Combatente do Talibã em Herat |
Para muitos talebans, o início do inverno marca o fim dos combates e o início de uma migração para o Paquistão, de onde só voltarão para retomar a luta, a partir de abril ou maio. Durante esses longos meses, alguns se estabelecem nas madrassas (escolas religiosas) no Paquistão, ao longo da fronteira com o Afeganistão. Os chefes militares ou os representantes do Estado paralelo instaurado pelos talebans também atravessam a fronteira paquistanesa, mas muitas vezes permanecem em Quetta ou vão até Karachi, hospedados em confortáveis casas. Somente os combatentes rasos, frequentemente camponeses, permanecem no local e alimentam lentamente a insurreição.
Portanto, o fim de novembro é um período ideal para tentar encontrar alguns deles em Candahar. Vindos das zonas de combates mais brutais, eles fazem paradas de alguns dias na segunda maior cidade do país, antes de prosseguirem para o Paquistão. Mokhless, originário do vilarejo de Kashta Sayedan, perto da pequena cidade de Moshan, no distrito de Panjwayi, centro da província de Candahar, se viu no centro da ofensiva lançada no dia 17 de outubro pelas tropas americanas nessa parte da província. Essa zona, que por um tempo foi ocupada pelos canadenses, havia sido abandonada em razão da perseguição dos talebans locais. Graças aos reforços americanos empregados este ano, as forças da coalizão retomaram seu controle.
“Por enquanto”, explica Mokhless, “as pessoas estão contentes, estão lhes prometendo uma estrada asfaltada, e os americanos distribuem somas colossais de dinheiro bem além das indenizações pagas pelos danos causados pela ofensiva”. Esse afluxo de dinheiro vivo, que representa anos de salário para uma população pobre e rural, criou agitação entre os insurgentes. “Foi preciso resolver o conflito entre os talebans locais que pegavam o dinheiro e aqueles, vindos de fora, que faziam pressão sobre as pessoas para que elas não pegassem. O alto comando, em Quetta, disse que podiam pegar o dinheiro dos infiéis.”
A ofensiva em si teria feito somente poucos estragos entre os insurgentes. “Eles escolheram a época errada. Em campo, há somente os combatentes rasos, 90% daqueles que contam estão no Paquistão, em Quetta, e sobretudo em Chaman, mais ao sul, pois lá a rede de telefone afegã funciona.”
Embora desminta que a liderança taleban tenha sido decapitada, ele confirma os comunicados da Otan indicando que rotas de abastecimento foram cortadas e que está sendo sentida a falta de dinheiro para compra de armas.
Nem sempre os talebans estiveram em casa nesse distrito. Segundo ele, eles haviam perdido toda a credibilidade nessa zona após sua queda, no fim de 2001. Depois se recuperaram, em 2004: a corrupção e os abusos da polícia local convenceram os habitantes de que o regime taleban era um governo mais justo. “Durante a grande ofensiva de 2006, quando atacamos em peso as forças canadenses que nos bombardeavam, a população matava de livre e espontânea vontade seus carneiros para nos alimentar.”
Mas, no fim de 2007, as pessoas condenaram a decisão do chefe taleban da região, Sadiq Agha, de enforcar onze pessoas em duas semanas por espionagem. “Não havia nenhuma investigação, as pessoas diziam que fulano era espião, por simples motivos tribais.”
Entretanto, a população continua a financiar os talebans locais por meio do zakat, caridade destinada aos mais pobres, transformada em imposto. “As pessoas fazem isso porque não veem os talebans simplesmente como combatentes, mas também como um movimento social e político”. Por essa razão, Mokhless se diz “cético” quanto ao sucesso de uma reconciliação nacional. “Você tem dois chefes cara a cara, o presidente Karzai e o mulá Omar, que ainda é o líder da oposição. É impossível que eles se entendam”.
Mas o zakat não basta para financiar o movimento taleban. Segundo Mokhless, 80% dos líderes talebans têm contato com os principais traficantes de drogas do país, que lhes fornecem dinheiro e fazem contrabando de armas. Esse dinheiro em si não é suficiente para permitir que os talebans desafiem a longo prazo um exército superequipado de 150 mil homens.
Para resistir e prosperar, os laços com o Paquistão pareciam essenciais. “Em Quetta, só se tem direito ao porte de uma pistola, e os serviços secretos paquistaneses [ISI] dão telefones por satélite aos chefes, mas o hospital é gratuito para os combatentes.” Somente os comandantes teriam conexão com o ISI. “Eles lhes dão muito dinheiro e compram para si uma casa, seja em Quetta, seja no Afeganistão; eles lhes fornecem também material para as madrassas; meu tio, que é um comandante importante, conseguiu comprar terras.”
E o domínio paquistanês não parece pronto a relaxar. “Neste verão um comandante do distrito de Maywand, Hajimollah Hadam, que havia se queixado do papel do ISI, foi convocado a Quetta e preso. Nunca mais foi visto novamente.” Mas o abismo entre os soldados rasos no Afeganistão e os chefes refugiados em Quetta deu origem a ressentimentos. “No fim de 2007, fui convidado para uma grande reunião em Quetta”, conta Moklhess. “Havia um banquete, e o dinheiro gasto era chocante em comparação com aquilo que os soldados vivem no dia a dia no Afeganistão, dormindo nas vinhas e comendo pouco.”
A composição das tropas talebans também influencia nessa conscientização. “Em 2006-2007, 40% dos talebans eram daqui, 50% vinham do Paquistão e 10% eram estrangeiros, incluindo árabes; em 2010, eram 60% de talebans locais”.
“Por dentro, comecei a me distanciar a partir dos enforcamentos, aquilo ia contra minhas crenças. Demorei, mas saí”, diz. Se os talebans voltarem ao poder, ele verá então o que fazer. “Talvez eles consigam, eles não têm a tecnologia, mas têm a determinação”.
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