segunda-feira, 18 de março de 2013

Líder afegão muda discurso para rescrever seu legado

Hamid Karzai

A maior sombra na política afegã vem de um poste de trânsito que ficava na praça Ariana do lado de fora do palácio presidencial: foi onde o Taleban enforcou Najibullah, o último presidente do governo comunista, logo depois de entrar em Cabul em 1996.

Essa história, e a realidade de que todos os líderes afegãos modernos foram depostos ou executados, certamente não escapou ao presidente Hamid Karzai à medida que ele enfrenta o que deve ser seu último ano de mandato --e com a retirada militar dos EUA bem adiantada.

Em busca de um fim mais nobre do que de seus antecessores depois de seu longo mandato no palácio, Karzai está fazendo uma aposta: está intensificado a difamação de seus aliados norte-americanos num momento crítico às vésperas da retirada das forças dos EUA, arriscando o apoio norte-americano a fim de se salvar politicamente.

Mesmo enquanto seu governo está negociando os termos para uma presença militar duradoura dos EUA, só nas duas últimas semanas ele ordenou a retirada das forças de Operações Especiais de uma província crucial, protestou contra armações da CIA, rejeitou os termos dos EUA para entregar presos e, mais recentemente, até comparou os Estados Unidos ao Taleban como forças complementares que trabalham para minar o governo.

Entrevistas com líderes tribais, empresariais, analistas políticos e diplomatas pintam a imagem de um líder que está desesperadamente tentando sacudir sua imagem de um lacaio dos EUA, apelando para sentimentos nacionalistas e invocando a soberania do Afeganistão.

Muitos, porém, acreditam que Karzai não é capaz de compreender totalmente os riscos que ele está assumindo ao apostar que os Estados Unidos comprometerão bilhões de dólares em ajuda militar e econômica nos próximos anos apesar das diferenças crescentes com ele, dos desafios orçamentários e econômicos no país e do cansaço da batalha depois de uma longa guerra.

"Karzai, muito confiante de que os americanos precisam permanecer indefinidamente e com muito já investido até agora, acredita que ele tem muita influência e pode pressionar o quanto quiser porque conseguiu o que quis no passado", disse Saad Mohseni, empresário afegão que é próximo de muitos integrantes da equipe de Karzai.

Ele administra o Grupo Moby, uma empresa internacional de mídia que inclui a Tolo, a rede de televisão mais popular do Afeganistão.

"A segunda coisa é o seu legado: faltando apenas 12 meses para sair, ele tem a tarefa de mudar a narrativa. Ao invés de ser a pessoa que foi instalada por meio do processo de Bonn", diz Mohseni, referindo-se à conferência de 2001 que estabeleceu um governo pós-Taliban, "ele quer ser lembrado como o cara que expulsou os "estrangeiros" --nesse caso, os norte-americanos".

Os EUA e outras autoridades ocidentais no Afeganistão se esforçaram para tranquilizar o público afegão --e Karzai-- de que não vão abandoná-los como os russos fizeram. Essa retirada, no início de 1990, levou ao colapso do governo e do exército e, finalmente, à guerra civil.

Os números da Casa Branca, entretanto, não mostram tanta certeza. O presidente Barack Obama ainda não decidiu quantos soldados poderão ficar no país depois que as unidades de combate saírem, no final de 2014. Muitos números foram lançados, mas nada foi decidido.

"Até que ponto lidar com ele se torna um problema político tão grande para que as pessoas em Washington, no Congresso, digam: 'vamos repensar os planos um pouco'?", disse um funcionário ocidental em Cabul.

"Acho que Karzai não entende isso totalmente  --o avanço da sensação dos EUA sobre isso", diz o funcionário, que falou sob condição de anonimato devido à sensibilidade das negociações em andamento.

Muitos observadores afegãos dizem que Karzai está tentando se manter politicamente potente durante o último ano de seu mandato para pelo menos três eleitorados afegãos: sua base étnica pashtun; os líderes étnicos Tajik e Hazara em seu governo; e, sobretudo, o Taleban, que rejeitou as negociações com ele.

Em seus últimos discursos, Karzai às vezes adotou um tom esperançoso ao expressar o desejo de ser o líder afegão que conseguirá unir as facções do país, inclusive trazendo o Taleban do campo de batalha.

E em sua recente proibição dos comandos norte-americanos na província de Wardak, um reduto do Taleban, alguns observadores afegãos veem uma tentativa de atingir os insurgentes, provando que ele tem o poder de interromper a ação militar contra eles.

Outros acreditam que ele está tentando mexer com as frustrações dos afegãos com os veículos militares estrangeiros gigantes em suas estradas, soldados estrangeiros fortemente armados e patrulhas à pé em suas terras e incursões noturnas em suas casas.

Mas como suas palavras tiveram apenas um efeito limitado sobre os norte-americanos, eles parecem cada vez mais vazias para muitos afegãos.

Ao mesmo tempo, a realidade em terra mudou: cada vez mais, a guerra está sendo travada --e em alguns casos, abusos estão sendo cometidos-- pelas forças afegãs que, acredita-se, estão agindo em nome de Karzai, apesar de terem sido em sua maioria treinadas pelos norte-americanos.

Isso faz com que Karzai esteja buscando novas maneiras de provar que ele não é, como o Taleban insiste, "a marionete-chefe dos EUA".

"O presidente Karzai gostaria de se retratar como um herói nacional", disse Malek Sitez, conselheiro da Sociedade Civil e Rede de Direitos Humanos do Afeganistão. "Ele está de certa forma assumindo uma postura anti-estrangeiros, e muitas pessoas comuns no Afeganistão gostam disso. Mas ele não entende como ele e seu governo são totalmente dependentes economicamente da comunidade internacional e não entende o impacto de seus discursos sobre essa relação."

Muitos aqui veem um eco disso nos últimos dias do governo de Najibullah, quando, depois que os russos decidiram se retirar, o presidente adotou uma posição cada vez mais nacionalista e ainda disse aos russos para irem embora e deixarem o financiamento para os militares. Essa é praticamente a mensagem que Karzai enviou aos norte-americanos e ao mundo, diz Sitez.

Para os afegãos que estão mais na base, há pouca fé no governo afegão e nos norte-americanos.

"Agora Karzai está tentando enganar as pessoas dizendo que simpatiza com o povo afegão e também está tentando mostrar os talebans que 'agora eu sou independente dos americanos'", disse Hajji-Abdul Majeed Khan, líder tribal de Arghistan, um distrito na província de Kandahar onde Karzai já teve apoio.

"Não acho que Karzai e os norte-americanos não tenham nenhuma disputa --ambos estão fazendo um jogo duplo para jogar poeira nos olhos das pessoas e trazer outro governo de marionete para o Afeganistão."

Um ancião da província de Khost, no sudeste do Afeganistão, sugeriu que os comentários negativos de Karzai eram muito mais pessoais do que coletivos.

"Todos os afegãos não compartilham de suas opiniões e ideias", disse o ancião Yusuf Entezar. "Não vamos esquecer que durante muito tempo houve muita discordância entre Karzai e os norte-americanos por um lado. E ele não conseguiu fortalecer o Estado de direito, e agora está tentando encontrar algumas conquistas que possa mostrar para as pessoas."

Muitos afegãos que detêm autoridade tribal ou no governo também passaram a contar com os projetos de desenvolvimento e de segurança fornecidos por soldados e civis norte-americanos.

"Essa é uma conversa política", disse Haji Agha Lalai, chefe do conselho provincial de Kandahar e um dos poucos aliados de Karzai que estava disposto a falar com um repórter sobre os comentários do presidente. "Esse tipo de observações que estão sendo feitas por Karzai fazem as pessoas se preocuparem com o futuro do Afeganistão."

Quaisquer reclamações sobre os EUA nas recentes declarações de Karzai, nas quais ele praticamente alegou que o Taleban e os norte-americanos estão em conluio, são insignificantes em comparação à reação do Taleban. Eles emitiram uma resposta abrasadora na segunda-feira em que rejeitaram Karzai como um hipócrita miserável, que se alimenta e se veste com dólares dos EUA.

O nacionalismo "não salvou Najibullah nem vai salvar Karzai; a nação afegã é uma das nações do mundo que sabe quem são seus fantoches e seus heróis", disse um comunicado do Taleban, escrito por um homem identificado como Qari Habib.

"Hamid Karzai, no final de seu mandato, recorreu à mesma hipocrisia que o Dr. Najibullah", continuou a declaração. "Nós lhe oferecemos um conselho de graça: Não tome este caminho, porque ele leva à praça Ariana."

2 comentários:

  1. O nacionalismo "não salvou Najibullah nem vai salvar Karzai; a nação afegã é uma das nações do mundo que sabe quem são seus fantoches e seus heróis", disse um comunicado do Taleban, escrito por um homem identificado como Qari Habib.==== Nada vai salvar esse fantoche e mt menos os ianks q tiverem dentro das terras Afegãs dos atakes do TELEBANS....mt certos.Sds.

    ResponderExcluir