Na segunda-feira (19), os policiais do setor de Rafah que circulavam a bordo de dois micro-ônibus em uma estrada do Sinai do Norte, a leste do Egito, foram pegos em uma emboscada. Homens armados atiraram com morteiros e armas automáticas em seu comboio, matando 25 deles. O ataque, o mais letal em anos no Sinai, despertou temores de que se esteja perdendo o controle da região, que se tornou um santuário jihadista. No triângulo formado pelas cidades de Al-Arish, Rafah e Sheikh-Zweid, na fronteira com Israel, não se passa um dia sem que as forças de segurança egípcias sejam alvo de ataques.
Pelo menos 75 membros das forças de ordem, bem como dois cristãos coptas, foram mortos desde a queda do presidente Mohammed Mursi, no dia 3 de julho. O aumento no número de tiros de morteiros sobre seu território a partir do Sinai convenceu Israel a instalar uma bateria antimísseis do "Domo de Ferro" na estação balneária de Eilat.
O Cairo atribui esses ataques, raramente reivindicados, aos "terroristas", um termo que se tornou sinônimo de Irmandade Muçulmana e de seus aliados islamitas. O Egito vê ali também a marca do movimento islamita palestino Hamas, acusado de apoiar os combatentes do Sinai para desestabilizá-lo. "Os militares egípcios não têm nenhuma prova concreta de qualquer envolvimento de Gaza", diz Ahmed Youssef, primeiro-ministro do governo do Hamas na Faixa de Gaza. "Se eles detiverem combatentes palestinos e nos submeterem os nomes, faremos uma investigação. Desde o início, manifestamos nossa neutralidade no conflito interno no Egito."
"Desejo de vingança"
Para Omar Ashour, especialista em Sinai na Universidade Exeter, no Reino Unido, na verdade operações conjuntas são conduzidas entre beduínos dos dois lados da fronteira, que mantêm laços familiares, mas mais com ex-militantes do Hamas, que desertaram.
Há vários anos uma realidade complexa vem se esboçando no local, nutrida por relações conflituosas entre a população majoritariamente beduína e o governo central. A repressão feroz e a prisão de milhares de beduínos, após os atentados de Taba e de Nuweiba em outubro de 2004, e os de Sharm el-Sheikh em julho de 2005, "alimentaram um desejo de vingança contra as forças de segurança", observa Omar Ashour.
É uma vingança que move "grupos de lógicas muito diferentes, que se aproveitam do caso para promover seus interesses: desde grupos de traficantes até os grupos mais ideológicos, como os takfiristas, partidários da excomunhão dos infiéis, ou salafistas jihadistas egípcios que se reconhecem na rede Al-Qaeda", explica Dominique Thomas, especialista em movimentos jihadistas. A insurreição se endureceu após a revolução de 2011, com a desestabilização do aparelho securitário e o afluxo de armas a partir da Líbia e do Sudão.
Personalidades jihadistas que fugiram da prisão, como Ramzi Mawafi, o médico de Osama Bin Laden, ou perdoados pelo presidente Mursi, se juntaram aos cerca de 3.000 combatentes que teriam encontrado refúgio nas zonas montanhosas que se estendem até o mar Vermelho com o apoio de proteções tribais.
"O Sinai, uma ameaça securitária clara para Israel"
Em Al-Arish, a capital da província do Sinai do Norte (120 mil habitantes), a vida está em suspenso. Os ataques redobraram diante da repressão dos partidários do presidente Mursi. Quase 15 mil pessoas fizeram uma passeata na cidade, algumas fortemente armadas. "Eles saíram às ruas para exigir vingança. Homens passavam pela multidão recolhendo doações para comprar armas e munições", afirma um habitante de Al-Arish, que preferiu manter o anonimato. "Durante a noite, era como em Falluja, no Iraque, com trocas de tiros em cada esquina."
Em toda a região, os postos fronteiriços foram reforçados. O exército enviou para lá recursos extras, com a anuência de Israel, conforme as disposições dos acordos de paz de 1979. Temporariamente, veículos blindados, helicópteros Apache e cerca de 5.000 homens foram autorizados a se movimentarem pela zona desmilitarizada do Sinai, principalmente a zona C, fronteiriça com Israel.
"O Sinai representa uma ameaça securitária clara para Israel desde os anos Mubarak. É também uma fronteira de paz há quarenta anos, o que é um trunfo estratégico para Israel. O caos no Sinai seria um pesadelo para a segurança de Israel e a economia do sul do país", justifica uma fonte israelense. É um interesse comum que leva os dois exércitos a cooperarem, talvez mesmo durante operações antiterroristas, como a ofensiva que matou diversos jihadistas, em Rafah, no dia 9 de agosto, atribuída por alguns a um tiro de drone israelense.
"Romper o círculo vicioso da repressão"
Apesar dos temores, o Estado hebreu quer acreditar na capacidade do exército egípcio para conter o caos do Sinai. "O problema é que o Sinai não é o único palco de confrontos para o Egito e o exército dá prioridade às outras cidades egípcias", ressalta a fonte israelense. Os especialistas estimam que o desdobramento militar egípcio no Sinai é insuficiente para enfrentar combatentes experientes e que conhecem perfeitamente o território. Para as tropas, as operações são perigosas.
Mohammed Sabry, um capitão de polícia de 27 anos, está se recuperando de uma ferida a bala no hospital da polícia de Agouza, no Cairo, após um ataque contra seu comboio, no dia 16 de agosto. Ele se considera sortudo, pois dois de seus amigos morreram em serviço nos últimos cinco dias. "Todos os oficiais enviados ao Sinai sabem que eles serão mártires", ele conta, resignado. "Não escolhemos isso, mas se for o preço para impedir essa gente de assumir o poder, estamos dispostos a pagá-lo."
O exército diz ter matado 70 jihadistas. Ele aposta na prisão de líderes islamitas, como o salafista Mohamed el-Zawahiri, irmão do número um da Al-Qaeda, supostamente ligados ao movimento insurrecional no Sinai. Para Omar Ashour, o exército se engana de alvo e de método. "A violência é ação de pequenos grupos não estruturados. Será necessária uma repressão de grande escala para acabar com ela. Vivemos isso por doze anos, não funcionou. É preciso romper o círculo vicioso da repressão e começar a criar uma política que leve em conta as ameaças securitárias em longo prazo, bem como as necessidades de desenvolvimento da região."
Vamos colocar é o norte como diz o texto, é bem diferente do sul que tem resorts, mas o norte sempre foi local de jihadistas e contrabandistas principalmente por causa do bloqueio a Gaza e também por que o Egito criou vários obstáculos para desenvolvimento da região por anos, como forma de punição ao que consideravam apoio deles a Israel durante a ocupação.
ResponderExcluirA força da Irmandade com eles que tinha projetos sociais na região e as críticas a segregação tornaram-nos populares.
Ninguém em sã consciência que ficou sem perspectiva por anos por uma política oficial agora irá apoiar o que consideram o retorno de quem os desamparou.
Tanto que a frase do final do Omar Ashour demostra como vai ser difícil utilizando a velha fórmula de repressão fazer com as coisas acalmem lá.