Eu estava em Newcastle no norte da Inglaterra em 11 de setembro, dando uma palestra sobre o futuro da indústria na região. Estava entusiasmado por dar minha primeira entrevista no estúdio regional da BBC. Então ouvi sobre o ataque à primeira torre do World Trade Center enquanto estava num táxi a caminho de South Shields, nas proximidades.
A década desde então foi a mais traumática para o Ocidente desde a de 1930. Agora, à medida que o 10º aniversário do 11 de setembro se aproxima, precisamos nos perguntar como colocar um limite nisso, e recuperar uma posição de estabilidade e confiança. Isso demandará uma mudança radical na forma como pensamos.
Durante os últimos séculos, existiram três sistemas de ordem internacional: dominação econômica e militar; um equilíbrio de poderes; e a soberania compartilhada. Eles podem coexistir, como aconteceu mais ou menos nos anos após 1945 em diferentes partes do mundo. Mas hoje os EUA estão em desvantagem, econômica e militarmente. Novas potências como a China e a Índia estão ascendendo, e a Europa, onde a soberania compartilhada foi abraçada, está lutando para se manter dentro de suas próprias fronteiras, menos do que como um competidor global. As nações e as pessoas do mundo estão mais interligadas do que nunca, à medida que a informação, as finanças, os imigrantes e os problemas fluem cada vez mais facilmente pelo globo.
A última década foi de desordem. O 11 de setembro foi o gatilho, mas o Iraque, a crise financeira, os desequilíbrios econômicos globais e a “Primavera Árabe” também desempenharam sua parte. A fraqueza do sistema internacional – no comércio, mudança climática, Israel/Palestina – acrescentaram à sensação crescente de que não há ninguém encarregado dos problemas.
Os primeiros motivos dessa desordem estão nas surpreendentes assimetrias dos últimos dez anos, quando as medidas confiáveis de poder-influência parecem ter sido invertidas. Uma força não-estatal, a Al Qaeda, fez com que o Estado mais poderoso do mundo entrasse em convulsões. O espaço não governado em lugares como o Afeganistão, Iêmen e Somália logo se transformou em uma ameaça para as sociedades governadas. O poder passou dos estados fortes para cidadãos conectados usando telefones celulares para expor a violência do Estado na Síria e organizar milhões de manifestantes na Praça Tahrir.
O compromisso e a capacidade da Al Qaeda para fazer uma jihad mundial foi (e é) uma nova e séria ameaça. Um dos vários motivos pelos quais a noção de “guerra contra o terror” foi mal utilizada foi que ela permitiu que as pessoas pensassem que a Al Qaida era apenas mais um grupo terrorista como o Exército Republicano Irlandês (IRA). Ela não é. A Al Qaeda tem uma visão mundial, e não apenas local. Ela aspira não só à mudança, mas à revolução.
Infelizmente, essa nova ameaça de segurança deu forças para o empreendimento militar, quando a parte predominante da luta deveria ter sido política e diplomática. Eu não acho que havia outra alternativa para a determinação dos EUA, em 2001, de retirar o Taleban de Cabul. A tragédia é que, depois que isso foi feito, a paz foi perdida e não conquistada.
Os EUA dedicaram recursos notáveis para a luta contra a Al Qaeda. Mas a batalha se tornou um desvio forçado da tarefa diplomática essencial de construir novas regras e instituições para um mundo independente. E ao passo que a década começou com os EUA querendo uma folga da liderança global, ela termina num tom semelhante.
Mas enquanto os EUA têm buscado olhar para dentro, e a Europa de fato esteja fazendo isso, o resto do mundo está ocupado ganhando sua fortuna. Em 2000, a Índia e a China responderam por pouco mais de 4% do comércio mundial; hoje este número está perto dos 12%. Na última década, 63% do crescimento econômico mundial veio das economias emergentes. Para as nações BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China), a Al Qaeda nunca foi a principal questão. Seu foco foi o crescimento econômico.
Isso deixa um motivo final para a desordem: uma divisão filosófica sobre como governar o mundo moderno. Marshall McLuhan cunhou a noção de “aldeia global” nos anos 60. Hoje seu princípio fundamental – de que somos interdependentes – é amplamente aceito. Mas há uma divisão quanto às regras da aldeia.
O tema central diz respeito a se a soberania nacional pode e deve ser qualificada. Isso se demonstra em todos os aspectos das relações internacionais. Todos os estados-membro da ONU assinaram a chamada “responsabilidade de proteger” em 2005, mas as sanções da ONU contra o regime assassino da Síria foram bloqueadas pela Rússia, China e Índia alegando que a segurança interna é uma questão nacional.
A noção de que a interdependência deveria exigir uma restrição da soberania nacional é, francamente, uma visão minoritária. A União Europeia não é atualmente uma boa propaganda de suas virtudes; os norte-americanos desconfiam, e os chineses e indianos são profundamente céticos em relação à ideia. Tendo emergido de lutas políticas e econômicas pela independência, a última coisa que eles admitirão é a interferência nos assuntos internos. Este é um dos principais motivos pelos quais, desde a mudança climática até os direitos humanos, o sistema internacional não é capaz de promover uma ação efetiva.
Estamos diante de algumas tarefas urgentes. A primeira é reassegurar o lugar da diplomacia na política internacional. Richard Holbrooke, ex-embaixador da ONU, disse para mim que desde o 11 de setembro os EUA sofreram uma “militarização da diplomacia”. Agora precisamos do oposto.
Em segundo lugar, precisamos reavaliar nossa noção de equilíbrio do poder: ela não deve concernir apenas Estados, mas Estados e povos. Como demonstrou a Primavera Árabe, a onipresença da informação significa que as coalizões do futuro precisam ser formadas pelo povo, e não somente pelas elites.
Em terceiro lugar, estamos caminhando para uma era de escassez de recursos. Fora a bomba atômica, este é o acontecimento econômico e de segurança mais perigoso dos últimos dois séculos. Se você acha que o jogo de culpa na Europa em relação à Grécia é ruim, espere os argumentos sobre quem está causando a seca e a inflação dos preços dos alimentos.
Por fim, o Ocidente terá que redescobrir os benefícios do multilateralismo e da soberania compartilhada. Isso é difícil quando, na Europa, ninguém quer pagar as contas da Grécia. Mas o multilateralismo é uma garantia política global contra a determinação de qualquer estado abusar do poder. O problema não é que a UE e outras instituições multilaterais são muito fortes; é que elas são muito fracas. As instituições regionais do mundo árabe, da África, da América Latina e do Leste da Ásia são um desenvolvimento óbvio e necessário.
Há um século, Norman Angell argumentou em “A Grande Ilusão” que a expansão militar não poderia trazer a segurança econômica; que aconteceria ao contrário. Na verdade, nenhuma das duas é atingível sem a política – e no ano da Primavera Árabe, esta é a lição mais importante de todas.
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