Cerca de cinquenta traficantes foram massacrados no leste do país
“Não há paramilitares no México”, vem repetindo Alejandra Sota, porta-voz da presidência mexicana, desde que um misterioso grupo reivindicou, no dia 24 de setembro, pela internet, o massacre de 49 membros de um cartel do narcotráfico no Estado de Veracruz (leste). As intervenções de especialistas militares, agindo à margem da lei contra o crime organizado, têm suscitado polêmica em um país onde o governo não consegue dar um fim à violência associada ao narcotráfico.
“Estamos lutando em pé de igualdade para erradicar até a raiz o cartel de Los Zetas”, declararam, em um vídeo postado no YouTube, cinco homens encapuzados que se autodenominam os Mata-Zetas. Estes últimos apresentaram suas desculpas “por terem ofendido a sociedade”, em referência aos 35 cadáveres abandonados, no dia 20 de setembro, nas ruas de Boca del Río e de Veracruz, e de outros 14 corpos descobertos dois dias depois em cidades vizinhas. “Nossa intenção era informar ao povo que essas pragas da sociedade não são invencíveis”, explica um dos homens de preto, ressaltando seu respeito pelas autoridades locais e federais.
Desde então, a Justiça abriu um inquérito sobre esses Mata-Zetas, que o governo associa a grupos criminosos que disputam o território. Mas Edgardo Buscaglia, especialista em crime organizado do Instituto Tecnológico Autônomo do México (ITAM), não compartilha dessa opinião: “O Estado nega a existência desses paramilitares por não quererem reconhecer sua perda do monopólio das forças armadas e o fracasso em seu papel de proteger os cidadãos”. Segundo ele, 167 grupos, dotados de uma estrutura militar, operam ilegalmente às vezes com o apoio das autoridades locais.
Publicado no dia 1º de outubro, um relatório do Instituto de Estudos Estratégicos da Escola de Guerra do Exército dos EUA garante que esses grupos paramilitares representam “a terceira geração do crime” organizado. Essa “multi-narco-insurreição” descrita no relatório não é reconhecida pelo Departamento de Estado americano.
“A situação mexicana é complexa, com diferentes tipos de paramilitares”, explica Buscaglia. “Esses ex-policiais e soldados mexicanos, americanos ou israelenses, são recrutados ou por um cartel para exterminar seus concorrentes, ou por empresários para proteger seu patrimônio e sua vida”.
Os membros da gangue de Los Zetas ilustram o fenômeno: esses desertores das forças especiais do exército mexicano, que nos anos 1990 passaram a servir Osiel Cárdenas, chefe do cartel do Golfo, mudaram de lado há três anos, passando a enfrentar seu antigo empregador. “Esses ex-paramilitares, pagos por um chefão dos narcóticos, se tornaram criminosos autônomos”, afirma Buscaglia.
Dirigentes políticos locais também apelam para esse tipo de mercenários para restabelecer a ordem dentro de sua cidade ou região. Em 2009, Mauricio Fernández Garza, prefeito de San Pedro Garza García, no Estado de Nuevo León (nordeste), admitiu ter recrutado um comando, chamado Grupo Duro, para proteger seus ricos cidadãos. O exército mexicano prendeu seus membros no ano seguinte.
No dia 20 de setembro, as declarações do governador do Estado de Veracruz, Javier Duarte de Ochoa, após a descoberta de 35 cadáveres em via pública, também despertaram suspeita: “A mensagem é muito clara: em Veracruz, não há lugar para a delinquência”, ele postou em seu perfil do Twitter.
Para Oscar de Los Reyes, cientista político do Instituto Tecnológico de Monterrey, “a existência desses grupos se explica pela fragilidade do Estado, cujas instituições se encontram infiltradas pelo crime organizado”.
Estaria o México indo pelo caminho da “paramilitarização” colombiana dos anos 1980? “Não”, responde Buscaglia. “Na Colômbia, esses grupos eram centralizados e recebiam o apoio do Estado, ao passo que no México o fenômeno, sem raiz ideológica, é sintoma da falta de legitimidade do governo em seu combate ao narcotráfico. Essa proliferação de paramilitares atiça a espiral de violência”.
A guerra dos cartéis entre si e contra o governo produziu mais de 41 mil mortos e 10 mil desaparecidos desde o final de 2006. No fim de setembro, um estudo do jornal “Reforma” revelou um aumento dos homicídios, em 2011, de 485% no Estado de Zacatecas e de 300% no de Veracruz, sendo que, na segunda-feira (3), duas cabeças cortadas foram descobertas na Cidade do México, perto do Ministério da Defesa. Áreas que até então eram poupadas pela onda de violência.
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