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quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Cidade iraquiana se organiza e consegue rechaçar militantes do Estado Islâmico

As crianças margeavam o bulevar não cuidado desta cidade do norte do Iraque na terça-feira (2), para dar as boas-vindas aos homens que as salvaram do Estado Islâmico.

Comboio atrás de comboio de homens armados passava, tocando música da vitória por alto-falantes e exibindo armamentos. Eles acenavam enquanto os moradores jovens batiam palmas e cantavam slogans religiosos, celebrando os homens que romperam o cerco dos militantes a Amerli, permitindo a chegada dos primeiros carregamentos de comida e água em quase três meses.

Foi preciso uma coalizão estranha de milícias iraquianas e iranianas com apoio aéreo americano para expulsar os combatentes do Estado Islâmico. Mas por longas semanas antes disso, a minoria de xiitas turcomanos que vivia aqui resistiu, travando uma campanha desesperada pela sobrevivência, pegando em armas para proteger os cerca de 15 mil habitantes.

Em meio aos bombardeios diários e pelo menos quatro grandes investidas pelo Estado Islâmico, a população subsistiu com sopa de cebola e pão seco. As crianças se juntavam à linha de frente durante o dia, porque não havia homens suficientes para dois turnos. Sem gás, as famílias cozinhavam em fogueiras ao ar livre alimentadas por esterco de ovelha.

O sítio a Amerli talvez seja a primeira vez que uma cidade conseguiu manter os militantes a distância desde que o grupo iniciou sua marcha pelo Iraque. Na segunda-feira (1º), a ajuda da ONU começou a chegar aos moradores famintos.

"As famílias nesta aldeia são muito corajosas", disse Abu Abdullah, o comandante da milícia Kataib Hizbollah, que ajudou os moradores.

"Não havia água, eletricidade, comida e nem leite para as crianças, mas eles se mantiveram firmes e enfrentaram" o Estado Islâmico, ele disse.

Na terça-feira, as bandeiras coloridas de pelo menos quatro milícias disputavam pela proeminência nas ruas e prédios de Amerli. Além da bandeira do Kataib Hizbollah, um grupo iraquiano sem relação com o mais conhecido Hizbollah libanês, estavam as das Brigadas Badr, Saraya al-Salam e Asaib Ahl al-Haq.

O fato de o poder aéreo americano ter ajudado não foi tão celebrado. Alguns dos milicianos enfrentaram os americanos depois da invasão ao Iraque em 2003. Abdullah falou em nome de muitos quando disse: "Nós não gostamos dos americanos e não precisamos de seus ataques aéreos".

Em um vídeo divulgado na terça-feira, o assassino de Steven J. Sotloff, um jornalista americano, fez uma aparente referência aos ataques dos Estados Unidos perto de Amerli.

Em Amerli, Abdullah disse que seus homens chegaram em helicópteros militares iraquianos passadas cerca de duas semanas do início do cerco. Eles traziam ajuda e armas, mas também habilidades especializadas. Entre eles estavam especialistas em comunicações, operações e explosivos.

Abdullah disse que suas forças se juntaram às de Amerli para ajudar fazer os militantes recuarem. Ele se recusou a dizer quantos de seus combatentes ajudaram, a oferecer detalhes operacionais ou explicar por que seus homens vieram. Ele disse apenas que seus homens estavam dispostos a encarar a missão.

"Todos ouviram os pedidos de ajuda, mas nem todos responderam", ele disse. "Nós respondemos."

Quando as milícias começaram a chegar, o Estado Islâmico tinha cercado totalmente a cidade. A oeste, ele estava a dois quilômetros de distância; ao leste, a apenas 500 metros. Os moradores cavaram trincheiras gigantes na lama ao redor de Amerli. Alguns plantaram artefatos explosivos improvisados na terra ao redor da cidade, na esperança de impedir o avanço dos militantes.

Eles planejaram com antecedência. No dia em que Mosul caiu, os líderes tribais de Amerli convocaram uma reunião na mesquita da cidade para discutir suas opções, certos de que os militantes em algum momento chegariam até eles, segundo um dos líderes, Sheikh Shahab Ahmed Barash.

Os homens juraram pelo Alcorão proteger a cidade. Eles não fugiram como outros fizeram. Os líderes começaram a dividir a cidade em áreas, geralmente de acordo com os marcos. Um líder ficou com o cemitério. Outro com a torre.

O Estado Islâmico realizou quatro grandes ataques à cidade, às vezes com mais de 100 homens e contando com veículos blindados.

Mas a maior luta travada pelos moradores de Amerli foi contra a fome, já que o cerco dos militantes impedia a entrada de suprimentos.

Durante uma série de entrevistas com comandantes, vários tiveram dificuldade de lembrar das datas exatas em que os grandes ataques ocorreram. Ibrahim Hamid Ali, um ancião de Amerli, acredita que o primeiro ataque ocorreu pouco depois das 18h de 17 de julho, quando os militantes invadiram o perímetro estabelecido pelos moradores.

"Nos disseram para não abandonarmos nossas posições", disse Barash, que controla uma área em Amerli onde vivem cerca de 200 famílias. "Se penetrassem demais, então nós decidiríamos o que fazer."

Barash e outros disseram que a luta durou até o amanhecer, quando a força aérea iraquiana começou a atingir as áreas sob controle dos militantes. Os combatentes do Estado Islâmico recuaram lentamente, incapazes de penetrar na cidade, apesar da tentativa por múltiplas frentes.

Nas várias semanas que se seguiram, disse Barash, os militantes estudaram os hábitos dos combatentes de Amerli. Eles sabiam que a cidade contava com a ajuda de meninos na defesa, mas que só estavam autorizados a lutar durante o dia, quando podiam ver o inimigo.

No dia que os moradores acreditam ter sido 5 de agosto, os combatentes do Estado Islâmico atacaram às 4h30 de manhã, enquanto os defensores de Amerli realizavam a troca de turno. Os militantes passaram pelas bermas de lama com veículos blindados, tomando um punhado de casas à margem da cidade, segundo Barash e Ali.

O relato foi corroborado por imagens de vídeo dos combatentes do Estado Islâmico, que posteriormente abandonaram aquelas casas, deixando para trás um pendrive que os combatentes de Amerli recuperaram.

Os defensores de Amerli começaram a lutar ao longo das margens da cidade. Membros do Kataib Hizbollah dispararam morteiros contra os militantes de dentro da cidade. Apesar do Estado Islâmico contar com blindados, alguns dos defensores também contavam, já que eram membros das forças armadas iraquianas que fugiram antes, mas trouxeram seus Humvees consigo e decidiram ajudar Amerli.

A força aérea iraquiana em uma ocasião atacou acidentalmente uma área com combatentes de Amerli, disseram os moradores, ferindo nove pessoas. Posteriormente, após coordenação com as forças em terra, eles corrigiram e começaram a atacar áreas mais distantes da cidade, disseram os moradores. Ao anoitecer, os militantes começaram a recuar.

Enquanto examinava a área depois, Barash encontrou vários corpos de combatentes do Estado Islâmico que os militantes não conseguiram recuperar. Em pé ao lado de um, Barash ouviu um telefone tocando dentro do bolso do insurgente. Ele atendeu o telefone e disse: "Venha e pegue seu corpo".

Mas um velho respondeu, chorando. Ele disse a Barash que o Estado Islâmico tirou seu filho dele quando tomaram sua aldeia. Os militantes lhe deram uma escolha: ele poderia lhes dar sua filha ou um de seus filhos.

Chorando ao telefone, o velho disse que seu filho era adolescente, que não tinha idade suficiente nem mesmo para ter pelos faciais e que nunca aprendeu a lutar. "Eu lhe disse que lamentava", disse Barash.

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