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terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Outra Rússia para o mesmo Putin


Pessoas que trabalham nas eleições parlamentares russas esvaziam urnas em colégio eleitoral de São Petersburgo 


Estranhamente, as mesas do Café Moscou, em torno do relógio de água do shopping center Evropeiski, estavam no último domingo (4) meio vazias. Assim como o tempo fora desse refúgio de cristal, assim como toda a campanha eleitoral: cinzentas, sem vida, nubladas. No domingo seria um dia especial, com eleições, e o ambiente, de festa, com as muitas árvores natalinas que tão cedo foram montadas em Moscou. Mas, ao contrário do esperado, a capital estava um pouco adormecida.

Seria a chuva, com seus tímidos flocos de neve? Poderia ser a falta de Sol neste estranho começo de inverno, ou talvez a expectativa política, ou pior: o começo de uma nova etapa, tendo como perspectiva os piores presságios econômicos da era Putin.

Realizadas ontem as eleições na Duma [Assembleia Nacional], a partir de agora a vida política será marcada pelas eleições presidenciais do dia 4 de março, que, com quase total certeza, serão ganhas pelo atual primeiro-ministro e homem forte russo. E, depois, seja o que Deus quiser no campo da economia. Tão cambiante, tão pouco previsível e tão temido na vizinha e rica Europa.

Um relatório recente do Conselho Europeu de Relações Exteriores, um think tank pan-europeu, levantou a questão “O mesmo Putin, uma Rússia diferente?”, e constatou que as previsões de 2006 de que Moscou viraria uma das capitais financeiras do mundo e o rublo seria uma moeda de referência caíram por terra diante de turbulências econômicas que podem ter influenciado na escorregadela do partido Rússia Unida nestas eleições parlamentares.

Em 2008, quando a crise chegou com força, Putin trocou a retórica de “superpotência energética” pela necessidade de diversificar a economia e dos investimentos estrangeiros para sustentar a produção de hidrocarbonetos. Em 2009, o PIB russo caiu cerca de 8,9%. “A Rússia pós-Bric percebeu que estava longe de ser autossuficiente”, diz o relatório.

No último ano e meio a Rússia retomou o caminho do crescimento, mas com cerca de 3,6% a 4%, muito longe das cifras de antes de 2008.

Um relatório da agência Moody’s de outubro passado e especialistas e profissionais dos bancos russos esperam pelo que se chama aqui de “a segunda onda da crise”. Aqueles que acreditam que a festa continua apresentam como argumento as enormes reservas de ouro e de divisas, as terceiras maiores do mundo, equivalentes a pouco mais de US$ 500 bilhões. Os pessimistas que ontem tampouco teriam passado pelo Café Moscou temem que a excessiva dependência do petróleo e das matérias-primas aumente a vulnerabilidade da Rússia em relação às flutuações internacionais.

A ministra da Economia, Elvira Nabiulina, calculou que se o preço do petróleo baixar para US$ 60 o barril, o atual crescimento positivo pode novamente virar negativo. Os orçamentos estatais, que atualmente se baseiam em um barril de Brent a US$ 116, não ajudam a dissipar os temores.

“Precisamos muito de novos projetos e negócios. Essa será a fonte da nova industrialização da Rússia”, disse Putin no fórum da VTB Capital de outubro. Mas os investidores estrangeiros são pouco propensos a investir na Rússia, o que estanca a produtividade. O excesso de burocracia e a má infraestrutura são algumas das causas que espantam o investidor estrangeiro, mas também o investidor russo, que prefere tirar o dinheiro do país. E, sobretudo, a endêmica corrupção. A Rússia melhorou no recente relatório da Transparência Internacional, publicado neste mês de dezembro. Mas ela continua bem atrás na classificação, ocupando a 143ª  posição entre 183 países, ao lado, entre outros, do Azerbaijão, de Belarus, das Comores, de Togo e de Uganda.

Outros dados se somam à pilha de preocupações. Um estudo realizado em maio pelo Centro Levada indicava que vem aumentando o número de russos que querem abandonar o país por não verem futuro ali. Cerca de 22% dos que responderam à pesquisa dos sociólogos queriam imigrar, para melhorar suas expectativas de vida, contra cerca de 13% em outra pesquisa realizada em abril de 2009.

Vladimir Putin mantém uma popularidade indiscutível de 67%, segundo as últimas pesquisas.

Sua volta ao Kremlin, combinada com o presidente Dimitri Medvedev, pode alegrar as elites que veem um horizonte complicado, marcado por difíceis desafios, talvez por tensões sociais que precisariam de decisões corajosas suas. Mas o Café Moscou continuará meio vazio em dias de festa, enquanto o futuro seguir nublado.

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