sexta-feira, 26 de abril de 2013

Região dos Bálcãs busca reafirmação e identidade dentro da Europa

Sarajevo, a capital da Bósnia-Herzegóvnina, se abriu para o turismo e em 2011 foi visitada por 231 mil pessoas

Como em qualquer lugar da Europa, a história recente dos Bálcãs ocidentais foi escrita com sangue. Desde o seu papel no estouro da Primeira Guerra Mundial, passando pela ocupação e resistência durante a Segunda Guerra Mundial e chegando até as batalhas e a barbárie que se seguiram à dissolução da Iugoslávia, as pessoas da região já sofreram o suficiente.

Na semana passada, Ivica Dacic e Hashim Thaci decidiram fazer as coisas de forma diferente. Após seis meses de negociações diretas, os primeiros-ministros da Sérvia e do Kosovo chegaram a um acordo para normalizar suas relações.

Eles estabeleceram uma série de medidas práticas que devem ajudar suas populações a eliminar o medo, aumentar a prosperidade e desempenhar um papel pleno como membros da família europeia.

Mas não devemos exagerar. Esse não é o fim da estrada. É uma bifurcação no meio do caminho – e, na semana passada, dois homens corajosos escolheram o caminho da paz.

Esse não era o resultado que muitos esperavam há seis meses, quando eu reuni Thaci e Dacic em meu escritório em Bruxelas, na Bélgica. Eles nunca tinham se encontrado.

Durante anos, meu escritório havia intermediado discussões técnicas sobre questões do dia-a-dia, como o que exatamente deveria acontecer na fronteira entre a Sérvia e o Kosovo. Essas negociações tinham chegado ao ponto em que era necessário um novo impulso político – e isso significava engajar os dois primeiros-ministros no processo.

Na tarde de 19 de outubro do ano passado, Thaci e Dacic entraram em meu escritório, localizado na sede do recém-inaugurado do Serviço Europeu para a Ação Externa. Nenhum dos dois tinha certeza de como a notícia da reunião seria recebida em seus próprios países. Quando o nosso fotógrafo tirou uma única foto dos dois juntos, eu a segurei até os dois primeiros-ministros se sentissem confortáveis com sua divulgação.

A tarefa deles era encontrar uma maneira de ajudar dezenas de milhares de sérvios kosovares que vivem no norte do Kosovo. Muito tem sido escrito sobre a história dessa disputa. A questão era como acabar com ela.

Esse primeiro encontro durou apenas uma hora. Seu objetivo não era resolver diferenças, mas descobrir se o momento era propício para a manutenção de um diálogo sustentado. Eu percebi que era. E, o mais importante: os dois primeiros-ministros também detectaram a mesma coisa.

Outras nove reuniões se seguiram. Elas foram, por vezes, longas – com encontros de até 14 horas –, muitas vezes detalhadas e, ocasionalmente, tensas. Em diferentes momentos, eu convidei os vice-primeiros-ministros e outras pessoas de ambos os lados para se juntarem a nós. Um acordo só seria alcançado caso fosse endossado por amplas coalizões, tanto na Sérvia quanto no Kosovo.

No final, ambos os lados encontraram pontos em comum em relação ao nível de autonomia que os sérvios kosovares devem desfrutar. De volta a Belgrado e Pristina, o acordo firmado por eles foi bem recebido por membros de todo o espectro político.

Ainda há muito a ser feito para que seja possível implementar o acordo de fato. No entanto, eu acho que é possível refletir sobre as quatro grandes lições que aprendemos durante os últimos seis meses.

Uma liderança corajosa é vital para que se alcancem mudanças duradouras. Em seu estado normal, a política sempre busca explorar as linhas que dividem as pessoas e incitar as diferenças. A principal demanda dos processos de paz é buscar pontos em comum e projetar um futuro compartilhado. Nos últimos seis meses, eu vi homens de Belgrado e Pristina evoluírem e passarem de políticos a pacificadores. Eles sabiam que estavam correndo riscos, mas não se intimidaram – e o crédito é todo deles.

A Europa de hoje – na verdade, grande parte do mundo atual – está desordenada. Temos múltiplas identidades que nem sempre se encaixam facilmente nas simples noções de estado-nação do século 19. Um dos grandes desafios em muitos dos conflitos atuais é reconhecer essa desordem e ajudar as pessoas de diferentes identidades a encontrarem maneiras de compartilhar o mesmo espaço dentro de um espírito de respeito mútuo. Assim, nós temos a chance de ganhar o verdadeiro prêmio: a celebração da nossa gloriosa diversidade.

A EU (União Europeia) pode fazer uma grande diferença. A UE é um grande experimento para fazer a diversidade funcionar em benefício de todos nós. Sim, ela tem suas falhas. Atualmente, a UE está enfrentando desafios econômicos difíceis. Mas, no geral, ela funciona. É por isso que os povos da Europa Oriental queriam se tornar membros da UE assim que se libertaram do domínio soviético. Agora, Sérvia e Kosovo desejam se tornar membros também. O acordo da semana passada iniciou um processo que lhes permitirá entrar para a UE no futuro.

O "hard power", ou o poder da força bruta – que é constituído da força econômica e, às vezes, da força militar –, tem seu lugar, mas o "soft power" tem um grande papel a desempenhar. A UE continua atraindo novos membros, e não apenas porque ela apoia o comércio, a criação de empregos e os investimentos, mas porque ela representa valores como a liberdade e a democracia, que inspiram as pessoas ao redor do mundo.

O poder em estado bruto convida a adoção de medidas calculistas; o "soft power" recompensa a imaginação. O que Ivica Dacic e Hashim Thaci mostraram quando vieram ao meu escritório foi que tiveram a coragem de imaginar um futuro melhor para seus povos.

Aqui, então, está a minha esperança. (E eu sublinho "esperança", pois essa ainda não é uma certeza.) Durante os últimos cem anos, os Bálcãs ocidentais têm sido conhecidos como o berço da guerra. A partir de agora, eles poderão ser conhecidos como o berço da paz.

*Catherine Ashton é a alta representante da União Europeia para relações exteriores e política de segurança.

Um comentário:

  1. a grande diferença dos Bálcãs pro resto da Europa e que essa região ainda apresenta forte resquícios da colonização mulcumana feita durante o dominio do Imperio Otomano, enquanto na penisula iberica os vestigios quase sumiram(dominada pelo Imperio Arabe entre os seculos VII a XV), nos Balcas ainda sao fortes, bosnios, kosovares, albaneses e macedonios sao mulcumanos, sofrem preconceito por terem aparencia um tanto "arabe", enfim, muito dificil os obstaculos a serem transpassados...

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