas, algumas das quais com tréguas acertadas com os rebeldes.

Em Raqqa, a única capital regional que caiu sob controle completo dos rebeldes, o Isis estabeleceu bases em prédios públicos, executou publicamente membros da minoria alauita de Assad e deteve ativistas que protestavam contra ele.

"Eles controlam por meio do medo, realizando execuções públicas, circulando em máscaras, exibindo suas armas, matando e sequestrando qualquer um que se oponha a eles ou aos seus atos", disse um ativista em Raqqa, que se recusou a dar seu nome por temer ser caçado pelos extremistas.

Apesar de às vezes cooperarem em batalha, o Isis é separado do primeiro grupo da Al Qaeda a surgir na Síria, a Frente Al Nusra, cujo líder rejeitou a proposta de fusão neste ano.

Desde então, o Isis recebe o afluxo de combatentes estrangeiros, enquanto a Frente Al Nusra passou a ser mais aceita pelos rebeldes por manter seu foco na luta contra Assad.

Na semana passada, 10 brigadas islâmicas assinaram uma declaração com a Frente Al Nusra pedindo um Estado Islâmico e rejeitando a oposição no exílio, a Coalizão Nacional Síria. Membros dos grupos que assinaram disseram que a declaração também visa projetar a união entre as brigadas rebeldes islâmicas que não compartilham a agenda do Isis.

O Isis deixa clara sua visão para a Síria nos vídeos que divulga nos sites militantes, mostrando seus combatentes buscando ajudar os pobres, disseminando sua interpretação rígida do Islã e matando aqueles que considera infiéis.

Um vídeo sobre uma recente ofensiva do Isis na província central de Hama mostrou um comandante expondo os planos de combate a um grupo de combatentes, com imagens do Google Earth projetadas em uma parede.

"Nós temos que lhes ensinar que os planos deles fracassarão", disse o comandante não identificado. "A Síria será um califado islâmico, queira Deus."

Imagens posteriores mostravam vários combatentes bem armados, alguns falando árabe cheio de sotaque, partindo para o combate e cantando: "Nós estamos indo massacrá-los, ó alauitas", uma referência à seita de Assad.

O grupo não esconde suas operações transfronteiriças nem sua brutalidade para com aqueles que considera inimigos. Em outro vídeo, um grupo de combatentes para três caminhoneiros em uma estrada, que acredita-se que cruze a fronteira iraquiana, e pergunta a eles quantas vezes eles se curvam durante a oração matinal, uma pergunta fácil para um muçulmano devoto.

Os homens, que eram alauitas, chutam incorretamente. Os combatentes os declaram infiéis, os fazem se ajoelharem à margem da estrada e os fuzila. Então um combatente atira um coquetel Molotov em um dos caminhões, o incendiando.

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