quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Por petróleo e contra o Irã, Turquia busca aumentar influência no Crescente Fértil

Primeiro-ministro turco Recep Tayyip Erdoğan (esq.) se encontra em Teerã com o presidente do iraniano Mahmoud Ahmadinejad (dir.)

O segredo mais aberto em Ancara é o de que a Turquia detesta o Irã, que ele vê como minando seus interesses na Síria e no Iraque. Os líderes turcos não reconhecerão isso publicamente, pois seu país precisa desesperadamente do petróleo e do gás natural iranianos para dar continuidade ao seu crescimento econômico fenomenal.

Mas Ancara cada vez mais considera tanto o Iraque quanto a Síria como arenas de um conflito indireto com o Irã; no primeiro, a Turquia apoia os árabes sunitas e os curdos contra o governo central em Bagdá, sob o primeiro-ministro xiita Nuri Kamal al Maliki, visto pela Turquia como um fantoche iraniano; no segundo, Ancara apoia os rebeldes contra o regime Assad apoiado por Teerã.

A Turquia respondeu ao desafio do Irã desenvolvendo influência no norte tanto do Iraque quanto da Síria. Isso sinaliza a ascensão de uma política turca ainda não declarada no Oriente Médio: antecipando a descentralização da Síria pós-Assad e esperando tirar proveito do norte curdo autônomo do Iraque, a Turquia está criando um "cordão sanitário" por todo o norte do Crescente Fértil, construindo influência entre a população curda assim como em grandes centros comerciais como Aleppo e Mosul.

Quando a Turquia decidiu estreitar seus laços com seus vizinhos muçulmanos há cerca de uma década, ela esperava que essas relações ajudariam a reforçar a estabilidade no Iraque e melhorar os laços políticos com a Síria e o Irã.

Mas as rebeliões árabes tornaram esses planos obsoletos. Inicialmente, Ancara deu ao regime Assad o conselho de amigo para que parasse de matar civis. Mas o regime de Damasco se recusou e a posição da Turquia mudou em agosto de 2011: Ancara passou de uma vizinha amistosa de Assad a sua principal adversária. A Turquia começou a fornecer refúgio para a oposição síria e, segundo reportagens da mídia, até mesmo a armar os rebeldes.

Essa política colocou Ancara e Teerã, o benfeitor de Assad, como principais rivais na Síria. Isso, por sua vez, exacerbou a disputa no Iraque, onde Ancara apoiou o bloco secular Iraqiya de Ayad Allawi nas eleições de 2010, envenenando as relações com Maliki.

Após a reeleição de Maliki, Ancara buscou laços mais estreitos com os árabes sunitas e curdos no norte do Iraque. O volume de comércio da Turquia com o norte do Iraque subiu para US$ 8 bilhões por ano, em comparação a apenas US$ 2 bilhões com o sul do país, e Ancara está buscando acordos lucrativos de petróleo com os curdos iraquianos.

Resumindo, apesar de todos os propósitos práticos, o norte do Iraque se tornou parte da esfera de influência turca. Isso é especialmente surpreendente, considerando que há apenas poucos anos a hostilidade turca em relação aos líderes curdos iraquianos parecia prestes a resultar em uma invasão turca na região.

Hoje, entretanto, a Turkish Airlines oferece voos diários para Sulaymaniyah e Erbil, dentro do Governo Regional do Curdistão no norte do Iraque, e os curdos iraquianos passam férias em Antalya, um resort turco no Mediterrâneo.

Mosul, uma província de maioria sunita no norte do Iraque, também está se inclinando para Ancara. A Turquia atualmente fornece refúgio para Tariq al Hashimi, o vice-presidente sunita do Iraque, cujo mandado de prisão se tornou motivo de mobilização para muitos sunitas. Ao mesmo tempo, os laços históricos entre Mosul e a Turquia, que datam do Império Otomano, estão sendo ressuscitados: quando visitei Gaziantep, uma cidade no sul da Turquia, meu hotel estava cheio de empresários árabes de Mosul.

Antes do início do levante sírio, um desdobramento semelhante estava ocorrendo em Aleppo, outra cidade do Crescente Fértil que desfrutava de laços comerciais profundos com a Turquia durante o Império Otomano.

Localizada a apenas 42 quilômetros da fronteira, Aleppo se tornou um centro de empresas turcas no norte da Síria, e sem dúvida o forte apoio fornecido pelos turcos aos rebeldes no norte da Síria aumentará a influência da Turquia na cidade após o fim do regime Assad (e não é por acaso que as maiores áreas contíguas controladas pelos rebeldes na Síria ficam em torno de Aleppo).

A parte que faltava para a influência potencial da Turquia no norte do Crescente Fértil era os curdos sírios –até o anúncio pela Turquia de negociações de paz com o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK). Esse grupo, que está em guerra com a Turquia há mais de três décadas, também é conhecido como sendo o movimento mais bem organizado entre os curdos sírios.

Ancara espera que as negociações de paz com o PKK ajudem a sanar a animosidade com os curdos sírios. De fato, a Turquia alterou sua política para o Oriente Médio: ela agora vê os curdos como a base de sua zona de influência por todo o norte do Crescente Fértil.

Mas nem tudo é um mar de rosas para a Turquia. As negociações de paz com o PKK podem fracassar, levando os rejeicionistas do PKK para os braços do Irã ou até mesmo de Bagdá. Também há a ameaça emergente de permitir a presença de radicais no norte da Síria. Trata-se de um jogo perigoso, pois assim que o regime Assad cair, a Turquia poderia se ver com um problema de jihadistas em sua recém adquirida esfera de influência.

*Soner Cagaptay é diretor do Programa de Pesquisa Turca do Instituto Washington para Políticas do Oriente Próximo e autor de "Turkey Rising: 21st Century's First Muslim Power".

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