Aeronaves não tripuladas usadas pelos EUA não apenas mudam a guerra, como também as vidas dos responsáveis por fazê-las voar
Piloto controla aeronave remotamente em central de Hancock, no Estado de NY |
Quando recebe uma ordem para disparar um míssil para matar um militante - e Brenton disse que só o faz quando as mulheres e crianças não estão por perto –, ele fica arrepiado, tal como ficava quando pilotava seu caça F-16 no campo de batalha.
Depois, como nos velhos tempos, ele segue a ordem. "Não sinto nenhuma ligação emocional com o inimigo", disse. "Tenho um dever a ser feito e cumpro as ordens que me são dadas."
Aviões não tripulados não apenas estão revolucionando as táticas de guerra americana, mas também estão mudando de forma profunda a vida das pessoas que os operam.
Brenton reconhece a estranheza de estar lutando uma guerra com um controle remoto de seu assento acolchoado em um subúrbio americano.
Ele esteve no Iraque e diz que quando "você aterriza sem armas em seu F-16, as pessoas têm uma ideia do que você acabou de fazer". Agora, ele sai de uma sala escura, sua adrenalina ainda em alta depois de apertar o gatilho, e dirige até sua casa passando por restaurantes fast-food e lojas de conveniência a tempo de chegar em casa para ajudar com a lição de casa de seus filhos - mas sempre sozinho no que acabou de fazer.
"É uma sensação estranha", disse. "Ninguém no meu ambiente imediato está ciente do que acabou de acontecer."
Normalmente considerados robôs que transformam guerras em videogames, os aviões não tripulados possuem poderosas câmeras que trazem a guerra para perto do rosto do piloto.
Entre os desafios psicológicos mais difíceis encontram-se as missões de agir como um franco-atirador aéreo. Um piloto de um avião não tripulado e seu parceiro, um operador de sensores que manipula a câmera da aeronave, observam os hábitos de um militante à medida que ele brinca com seus filhos, fala com sua esposa e visita seus vizinhos. Eles, então, atacam, quando, por exemplo, sua família está fora de casa fazendo compras no mercado.
Das dezenas de pilotos, operadores e analistas de inteligência de apoio recentemente entrevistados em três bases militares americanas, nenhum reconheceu ter qualquer tipo de ligação com os afegãos suficiente para mantê-los acordados durante a noite depois de presenciarem um derramamento de sangue deixado por mísseis e bombas. Mas todos falaram sobre uma certa intimidade que desenvolvem com a vida familiar afegã que pilotos tradicionais nunca veem dos 6 mil metros de altura de aviões tradicionais, e que até mesmo as tropas terrestres raramente experienciam.
"Você os vê acordar de manhã, os vê trabalhando e até mesmo quando vão dormir", disse Dave, um major da Força Aérea que pilotou aviões não tripulados entre 2007 e 2009 na Base da Força Aérea Creech, em Nevada, e agora treina pilotos de aviões não tripulados na Base da Força Aérea de Holloman, no Novo México. A Força Aérea, citando o que chama de possíveis ameaças, proíbe os pilotos de divulgarem seus sobrenomes. Comandantes de alto escalão que falam com a imprensa e grupos comunitários sobre a missão da base, como Brenton, em Siracusa, têm permissão para divulgar seus nomes completos.
Alguns dos pilotos falaram das emoções que sentem após disparar um míssil. Apenas os pilotos, todos eles oficiais, podem utilizar armas para realizar ataques.
"Haviam boas razões para matar as pessoas que matei, e vivo repassando isso na minha cabeça", disse Will, um oficial da Força Aérea que era piloto na base de Creech e agora treina outros na base de Holloman. "Mas você nunca consegue esquecer completamente o que fez. Simplesmente nunca vai desaparecer, acho, não para mim".
Estas complexidades devem crescer cada vez mais à medida que os militares se esforçam para atender uma demanda insaciável por mais aviões não tripulados.
Muitos pilotos de aviões não tripulados já chegaram a voar fisicamente em jatos, mas mudaram para os não tripulados como parte de um destino inevitável. "Você definitivamente se sente mais conectado com os caras que estão lá no campo de batalha", disse Dave, o major da Força Aérea, que voou aviões de transporte C-130 no Iraque e no Afeganistão.
Hoje cada vez mais bases aéreas da Guarda Nacional estão abandonando o uso de aeronaves tradicionais e utilizando aviões não tripulados para atender a demanda, entre elas o Campo da Base Aérea Hancock, que aposentou seus caças F-16 e mudou para os aviões não tripulados Reapers em 2010.
Brenton, que até então tinha mais de 4 mil horas de voo em F-16 em 15 anos de serviço ativo e uma década na implantação de zonas de guerra com a Guarda de Siracusa, disse que aprendeu a pilotar aviões não tripulados para continuar participando de combates. É verdade, aviões não tripulados não conseguem se envolver em combates aéreos propriamente ditos, mas Brenton disse que "a quantidade de tempo que eu passei enfrentando o inimigo em combates aéreos atacando alvos na terra tem sido significativo" em ambos os Reapers e os F-16.
Todos os pilotos dos aviões não tripulados rejeitam a noção de que eles estão jogando um videogame. Eles também rejeitam a palavra "aviões não tripulados" porque disseram que descreve uma aeronave que voa sozinha. Eles chamam seus aviões de aeronaves pilotadas remotamente.
"Não conheço nenhum videogame que me peça para sentar em uma cadeira durante seis horas olhando para o mesmo lugar ", disse Joshua, um operador de sensores que trabalhou na base Creech durante uma década e hoje é um treinador em Holloman. "Uma das coisas que tentamos fixar na mente de nossas equipes é que essa é uma aeronave real, com um componente humano real, e as decisões que você fizer, boas ou ruins, irão ter consequências reais."
Todos os pilotos que já pilotaram caças no campo de batalha disseram sentir falta da sensação de voar, o que para Brenton estende-se aos voos rasantes de F-16 que ele fez durante o desfile do Memorial Day. Para compensar, ele às vezes pilota um avião de hélice pequena durante os fins de semana, que ele chama de esmagador de insetos.
"É bom estar no ar", disse.
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