segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Com a morte de embaixador dos EUA, diplomatas "engajados" se veem de mãos atadas

Corpo do embaixador J. Christopher Stevens é carregado por líbios após o mesmo ser agredido até a morte por extremistas

Num texto inteligente e desanimador na The New York Times Magazine do mês passado, Robert Worth investigou a frustração dos diplomatas americanos que se comprometeram a engajar o mundo – e até sonhavam em mudar o mundo – e agora se encontram sobrecarregados com as garantias e protocolos de uma Washington avessa aos riscos. É difícil mudar o mundo quando você mora numa fortaleza e viaja numa carreata blindada.

O artigo foi incentivado, é claro, pela a morte de J. Christopher Stevens, o embaixador morto em num ataque jihadista em 11 de setembro na missão americana em Benghazi, na Líbia. Sua morte, escreveu Worth, "desencadeou uma tempestade política que irá provavelmente amarrar as mãos dos diplomatas norte-americanos no mundo todo por algum tempo. Congressistas e especialistas de Washington acusaram o governo de esconder os perigos que os norte-americanos enfrentam no exterior e de falhar com Stevens, proporcionando segurança inadequada. Ameaças foram ignoradas, disseram os críticos, aparentemente ignorando que um ruído de fundo de ameaças é algo constante nas embaixadas por todo o grande Oriente Médio.

"A morte de um embaixador não seria vista como o preço ocasional de uma profissão nobre porém mas arriscada; alguém precisava ser culpado." Essa frase – "o preço ocasional de uma profissão nobre porém arriscada" – foi bastante relevante. É um cálculo conhecido da tribo de correspondentes estrangeiros que trabalham, assim como Bobby Worth, em lugares que podem explodir bem na sua frente. Se os diplomatas estão se escondendo atrás de muros e escoltas armadas, e se isso está nos custando uma compreensão útil do mundo, será que o mesmo não está acontecendo com aqueles que cobrem as notícias, e com que consequências?

Como o diplomata verdadeiramente comprometido, o correspondente estrangeiro verdadeiramente comprometido é um tipo de espécie em extinção. As organizações de notícias começaram a sua retirada do mundo há muito tempo, impulsionadas pela economia e por uma crença equivocada de que os norte-americanos não se importam muito com a notícias internacionais. A American Journalism Review, que começou a traçar o declínio da reportagem internacional em 1998 (o primeiro artigo foi intitulado "Adeus, mundo"), informou há dois anos que 18 jornais norte-americanos e duas redes inteiras de jornais tinham fechado todas as suas sucursais no exterior. Outros meios de comunicação, incluindo a maioria das redes de TV, reduziram ou abandonaram as sucursais em tempo integral em troca de âncoras ou repórteres que chegam de paraquedas nos lugares quando há uma crise. Eles oferecem surtos de cobertura quando uma Primavera Árabe irrompe ou o Hamas dispara foguetes contra Israel, mas bem menos do que a atenção contínua que nos muniria para ver as crises chegarem e para compreendê-las quando irrompem.

O "The New York Times" e algumas poucas organizações de notícias – "NPR", da "BBC", "The Wall Street Journal", "CNN" – contrariaram esta tendência. Não se trata tanto de um espírito altruísta sobre a consciência do que a nossa identidade (a nossa marca, para usar esse termo detestável) promete ao mundo. E, não por acaso, o nosso público que mais cresce é o global.

Mas o Times não é imune aos perigos que fizeram muitos diplomatas optarem pela seguraça. Minhas memórias mais indeléveis dos oito anos que trabalhei como editor executivo são telefonemas para os pais e cônjuges para dizer que um correspondente havia caído nas mãos erradas, e lidar com a evacuação de um fotógrafo mutilado em campo, e fazer vigília ao lado das famílias dos funcionários do Times mortos em Cabul e Bagdá. No 15 º andar do novo edifício do "The New York Times", as salas de reuniões foram batizadas com os nomes de jornalistas que morreram perseguindo a notícia. Estamos ficando sem salas. O "preço ocasional de uma profissão nobre porém de risco" é um consolo pequeno.

Anthony Shadid era o nosso Chris Stevens: um correspondente apaixonado, fluente na língua, cultura e história, um ouvinte voraz, um belo escritor. Cuidadoso, mas impaciente para ver por si mesmo. A morte de Anthony no início deste ano – depois de um grave ataque de asma durante uma viagem clandestina para uma reportagem na Síria – foi um horror imprevisível. Mas logo depois do sequestro de quatro jornalistas do Times na Líbia e da provação de sete meses de David Rohde no cativeiro do Taleban e outros incidentes, o jornal acabou aumentou sua segurança já rigorosa, levando alguns correspondentes a temer que mais uma camada de precaução signifique estar a mais um passo de distância da verdade. Isso não parece ter acontecido ainda de forma significativa, como os leitores podem ver na cobertura recente de lugares como Gaza e Congo, mas os correspondentes – eu chequei com meia dúzia deles – estão alertas.

"Tudo é uma tentativa de equilíbrio", disse-me Alissa Rubin, que viaja muito em sua cobertura do Afeganistão, por um e-mail. "Eu sei que o jornal ficou muito mais cuidadoso e isso é uma coisa boa – mas só se não for longe demais."

Em Cabul, ela disse, existem grandes organizações de notícias simplesmente não deixam os repórteres se aventurarem fora da capital e outros que assumem "riscos loucos e estúpidos". O Times há muito emprega especialistas de segurança em lugares perigosos, cuja tarefa é encontrar o equilíbrio entre a contar a história e voltar seguro para casa. Viajar com Alissa pelo interior devastado pela guerra é apreciar plenamente o significado da palavra "meticuloso". As saídas de reportagem são planejadas, mapeadas e cronometradas em extremo detalhe, e todos estão atentos a potenciais sinais de perigo.

No final, você precisa confiar nos correspondentes treinados e experientes para julgar quando o risco é muito. E isso me leva ao ponto principal. Na minha visão, a maior questão para o nosso trabalho não é se às vezes erramos para o lado da cautela, mas se estamos contratando, desenvolvendo e enviando uma nova geração de correspondentes treinados e experientes para fazer esse julgamento. Este também acaba sendo o melhor investimento em segurança.

Diplomatas e jornalistas servem patrões diferentes, mas ambos precisam de proximidade. Sim, o "jornalismo cidadão" tem sido um trunfo. Vídeos do YouTube do levante no Irã em 2009 mantiveram a história viva depois que os repórteres estrangeiros foram expulsos, e os tweets da praça Tahrir forneceram uma orientação em tempo real para a Primavera Árabe. Mas os tweets não são nenhum substituto para a presença no local.

É por isso que Anthony foi para a Síria, e por isso que alguns dos meus colegas temem que, em resposta aos perigos muito reais e cada vez mais imprevisíveis daquele lugar, possamos perder uma dimensão em nossas reportagens. Ainda temos correspondentes no local, e alguns como C.J. Chivers produziram matérias esclarecedoras baseadas em incursões planejadas pela Síria. Mas as agências de notícias britânicas, europeias e árabes estão lá em tempo integral – talvez à toa, mas é possível que estejamos perdendo uma camada de uma história imensamente complicada ao não estarmos lá.

O preço que pagamos por não estar onde a notícia acontece pode ser reconhecido não só num jornalismo de menor qualidade, mas também na política de menor qualidade. Porque, não se enganem, parte do que os governos chamam de informação de "inteligência" não passa de uma leitura atenta do noticiário.

É um verdadeiro escândalo o fato de o governo Obama ter descrito inicialmente o ataque que matou Chris Stevens não como uma conspiração terrorista, mas como um protesto malfadado. Como a "comunidade de inteligência" pode ter cometido um erro tão grave? Como a embaixadora para a ONU Susan Rice pode ter cometido um erro tão grave? Bem, voltem atrás e leiam as primeiras notícias online depois do ataque de Benghazi.

"The Wall Street Journal": Stevens foi morto "em meio a protestos por causa de um filme de um produtor dos EUA que zomba e insulta o profeta Maomé."

Associated Press: "Manifestantes na Líbia incendiaram o consulado dos EUA na cidade de Benghazi, matando o embaixador dos EUA."

O Washington Post: "Em Cairo e Benghazi, manifestantes disseram que protestavam contra um filme lançado pelos EUA."

CNN: "O consulado de Benghazi foi uma das várias missões diplomáticas norte-americanas que enfrentaram protestos."

O Los Angeles Times: "Multidão enfurecida atacou postos diplomáticos dos EUA no Egito e na Líbia depois que um vídeo apareceu na Internet."

The New York Times: "Manifestantes enfurecidos com um vídeo amador feito nos Estados Unidos denunciando o Islã atacara."

Não é irrelevante o fato de que todas as notícias online que eu citei haviam sido produzidas num lugar diferente de Benghazi – Cairo, Washington, Nova York. Nos ciclos de notícias seguintes, algumas matérias excelentes de jornalistas no local corrigiram a informação: não houve manifestantes na rua, mas os autores do ataque estavam, segundo seu próprio relato, enfurecidos com as notícias do vídeo ofensivo. A história havia sido sequestrada pelos dois lados. Mas suspeito fortemente que um dos motivos pelos quais Susan Rice se enganou no início foi que a maioria da imprensa não estava lá.

Um comentário:

  1. Quem tem como DIPLOMATAS: Wolfowitz, Cheney, Rumsfeld, Albright, Condolezza, Hilária… eu podia nomear mais uma meia dúzia de outros colaboradores. Reclamar o q?! Imagina se esses trogloditas fossem nomeados por um governo do PT? Portanto como a diplomacia dos EUA sempre foi na base do canhão, ñ precisa de jornalistas e diplomatas pq lá são considerados desprezíveis; o q importa mesmo se estão matando muitos/roubando/saqueando/ ... e ganhando a guerra. O resto q se exploda!

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