segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Treinamento prepara pilotos para encarar mundo de cabeça para baixo


Por meio de testes, Marinha dos EUA exige que seus pilotos renovem suas habilidades de sobreviver a situações adversas

Kelsey Martin consegue cumprir o treinamento no Centro de Treinamento para Sobrevivência em Aviação em Whidbey, Washington

O piloto estava amarrado a uma cadeira, como se estivesse no banco traseiro de um helicóptero. Ao lado dele, em uma parede falsa, havia uma janela fechada.

O piloto usava óculos velados. Ele não conseguia ver a janela ou qualquer outra coisa. A cadeira era presa a uma moldura rotativa que ficava no fundo de uma piscina, cuja água ia até a altura do peito. Um suboficial girou a moldura, virando a cadeira para trás com um barulho suave. Com isso, o piloto ficou submerso na água de cabeça para baixo.

Outro exercício no teste tinha começado. O piloto - com os pés perto da superfície, a cabeça perto do fundo e sem poder enxergar nada - precisava desconectar as fivelas do cinto de segurança, abrir a janela e sair em uma série de movimentos que visam simular o que ele poderia fazer caso a aeronave que pilota caísse no mar à noite.

De quatro em quatro anos, os pilotos da Marinha precisam renovar suas habilidades em escapar de aeronaves acidentadas na água e de descer de paraquedas sobre a água. A reciclagem, dependendo da base de cada estudante, acontece em escolas como o Centro de Treinamento para Sobrevivência em Aviação, localizado na base naval de Whidbey, no litoral do Estado de Washington.

Pela forma peculiar com que esse treinamento, ao mesmo tempo assustador e exigente, é visto por aqueles que muitas vezes são submetidos a ele. O curso pode ser ao mesmo tempo apreciado e detestado.

O piloto que foi virado de cabeça para baixo, o tenente comandante Kelsey N. Martin, lutou com a fivela do cinto brevemente. Ele logo se soltou e nadou pela janela sem a assistência do nadador de resgate que acompanhava o treinamento. Mais tarde, ele revelou o sentimento comum entre os pilotos.

"Eu não estava ansioso para isso", disse, antes de acrescentar: "Esse treinamento é realmente muito valioso. Eu digo isso porque eu conheço quatro pilotos que passaram por essa situação e todos sobreviveram."

O sofrimento com a cadeira que vira de cabeça para baixo - conhecida como Treinador Modular de Egresso Raso - foi apenas um de muitos exercícios.

Martin e seus colegas também tiveram que passar por um teste de natação usando botas, macacão e capacete, demonstrar que poderiam inflar um salva-vidas com um tubo de respiração dentro da água, e completar vários exercícios situacionais, inclusive escapar de um paraquedas enquanto se era puxado para trás.

Esse treinamento buscava replicar a experiência de ser puxado para trás na superfície do oceano por um paraquedas inflado por ventos fortes, algo que poderia afogar um piloto que tivesse sobrevivido a um acidente com sucesso.

O exercício final, chamado de mergulhão, envolvia usar óculos velados durante uma simulação de queda em que um helicóptero é despejado na água de uma altura de três metros e de cabeça para baixo. Vários pilotos e tripulantes precisam escapar de uma só vez, enquanto membros da equipe de resgate observam, prontos para resgatar quem fique preso.

Esse exercício, como a cadeira submersa, ensina os tripulantes a escolher uma saída e depois confiar em "pontos de referência" para chegar lá - pedaços da aeronave em que podem se apoiar e usar como apoio para chegar a uma abertura.

O curso dura dois dias e busca reproduzir reações nas tripulações para que possam sobreviver a perigos que possam enfrentar.

Martin é piloto de um E/A-18G. Embora pilotos do jato não pilotem helicópteros, eles muitas vezes são os passageiros transportados dentro deles e também precisam fazer o curso. Dois jornalistas do The New York Times também precisaram concluir o curso recentemente, antes de receber permissão para serem transportados em um F/A-18 para trabalhar na cobertura da guerra no Afeganistão.

O comandante Richard V. Folga, o diretor da escola, disse que o raciocínio por trás da formação é uma simples matemática da aviação. Todos os anos, não importa quanta atenção os esquadrões prestem na manutenção e segurança, falhas em aeronaves navais levam a acidentes catastróficos. Os pilotos e suas tripulações acabam no mar.

A Marinha chega a perder de 8 a 10 aeronaves por ano, disse. Por isso, depois de um dia em sala de aula, eles seguem para a piscina para uma longa sessão prática na água, que os prepara para situações adversas.

Folga disse que sabe que alguns oficiais detestam o treinamento. "Se eu pudesse garantir que eles nunca iriam precisar deste treinamento, eu diria: 'OK, sente-se no banco do passageiro e use o seu iPhone e faça o que você quiser enquanto nós trabalhamos", disse. "Mas exercícios têm como base incidentes reais e incidentes reais muitas vezes recorrentes."

Ele acrescentou: "Ninguém planeja que esse tipo de acidente aconteça. Ninguém acorda para trabalhar um dia esperando que precisará sobreviver na água após um acidente. Mas isso acontece. E quando isso acontece, eles precisam estar prontos."

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