sexta-feira, 26 de julho de 2013

"Não queremos lutar por lutar", diz novo líder do CNS

Ahmed Jarba 
O futuro da insurreição síria está em parte nas mãos deles. Ahmed Assi Jarba, 43, é o novo líder da Coalizão Nacional Síria (CNS), eleito no dia 6 de julho, em substituição ao xeque Moaz al-Khatib, que renunciou. O general Salim Idriss, 54, é o chefe do Exército Livre da Síria (ELS), o braço militar da rebelião.


De passagem por Paris, na quarta-feira (24), esses dois homens de confissão sunita se encontraram com o presidente francês, François Hollande, e concederam uma entrevista exclusiva ao "Le Monde".

Le Monde: Como foi seu encontro com Hollande?
Ahmed Jarba: O presidente Hollande se mostrou muito comovido pelo que está acontecendo na Síria. A França esteve entre os primeiros países a reconhecerem a CNS e ela sempre nos manifestou um grande apoio político. Em termos humanitários, Paris também fez muito. Mas no plano militar, há dificuldades que impedem a França de agir. Nós entendemos. Mas também acreditamos que, depois de dois anos de massacres e agora que o embargo da União Europeia sobre as armas foi retirado, surgiu uma oportunidade para proteger os civis sírios contra a barbárie do regime. A França tem uma responsabilidade histórica.

Le Monde: O que vocês respondem àqueles que estão preocupados com a possibilidade de as armas caírem em mãos erradas, ou seja, os grupos jihadistas, cada vez mais numerosos no local?
Jarba: Esse medo é injustificado. A cúpula do ELS elaborou planos para que tudo que lhe for entregue seja repassado a militares profissionais e unidades moderadas. Também criamos um mecanismo de rastreabilidade das armas. Os grupos jihadistas renegam nossa autoridade. Por que eu daria armas a combatentes que não reconhecem minha existência?

Le Monde: Vocês mencionaram a hipótese de impor uma zona de exclusão aérea ("no fly zone")?
Jarba: Isso entrou em nossas conversas. Mencionamos a possibilidade de adaptar zonas seguras, no norte da Síria, onde a Coalizão poderia se instalar. Os franceses pressionarão nessa direção, e em nossos encontros dos próximos dias também conversaremos nesse sentido. Esperamos que essa zona de exclusão aérea se torne uma realidade nos próximos meses. Seria uma etapa crucial para derrubar o regime de Bashar al-Assad.

Le Monde: A perspectiva de reunir uma conferência de paz, batizada de Genebra 2, com membros do regime e da oposição na mesma mesa, parece se afastar a passos largos. Vocês desistiram dela? A solução para a crise que devasta a Síria só pode ser militar?
Jarba: Nunca dissemos, nesses meses que se passaram, que somos contrários à negociação. Não queremos lutar por lutar. Somos a favor de uma solução política, pacífica, mas que vá na direção dos objetivos da revolução.

Le Monde: O que vocês acham dos grupos jihadistas, que parecem mais preocupados em impor a sharia do que instaurar um Estado de direito? Que atitude teriam em relação a eles?
Jarba: A Síria é um país de moderação. Os diferentes componentes de sua população viveram em harmonia durante milênios. Hoje, não se deve negar, estamos diante de um problema de extremismo. Suas manifestações são inaceitáveis. É uma linha vermelha. Estamos reagindo com um misto de flexibilidade e firmeza. Mas é preciso entender que se trata de um fenômeno passageiro. Quanto mais rápido o regime cair, mais rápido ele desaparecerá.

Le Monde: O uso de armas químicas seria uma linha vermelha, segundo a comunidade internacional. Esse uso foi provado. No entanto, não houve nenhuma reação…
Jarba: É fato, e lamentamos isso. Recentemente, o regime ainda recorreu a essas armas em Homs, no bairro de Khaldiya, e no subúrbio de Damasco. As provas estão disponíveis. Mas a comunidade internacional parece fazer pouco caso.

Le Monde: Os Estados Unidos afirmam que estão lhes fornecendo armas leves. É isso mesmo?
Jarba: Na verdade, não recebemos nenhuma arma dos Estados Unidos. Recebemos uma ajuda humanitária de emergência, mas até este exato momento, arma nenhuma chegou. Ontem [terça-feira, 23], o Congresso dos Estados Unidos votou a favor de um armamento de nossa rebelião. Talvez seja um passo nessa direção.

[Entrevista com o general Salim Idriss, comandante do Exército Livre da Síria, na sede do "Le Monde", dia 24 de julho]

Le Monde: Qual é a situação no campo de combate? O regime ultimamente passou a impressão de estar retomando o controle.
Salim Idriss: No plano militar, o equilíbrio das forças permanece a favor do regime, mas apesar disso, continuamos a avançar, sobretudo em Idlib (norte), no leste e em Deraa (sul). Apesar de seus bombardeios incessantes, o regime não conseguiu abalar nossa resistência. Ele ainda não controla Qaboun, por exemplo. Nosso moral continua muito bom e continuamos certos da vitória.

Jarba: A cidade antiga de Homs está cercada e vem sendo bombardeada há meses. Mas nossos combatentes se recusam a recuar. Homs é e continuará sendo a capital de nossa revolução síria.
Le Monde: Com quantos combatentes estrangeiros o regime pode contar? E do outro lado, quantos homens a rebelião consegue mobilizar?

Idriss: O regime dispõe do apoio de cerca de 20 mil combatentes estrangeiros. A maior parte, 15 mil, são milicianos do Hezbollah. Os outros são da Guarda Revolucionária iraniana, houthis (seita xiita) do Iêmen, iraquianos ou afegãos. De nosso lado, temos 80 mil homens equipados com armas leves, sendo de 50 mil a 60 mil ativos em campo.

Le Monde: Vocês têm a sensação de terem sido abandonados pela comunidade internacional?
Jarba: O que está acontecendo na Síria não pode ser aceito por ninguém que tenha fé na humanidade. Tivemos mais de 250 mil mortes, se somarmos os desaparecidos a todos os mortos que foram enterrados. No entanto, independentemente das circunstâncias, mesmo que o mundo inteiro nos abandone, atingiremos nosso objetivo que é a queda do regime.

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