quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Crimes xenofóbicos deixam alemães chocados

Chanceler alemã, Angela Merkel, declarou que os crimes xenofóbicos são "uma desgraça para a Alemanha"
Os alemães ficaram chocados quando souberam nos últimos dias que havia em meio à sua sociedade uma célula terrorista de extrema direita. Analistas da imprensa dizem que as autoridades se preocuparam durante muito tempo com a violência de radicais muçulmanos e de extremistas de esquerda, de forma que passaram a ter uma tendência a minimizar a gravidade dos ataques terroristas da extrema direita.

O fato de as autoridades alemãs da área de segurança não terem sido capazes de desvendar uma série de assassinatos de natureza racista cometidos por um grupo neonazista desde 2000 fez com que irrompessem acusações de que elas subestimaram a ameaça representada pela extrema direita e se preocuparam excessivamente em combater o extremismo muçulmano e de esquerda.

Na última segunda-feira (14), a chanceler alemã, Angela Merkel, declarou que esse caso se constitui em "uma desgraça para a Alemanha". E ela não parece ser a única a avaliar o caso dessa forma. Vários analistas, parlamentares e autoridades governamentais exigiram uma investigação urgente no sentido de determinar como foi que um trio de neonazistas do leste da Alemanha, possivelmente apoiados por cúmplices, conseguiu passar tanto tempo sem ser detectado.

Os analistas da mídia na Alemanha dizem que o caso representa um enorme embaraço para a polícia, para os serviços de inteligência interna e para os promotores federais. Os ataques racistas contra imigrantes e os bens destes, um fato corriqueiro na parte leste, e outrora comunista, do país desde que a unificação da Alemanha passou a gerar problemas e revoltas sociais, geralmente não são considerados casos sérios, mas sim como acidentes isolados cometidos por indivíduos violentos e antissociais.

Agora, porém, evidências descobertas por acaso revelaram a existência de uma rede bem organizada e fortemente armada de assassinos, especialistas em artefatos explosivos e assaltantes – e desmoralizaram as tentativas de minimizar a gravidade da violência praticada pela extrema direita, afirmaram editoriais de jornais alemães.

O editorial do jornal de centro-esquerda "Süddeutsche Zeitung", afirmou:
"O fato é incompreensível e profundamente perturbador: durante anos, uma quadrilha terrorista e racista foi capaz de atuar pela Alemanha e de executar imigrantes. Os bandidos puderam planejar ataques e montar e detonar bombas. Eles só puderam fazer isso porque a polícia, as autoridades da área de inteligência e os promotores federais basicamente descartaram motivações racistas. Os crimes não foram considerados atos terroristas. As autoridades disseram que eles se constituíam em casos isolados que não tinham conexão entre si e e que estavam destituídos de qualquer motivação política."

"Essa avaliação equivocada faz com que nos lembremos das décadas de oitenta e noventa, quando abrigos para indivíduos que buscavam asilos político na Alemanha foram incendiados. A princípio, muitos dos investigadores declararam que aqueles incêndios haviam sido provocados por 'um curto circuito' ou 'um cigarro', ou disseram que os imigrantes estavam 'simplesmente se matando entre si'".

"A gravidade dos crimes xenofóbicos foi com demasiada frequência e durante muito tempo minimizada. Tais crimes foram descritos pelas autoridades como 'incidentes' e 'brigas'. Talvez isso deva ser encarado como o triste prelúdio de uma história mais séria, no que se refere a explicar como foi possível que esse terrorismo nazista não fosse detectado – e na verdade ele não teria sido detectado se dois perpetradores não tivessem se matado".

"Tal fato teria sido possível na era da Facção do Exército Vermelho? (nota do editor: esse grupo terrorista de esquerda engajou-se em uma campanha de assassinatos, atentados a bomba e sequestros nas décadas de setenta e oitenta). Naquela época, cartazes mostrando indivíduos procurados podiam ser vistos afixados às paredes de todas as agências de correios. E será que fabricantes de bombas muçulmanos teriam conseguido agir por tanto tempo na Alemanha sem serem detectados? Existe uma indiferença estranhamente fleumática quanto a isso. Tal indiferença pode ocultar um escândalo envolvendo as autoridades de inteligência interna da Alemanha – uma terrível falta de profissionalismo vinculada àquela atitude irresponsável expressa na frase: 'Bem, os extremistas de extrema direita não são terrorista de verdade, não é mesmo?'".

"Durante décadas, os radicais de extrema esquerda que atuavam na Alemanha foram considerados elementos inteligentes e perigosos, enquanto que os extremista de direita eram tidos como estúpidos e, consequentemente, inofensivos. Os neonazistas eram e ainda são frequentemente desprezados como sendo idiotas; e quando ateavam fogo a casas de estrangeiros ou matavam pessoas a chutes, eles eram tidos como perpetradores individuais que agiam isoladamente. Mas um crime terrorista continua sendo um crime terrorista mesmo se as agências de notícia não recebem no dia seguinte uma carta de tom pretensioso e estridente de um grupo que assume a autoria da ação criminosa".

"Antes de banir o Partido Nacional Democrata Alemão (em alemão, Nationaldemokratische Partei Deutschlands, ou NPD), seria preciso banir os informantes das autoridades policiais e de inteligência que atuam dentro dele. Mas primeiro o Estado precisa deixar de encarar os extremistas de esquerda e os radicais muçulmanos como mais perigosos do que os extremistas de direita. Ao agir dessa maneira, o Estado está sendo irresponsavelmente estúpido".

O jornal conservador “Die Welt” declarou no seu editorial:
"Se o que se sabe até o momento for realmente verdade, o escândalo reside no fato de as autoridades investigativas (e a população) não terem detectado o padrão criminoso ou talvez até mesmo de não terem desejado detectá-lo. Nove crimes notavelmente semelhantes foram considerados 'brigas locais'. Agora é necessário que seja conduzida uma investigação abrangente com muita determinação para esclarecer tudo isso".

"É preciso investigar se esse é um fenômeno exclusivamente do leste da Alemanha ou se tem havido uma certa leniência institucional em relação aos grupos de extrema direita. A reputação do país reunificado, das suas instituições e da sua população em geral está em jogo".

O diário de esquerda "Berliner Zeitung" opinou:
"As reações reflexas usuais como pedir que o NPD seja considerado ilegal não ajudam muito. Tudo até o momento indica que os perpetradores se distanciaram das regras não escritas dos grupos de extrema direita. Eles parecem ter contado com a ajuda de apenas uns poucos apoiadores. O trio se inseriu propositalmente em uma comunidade do tipo 'Bonny e Clyde' na qual a morte deles não era mais vista como uma ameaça. É possível deduzir que os meios convencionais de prevenção da violência não os teriam afetado. Agora a prioridade tem que ser descobrir o que a polícia e a agência de inteligência interna sabiam e quando elas ficaram sabendo".

O conservador "Frankfurter Allgemeine" se manifestou da seguinte forma:
"As questões mais importantes em relação a este caso precisam se concentrar no papel da agência de inteligência interna, da polícia e dos promotores federais. Existiam vínculos ocultos com clubes e gangues neonazistas e os "Kameradschaften" (nota do editor: grupos alemães de extrema direita) na Turíngia, na Saxônia e em outros Estados, vínculos este que podem ter sido considerados mais importantes do que o desvendamento de crimes? Os Estados alemães – e o trio atuou em praticamente todos os Estados alemães durante mais de dez anos – contavam com um sistema eficiente de troca de informações? Não foi um erro crítico considerar a violência extremista de direita como um fenômeno puramente local, e, na pior das hipóteses, regional, e como um mero contraponto provincial e idiota ao abrangente terrorismo muçulmano?"

E, finalmente, o "Bild", opinou:
"Os covardes criminosos e as suas ideias neonazistas eram conhecidas pelas autoridades em um contexto diferente. Apesar de todos os informantes disponíveis, a ação desses elementos não foi coibida. Será que os agentes de inteligência interna e a polícia fazem vistas grossas para os perigos da atuação da extrema direita na Alemanha? Essa pergunta precisa ser respondida muito rapidamente. A credibilidade da polícia e da agência de inteligência interna está em jogo".

Nenhum comentário:

Postar um comentário