segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

O fanatismo religioso atinge alguns militares de alta patente nos Estados Unidos

General William G. Boykin

A carreira política de Bob Kerrey cobriu quatro anos como governador de Nebraska e outros 12 como senador federal por aquele Estado, durante os quais ele disputou seriamente a indicação do Partido Democrata à Presidência. Em todo esse tempo, até onde ele se recorda, ele nunca proferiu o que se tornou um posfácio rotineiro aos comentários políticos: "Deus abençoe a América".

Isso foi deliberado.  "Parecia um pouco presunçoso, quando se tem a massa de terra e o talento que temos, pedir por mais", ele me disse recentemente.

Mas havia um motivo adicional para ele não mencionar Deus, tão comumente louvado nos corredores do poder político, um elemento tão predominante no discurso público.

"Eu acho que é preciso ter muito, muito cuidado em manter religião e política separadas", disse Kerrey.

Nós americanos não somos nem um pouco cuidadosos. Em um país que supostamente traça uma linha entre Igreja e Estado, nós permitimos à primeira se intrometer flagrantemente no segundo. A fé religiosa molda o debate das políticas. Ela alimenta as alegações de excepcionalismo americano.

E enche arenas nas quais seu lugar deveria ser cuidadosamente dosado. Um exemplo recente disso provocou minha conversa com Kerrey. Há algumas semanas, um cadete do quarto ano de West Point fez suas malas e partiu, faltando menos de seis meses para se formar, em protesto pelo que retratou como bullying, uma religiosidade discriminatória na academia militar, que é mantida por dinheiro público.

O cadete, Blake Page, detalhou sua queixa em um artigo para "The Huffington Post", acusando oficiais na academia de "proselitismo inconstitucional", especialmente do tipo cristão evangélico.

Por telefone no domingo, ele me explicou que alguns deles pediam a presença em eventos religiosos de forma que poderia fazer o cadete se preocupar com as consequências sociais e profissionais de não ir. Um desses eventos foi um café da manhã de oração neste ano, no qual discursaria um general reformado, William G. Boykin. Boykin é um cristão recém-convertido, e antigos comentários dele retratando a guerra ao terror em termos sagrados e bíblicos foram tão extremos que ele foi repreendido em 2003 pelo presidente George W. Bush. Na verdade, seu discurso em West Point enfrentou um protesto tão vigoroso que acabou sendo cancelado.

Page disse que, em outras ocasiões, eventos religiosos foram promovidos por superiores com o tipo de e-mail em massa raramente usado para encontros seculares.

"Era sempre cristão, cristão, cristão", disse Page, que é ateísta.

Mikey Weinstein, que se formou pela Academia da Força Aérea e que preside um grupo de defesa chamado Fundação pela Liberdade Religiosa Militar, me disse que mais de 30 mil membros das forças armadas dos Estados Unidos estiveram em contato com sua organização por preocupação com o fanatismo em suas fileiras.

Mais de 150 deles, ele disse, trabalham ou estudam em West Point. Vários cadetes me disseram em entrevistas por telefone que não fiéis na academia podem de fato se sentir desconfortáveis, e que bênçãos em eventos supostamente não religiosos se referem a "Deus, Nosso Pai" de um modo que certamente não respeita todas as fés.

 Dificilmente. Nós temos Deus em nossos dólares, Deus em nosso juramento de fidelidade, Deus em nosso Congresso. No ano passado, a Câmara arrumou tempo para votar, 396 a 9, a favor de uma resolução reafirmando "Em Deus confiamos" como nosso lema nacional. Algo extremamente desnecessário, a menos que eu tenha perdido alguma iniciativa insurrecionista visando mudar o lema para "Anime-se, Belzebu" ou "Renda-se, Dorothy".

Nós temos Deus em nossas escolas públicas, algumas das quais se agarram ao criacionismo, e tivemos grandes candidatos presidenciais –Rick Perry, Michele Bachmann, Rick Santorum – que usam Deus de modo geral e o cristianismo em particular como base de suas campanhas. A ausência inicial de Deus na plataforma do Partido Democrata na metade do ano provocou mais ultraje entre os americanos do que o massacre na Síria jamais provocará.

Os desejos de Deus são citados nos esforços para negar aborto a mulheres estupradas e casamentos civis para casais de mesmo sexo. Em nosso país, Deus não apenas tem um lugar à mesa. Ele ou Ela é o anfitrião do jantar carregado de oração.

E há muito pouco reconhecimento de que Deus não é apenas um motor potente de altruísmo, misericórdia e consolo, mas também, em alguns casos, um instrumento divisor e repressivo; que religiosidade não é pré-requisito para patriotismo; e que alguém como Page merece tanto respeito quanto um crente.

Kerrey rotula a si mesmo como agnóstico, mas disse que um político ativo poderia escapar impune com isso apenas se ele ou ela não "se envolvesse em uma conversa sobre o risco da religião" ou anunciasse alguma dúvida ou inquietude espiritual.

"Se você falar abertamente sobre suas dúvidas", ele disse, "você pode se meter em apuros".

Para mim, isso não soa nem um pouco como liberdade religiosa.

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