quinta-feira, 6 de junho de 2013

Protestos na Turquia: "A praça Taksim é nossa"

Os protestos na Turquia reuniram pessoas de todas as classes, incluindo engenheiros, professores, trabalhadores da construção civil, esquerdistas e até alguns ex-simpatizantes do primeiro-ministro Erdogan. Eles exigem mudanças num país que está mais dividido do que nunca.

Um engenheiro, que tropeça em meio às nuvens de spray de pimenta. Um futuro médico, que traz remédios e limonada, para ajudar a atenuar os efeitos do gás lacrimogêneo. Uma professora, que filma tudo com sua câmera. Uma estudante de intercâmbio, que está lá para vivenciar a atmosfera revolucionária. Um ativista de esquerda, que está acampando há dias na praça Taksim, no coração de Istambul, defendendo-a da polícia.

Todos os tipos de pessoas estão se manifestando contra o governo do primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan. A noite de segunda-feira marcou apenas o encontro mais recente na maior cidade da Turquia, parte da onda de protestos que se espalhou por todo o país depois que um punhado de pessoas em Istambul saiu às ruas para evitar a destruição de um pequeno parque na cidade.

O protesto se transformou numa revolta. Centenas, se não milhares de pessoas, na Praça Taksim se recusaram a ir para casa e continuaram enfrentando o gás lacrimogêneo que paira pelas ruas. Embora a situação tenha se acalmado desde o fim de semana, os manifestantes permanecem atrás de suas barricadas improvisadas, feitas com barreiras da polícia e do que mais puderam encontrar.

"Vamos ficar aqui até Tayyip sair e conquistarmos nossa liberdade", diz Balkan, de 24 anos de idade. Ele parou de fazer filmes e agora se vê principalmente como parte de um movimento de resistência. Olhando para as pessoas na praça, ele diz: "são todos meus amigos".

Os manifestantes estão entusiasmados, convencidos de que eles conquistaram a primeira vitória em sua luta contra o homem mais poderoso da Turquia. Pelo menos por enquanto a polícia se retirou da praça Taksim e Erdogan foi forçado a admitir que sua resposta aos protestos não foi isenta de erros. Além disso, os protestos em Istambul foram imitados em mais de 40 outras cidades por todo o país, incluindo a capital Ancara e a metrópole costeira de Izmir. O mundo inteiro está assistindo agora os protestos na Turquia.

Perdendo o tato
O que se tem visto é uma resposta brutal da polícia às manifestações, que tem sido fortemente criticada pela União Europeia. Os Estados Unidos também falaram de um "uso excessivo da força", e a chanceler alemã Angela Merkel também expressou preocupação.

A violência tem se inflamado há dias. Em Istambul, os confrontos mais intensos se transferiram para o bairro Besiktas, enquanto em Izmir, um edifício do Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP), ao qual pertence Erdogan, foi incendiado. A ação policial em Ancara tem sido notável por sua violência. Médicos e ativistas de direitos humanos dizem que mais de 1.700 pessoas ficaram feridas nos confrontos, embora as autoridades turcas tenham confirmado apenas 170 feridos. Pelo menos duas pessoas foram mortas até agora.

Erdogan, no entanto, denunciou os manifestantes como "saqueadores" e os "vândlos", que estão sendo controlados pelo exterior. Eles o chamam simplesmente de Tayyip, muitas vezes acompanhado de uma referência pouco elogiosa à sua mãe. Após uma década com Erdogan como primeiro-ministro, muitos sentem que o conhecem. E agora querem deixar claro que não o levam a sério. Eles não o veem como um estadista de respeito mas sim como um líder furioso que perdeu o contato com seu povo. Eles o chamam de "ditador" e "fascista", e cobrem prédios com pichações contra Erdogan.

Muitos deles começaram a sonhar com uma "Primavera Turca" seguindo o modelo das revoltas da Primavera Árabe que abalaram o norte de África em 2011. "A praça pertence a nós", diz um especialista em computação que começou a participar dos protestos depois do trabalho.

Normalmente, o homem de seus 50 e poucos anos é reservado e equilibrado. Mas, na manifestação na segunda-feira à noite, ele estava tomado pela euforia da revolta.

Ainda assim, é muito cedo para falar de um movimento. Os protestos em todo o país mostram que a sociedade turca, apesar do avanço econômico e do aumento da prosperidade, tem queixas o bastante quando se trata de governo de Erdogan. A questão, porém, é por quanto tempo essas queixas continuarão motivando as pessoas a irem para as ruas.

'Não abandonamos a esperança'
Ou se os protestos mudarão alguma coisa. Eles são certamente são maiores do que o normal em Istambul, uma cidade que tem alguma forma de manifestação quase todo dia. A variedade de pessoas marchando contra Erdogan também é surpreendente – velhos e jovens, homens e mulheres, pessoas de direita e de esquerda, curdos e kemalistas. Até mesmo alguns apoiadores do AKP foram às ruas.

Mas de acordo com pesquisas recentes, se fossem realizadas eleições agora, Erdogan ainda venceria. Na última eleição, ele conseguiu uma grande maioria de mais de 50% – e até hoje ele continua sendo o político mais popular da Turquia.

Em vez disso, as manifestações podem ser um sinal de que as divisões no país estão se aprofundando. Pesquisadores começaram a alertar sobre uma ampla cisão na sociedade turca. Bekir Agirdir, chefe do grupo de pesquisa independente Konda, disse ao Wall Street Journal que a Turquia está vivenciando uma "polarização de identidades preocupante" e que "esta é uma direção perigosa".

Entre alguns dos manifestantes, entretanto, a resignação e o cansaço começaram a corroer a euforia dos últimos dias. "Tenho medo de que não vá mudar muita coisa", diz Canon E., 36, que é professor de inglês. "Mas nós não abandonamos a esperança."

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