quinta-feira, 20 de junho de 2013

Os recrutas jihadistas encalhados na prisão de Kidal

É um edifício em construção, aberto para o vento quente do Saara, por trás do qual se estende uma savana desértica. Um único espaço foi fechado por uma porta vermelha de chapa. Do lado de dentro, vivem 47 homens cujos colchões se espalham por dois cômodos que ficaram opacos. O resto se encontra a céu aberto e um amontoado de cascalho faz as vezes de pátio.

É a "grande prisão" de Kidal, a cidade do grande norte do Mali. As autoridades malinesas provavelmente gostariam de terminá-la, mas foram expulsas da cidade no início de 2012 pelos tuaregues do Movimento Nacional pela Libertação do Azawad (MNLA), nome dado a esse território pelos militantes autonomistas.

Tanto a cidade quanto a prisão são administradas unicamente pelo MNLA, uma vez que o acordo de 18 de junho com Bamaco, que prevê o retorno do Estado malinês a Kidal, ainda não foi aplicado. A Cruz Vermelha Internacional efetuou somente uma "breve visita" por lá, segundo Abi ag Ahmeida, número dois da segurança dentro da jovem administração tuaregue dirigida pelo Conselho de Transição do Estado de Azawad (CTEA)

De quatro a cinco vigias dormem do outro lado do muro em condições espartanas, mas ninguém tentou fugir. Aqui, não há tribunais nem advogados. É a polícia tuaregue, muitas vezes ex-soldados do Estado malinês, que prende, averigua e decide liberar. "Estamos tentando encontrar falhas em seus relatos enquanto conduzimos nossas próprias verificações, infiltrando falsos detentos entre eles, por exemplo; alguns negam sua participação nos combates, mas outros assumem", diz Abi ag Ahmeida.

Esses prisioneiros são os recrutas dos batalhões jihadistas combatidos pela França e seus aliados desde o dia 11 de janeiro. Eles pertenciam à Al-Qaeda no Magreb Islâmico (AQMI), ao Movimento pela Unidade e o Jihad na África Ocidental (Mujao) e ao Ansar Dine. Não há nenhum oficial superior entre eles. Embora o lugar seja precário, o visitante não sente ali nenhuma tensão e pode conversar por mais de uma hora com prisioneiros movimentando-se livremente, sob supervisão de um soldado do MNLA.

Há "dois meses e 25 dias" que Al Kheini ul Khelinad, um árabe do norte do Mali, está aqui. Ele diz ter passado quatro meses em Adrar des Ifoghas dentro da katiba (brigada) de Abdelkrim Al-Tarqgui, um dos líderes da AQMI. Preso com armas na mão na entrada da cidade de Anefis, ao sul de Kidal, ele se deslocava junto com três outros membros de seu grupo sobre jumentos, para passar despercebidos. Duas crianças de 10 anos estavam com eles. Abdelkrim dava dinheiro aos pais para que eles enviassem seus filhos à escola religiosa da katiba.

Somente alguns elementos retidos pelos serviços de inteligência francesa que vieram interrogá-los tiveram suas atividades dentro do grupo confirmadas. Al-Kheini ul Khelinad cuidava do abastecimento. "Eu administrava as questões de intendência, junto com Abdelkrim, a cada quatro ou cinco dias", ele diz. "Ele me dava de 10 a 20 milhões de francos CFA – R$ 44 mil a R$ 88 mil – para ir buscar semolina e combustível, no final eu guardava 2 milhões por viagem." De acordo com ele, boa parte da população ficava satisfeita com sua presença. "Queríamos instaurar a sharia em todo o Mali e a região, mas também fazíamos com que os mercados fossem mais bem abastecidos que os do sul", ele diz.

"Essa islamização da sociedade malinesa através da economia em zonas pobres e historicamente abandonadas explica em parte por que 80% dos líderes da AQMI ainda estão vivos e se misturam facilmente à população", segundo Bai ag Dinknane, número dois do MNLA em Kidal.

Segundo os militares franceses, Abdelkrim também manteve como refém, por algum tempo, o francês Michel Germaneau, morto em cativeiro em 2010, e ele teria negociado com os cartéis do narcotráfico a passagem para a zona sob controle da AQMI.

Sem temer os soldados do MNLA, outros prisioneiros alegam ser vítimas de injustiça. Em sua roupa verde, só se vê ele no pátio: Attya Noredine, um argelino de 27 anos, suspeito de pertencer à AQMI, foi preso em março em Kidal. Ele jura que ia trabalhar em Bamaco. Já Ali Diallou acaba de descobrir que em breve será libertado. Vindo de Bamaco, ele entrou para o Ansar Dine em Timbuktu onde cuidava de um posto policial na entrada da cidade. "Fui para lá pelo dinheiro", ele conta. Quando os franceses bombardearam Timbuktu, a partir do dia 11 de janeiro, ele se refugiou em Berre, a 60 quilômetros, junto com o grosso das tropas de Ansar Dine, entre eles seu "amigo" Abdul Djalil mais conhecido na França sob o nome de Gilles Le Guen, um francês da AQMI preso desde então e transferido para Paris. "Ele vivia em Timbuktu, nunca o vi fazendo mal a ninguém."

No canto da prisão mais castigado pelo Sol, quatro adolescentes recitam suras do Corão. Desconfiado, de turbante preto na cabeça, Abou Mohamed, 17, oriundo de um vilarejo ao norte de Gao, diz "ter aderido ao Mujao" porque ele queria "ler o Corão". Atrás dele, Adama, de 16 anos, confirma. Eles foram presos em Tinzouatine, na fronteira argelina. Ousmane, 15, de olhar fixo no chão, permanece mudo.

O chamado à prece provoca uma movimentação no pátio. Os 47 prisioneiros se alinham. Ibrahim, um bambara de 31 anos originário de Segou, conduz a oração. Alguns minutos antes, ele explicava ter entrado no Ansar Dine "pelo dinheiro e porque eu estava em busca de mim mesmo".

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