quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Taleban estuda abrir escritório de representação no Qatar, em troca de prisioneiros


O principal movimento rebelde afegão dá sinal verde para a abertura de um escritório no Qatar

Sinal de enfraquecimento para alguns e de fortalecimento para outros, os talebans acabam de anunciar mudanças de estratégia que repercutem a retirada anunciada das tropas da Otan até o final de 2014. Na terça-feira (3), a direção do principal movimento rebelde afegão se pronunciou a favor da abertura de um escritório de representação taleban no Qatar. Os Estados Unidos, a Alemanha e o Qatar conseguiram, no dia 27 de dezembro, o consentimento do presidente afegão, Hamid Karzai, que até então era contrário a isso, dando como pretexto a soberania de seu país.

Só faltava a declaração oficial dos talebans, que na terça-feira se manifestaram através de um de seus canais habituais. “Agora que nossa presença no interior do país está mais forte do que nunca”, afirma o emirado islâmico do Afeganistão, em seu comunicado, “temos condições de abrir um escritório político fora do país para conduzir negociações”.

Os talebans pedem, “em troca”, que seus prisioneiros sejam libertados do centro de detenção americano de Guantánamo, em Cuba. Por fim, eles negam qualquer diálogo entre os Estados Unidos e emissários talebans mencionados pela mídia ocidental.

Na véspera desse anúncio, no dia 2 de janeiro, em Cabul, o Alto Conselho de Paz (ACP), encarregado pelo presidente Karzai de conduzir o processo de reconciliação afegã, declarou que a abertura desse escritório em Doha tinha uma consequência imediata. “Se ao mesmo tempo os ataques talebans continuarem contra o governo afegão ou as tropas da Otan, isso significaria”, segundo o responsável pelas relações externas do ACP, Ismaiel Qasemyar, “que a comunidade internacional está dando seu apoio aos inimigos do Afeganistão.”

Victoria Nuland, porta-voz do departamento de Estado americano, explicou, na terça-feira, que “a vontade dos Estados Unidos de participar das negociações de paz não mudará em nada sua estratégia militar local, os soldados americanos continuarão a combater os inimigos do Afeganistão”.

Já as autoridades do Qatar garantiram ao ACP que assumiriam todos os custos inerentes à criação desse escritório taleban, inclusive o apoio financeiro para as famílias dos representantes insurgentes e seus deslocamentos.

Apesar dessas reservas, o processo das negociações para encontrar uma saída política para a crise afegã parece ter retomado vigor. Elas haviam sido suspensas em sua maior parte após o assassinato, no dia 20 de setembro, em Cabul, de Burhanuddin Rabbani, chefe do ACP e ex-presidente afegão (1992-1996), por um falso emissário taleban.

Na terça-feira, o governo afegão anunciou ter encontrado, no domingo, em Cabul, na presença de diplomatas americanos, uma delegação do Hezb-e-islami, o segundo movimento insurgente afegão, para falar sobre paz. Esse movimento é dirigido por Gulbuddin Hekmatyar, ex-comandante mujahidin próximo dos paquistaneses, que foi primeiro-ministro no período pós-soviético. Vários antigos membros do Hezb-e-islami fazem parte hoje no governo de Karzai.

A vontade de negociar, demonstrada pelos talebans ao se instalarem no Qatar, se manifesta agora que os principais grupos insurgentes da região afegã-paquistanesa realizaram uma reorganização de suas tropas e uma revisão de sua estratégia. Uma nova estrutura, a shura (assembleia) Murakbah, acaba de ser criada para reunir todos os rebeldes dessa região. Ela surgiu ao final de uma série de conselhos tradicionais, entre meados de novembro e de dezembro, os quatro grandes grupos insurgentes: o grupo Haqqani, o movimento dos talebans do Paquistão (TTP), os fiéis de Hafiz Gul Bahadar, no Waziristão do Norte, e os do mulá Nazir, no Waziristão do Sul.

Essas conversas foram conduzidas na presença de representantes do mulá Omar, líder dos talebans afegãos, refugiado em Quetta (Paquistão). Segundo os serviços de inteligência ocidentais, dois membros da Al-Qaeda, Abu Yahya Al-Libi e Abdur Rehman Al-Saudi, teriam sido associados às negociações.

A existência da shura Murakbah foi anunciada, segundo as autoridades paquistanesas, por panfletos distribuídos no Waziristão do Norte. Esses documentos listam os principais objetivos dessa nova aliança: o fim dos ataques contra as forças paquistanesas (certos membros do TTP negociam uma trégua com Islamabad), a concentração dos ataques somente contra os Estados Unidos e o fim dos sequestros e dos sórdidos assassinatos contra civis inocentes.

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