sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Polônia espera que o gás de xisto a liberte da dependência de empresa russa


Há uma corrida do ouro em andamento na Polônia, onde companhias internacionais de energia disputam o direito de explorar gás de xisto. O governo da Polônia vê essa extração como uma forma de se tornar independente da companhia russa Gazprom, mas alguns poloneses que moram próximo às áreas a serem exploradas estão preocupados com os riscos.

No canteiro de obras da pequena cidade polonesa de Trzebielino, no norte da Polônia, escavadeiras e motoniveladoras circulam e trabalhadores da construção civil têm dificuldades para escavar com as suas pás sob o vento gelado. No centro do terreno há um equipamento de cerca de 20 metros de altura que bombeia água para debaixo da terra. Os técnicos acreditam que o gás de xisto esteja a uma profundidade de quatro quilômetros. Quatro homens se aproximam do jornalista. "Nada de câmeras ou microfones, por favor", solicitam eles.

Mas, apesar disso, os dois norte-americanos e dois poloneses – todos eles funcionários da companhia de gás BNK Polska – dizem que não têm nada a esconder. "Nós respeitamos o meio ambiente e as leis polonesas", afirma um homem que usa óculos de sol e capuz, falando em inglês. Ele diz que é "engenheiro de petróleo", mas se recusa a fornecer o seu nome à reportagem.

A BNK Polska é uma subsidiária da companhia de energia BNK Petroleum Incorporation, com sede na Califórnia. A companhia possui seis das 110 autorizações concedidas até agora para perfurações experimentais na Polônia, o país que tem as maiores reservas de gás de xisto da Europa.

O depósito de gás natural, estimado em 5,3 trilhões de metros cúbicos, encontra-se entre camadas de um mineral conhecido como xisto argiloso. Os especialistas acreditam que, na melhor das hipóteses, apenas um quinto desse recurso poderá ser explorado, mas nem mesmo essa limitação foi incapaz de impedir uma espécie de corrida do ouro na Polônia nos últimos dois anos. Companhias internacionais como a Chevron, a ExxonMobil e a ConocoPhillips, bem como a gigante nacional do setor de energia Polish Petroleum and Gas Mining (PGNiG) e algumas companhias locais menores, estão realizando atualmente perfurações de teste na Polônia em uma "faixa de gás" que começa na região de Gdansk, ao norte, passa por Varsóvia e estende-se até à região sul do país.

Possível ruptura com a Gazprom
O governo polonês está entusiasmado com o gás de xisto porque esse produto representa um passo rumo à independência energética. O país é atualmente um dos maiores clientes da Gazprom, a gigante russa do setor de energia, tendo comprado dela 10,25 bilhões de metros cúbicos de gás natural somente no ano passado. As políticas opacas de preço praticadas pela Gazprom em relação à Polônia consistem em uma fonte constante de tensão entre os dois países. O fato de essa companhia apadrinhada pelo Kremlin ter vendido uma quantidade de gás 7% menor para a Polônia desde a última quinta-feira, em um momento em que a Europa padece com uma onda de frio recorde, também não ajudou.

Com o auxílio do know-how norte-americano, a Polônia está agora de olho não apenas na sua chance de tornar-se independente do gás russo, mas também na possibilidade de transformar-se em um exportador dessa fonte de energia. De fato, no que diz respeito ao futuro do gás na Polônia, o Partido Plataforma Cívica, do primeiro-ministro Donald Tusk, e o Partido da Lei e da Justiça, liderado por Jaroslaw Kaczynski, que geralmente defendem ideias opostas, encontraram finalmente algo quanto ao qual concordam. Piotr Wozniak, que atuou como especialista em gás natural quando o Partido da Lei e da Justiça estava no governo, e que é atualmente vice-ministro do Meio Ambiente, foi encarregado de administrar o processo de alocação de permissões para exploração do gás.

Os preços do gás deverão compensar os elevados gastos com esse método caro de extração do produto. A fim de retirar o gás da pedra, água altamente pressurizada, à qual são misturados produtos químicos e quartzo, é injetada pelo poço perfurado. Esse processo, denominado “fracking”, é aquele que as companhias do setor de energia gostariam de utilizar na Alemanha. Em depósitos de gás natural convencionais, cerca de 80% do gás pode ser extraído, mas no caso de rochas argilosas, esse número cai para apenas 10% ou 20. No decorrer do processo, a água utilizada no fracking fica poluída com substância perigosas, incluindo o benzeno, que é cancerígeno.

Temores quanto aos riscos à saúde
Relatórios de danos ambientais feitos nos Estados Unidos, país no qual a mineração do gás de xisto é praticada há mais de uma década, estão chegando ao conhecimento dos poloneses diretamente afetados pelas perfurações experimentais. Já houve alguns protestos isolados, e alguns moradores de Miszewo, a cidade situada bem ao lado do campo de perfuração, estão irritados.

Szczepan e Teresa Jaciubek estão sentados na sala de estar da sua casa de fazenda. A televisão mostra o programa de notícias TVN24, e o fazendeiro de 61 anos de idade diz que lê três jornais por dia, um dos quais ele traz, enrolado, em uma das mãos enquanto gesticula. “Dezenas de toneladas de produtos químicos estão sendo bombeados para dentro da terra!”, diz ele. Ele afirma que quem lhe disse isso foram os próprios representantes da BNK. Por causa disso, o casal teme que as suas torneiras de água passem em breve a emitir o altamente inflamável gás metano, conforme foi mostrado em uma cena memorável de “Gasland”, um documentário norte-americano de 2010 sobre a prospecção de gás natural.

Szczepan conta que vendeu dois dos três hectares de terra que atualmente pertencem à BNK por um preço normal de mercado a um intermediário que representava um especialista em energia de Lodz. Ele afirma que o homem aparentemente vendeu o terreno a um preço bem maior para a companhia de gás norte-americana.

Os Jaciubek têm a sensação de que estão sendo esmagados. Primeiro eles foram informados por autoridades locais que em meados de dezembro seria feita uma perfuração perto da cidade, e o trabalho teve início poucos dias após o aviso. Engenheiros norte-americanos teriam oferecido papais noéis de chocolate às crianças da cidade e prometido fornecer a elas aulas gratuitas de segurança referente ao tráfego de veículos, devido aos caminhões e equipamentos pesados que atualmente circulam em alta velocidade por essa região outrora tranquila.

Teresa Jaciubek diz que teme que os seus netos possam se machucar. Mas nem todos na cidade se opõem à perfuração. Zenon Drobinski, por exemplo, um dos vizinhos dos Jaciubek, apoia o projeto. “Nós precisamos avançar, e não retroceder!”, grita ele no campo aberto em que se encontra, e acrescenta: “Talvez eu possa em breve operar o meu trator com gás barato!”.

Falta de oposição organizada
Ainda não se formou na Polônia nenhuma oposição organizada ao gás de xisto. De fato, o ambientalista independente Marek Kryda observa, com desaprovação, que até mesmo membros do Partido Verde da Polônia evitam criticar o uso de carvão mineral, a partir do qual é gerada cerca de 90% da eletricidade consumida no país. Além do mais, embora ele não conte com provas para corroborar as suas alegações, Kryda afirma que muitos dos moradores afetados estão se deixando silenciar por propinas e intimidações.

Até o momento, foram poucos os casos comprovados de corrupção oficial vinculada à concessão de permissões para perfuração. Um desses casos envolvia um indivíduo que trabalhava para o Instituto Geológico Polonês, situado em Varsóvia, e o escândalo acabou resultando na suspensão da colaboração entre a instituição e as companhias petrolíferas no início deste ano.

O nervosismo no instituto é palpável. Da mesma forma que os engenheiros no campo de prospecção da BNK, o porta-voz Miroslaw Rutkowski não permite a utilização de câmeras nem de microfones durante entrevistas. O especialista em gás de xisto Pawel Poprawa mexe nervosamente as mãos enquanto fala. “Não é possível ainda afirmar se compensa extrair gás de xisto na Polônia”, afirma o geólogo, explicando que tudo depende dos preços internacionais do gás e dos custos de produção.

Como os custos do fracking são elevados, o Estado deseja fornecer incentivos às companhias de gás na forma de impostos particularmente baixos. De fato, isso deixou há muito tempo de ser uma questão de gerenciamento empresarial. Em vez disso, o processo atual diz respeito ao sonho de independência em relação à energia russa. O gás deverá começar a fluir em 2014, diz o primeiro-ministro Donald Tusk, ou um ano antes da data em que o país pretende adotar o euro.


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