Após três dias de uma crise excepcional que causou a morte de 17 vítimas e de três terroristas, chegou a hora de questionar a capacidade do Estado de evitar ataques como esses. Desde o início do conflito sírio, em 2011, as autoridades públicas, os serviços de segurança, a mídia e também, de uma certa maneira, a opinião pública, parecem estar focadas na ameaçada representada pelas pessoas que estão indo combater na Síria.
No final, a maior violência veio de veteranos da jihad que já eram conhecidos da Justiça desde 2004. Será que os jovens franceses que partiram para combater na Síria entre os jihadistas não teriam cegado as agências de inteligência?
É verdade que o novo fenômeno sírio, maciço e próximo, também mostrou seus riscos. No dia 24 de maio de 2014, Mehdi Nemmouch, depois de voltar da Síria assassinou quatro pessoas no Museu Judaico da Bélgica, em Bruxelas.
Mas entre 2010 e o início do ano de 2015, só no território francês, os irmãos Kouachi e seus companheiros das chamadas "redes do 19º arrondissement [distrito de Paris]" prosseguiram com sua radicalização, comprando armas e mantendo contatos com pessoas que decidiram ir combater na Síria ou na Tunísia entre os jihadistas.
"A intensidade baixa"
Como se estivesse antecipando essa questão, o ministro do Interior, Bernard Cazeneuve, afirmou, no auge dos acontecimentos, que os autores dos ataques "eram alvo da vigilância [policial]".
"Não havia elementos relacionados a eles que mostrassem a iminência de um ataque", ele disse. Esse argumento já fora dado em 2012, no caso de Mohamed Merah, o assassino de Toulouse, para justificar por que o ataque não fora previsto.
"Quando não há atividades particulares durante um certo tempo, de fato a intensidade baixa e passa-se para outra coisa, mas as agências de inteligência lidaram com cada geração de jihadista", diz outro oficial de alto escalão do setor de segurança e inteligência.
"E diferentemente dos novos pretendentes à jihad, os veteranos que acabam de atacar já haviam enfrentado a Justiça e aprenderam a passar "despercebidos", como disse um policial da Direção Geral da Segurança Interna (DGSI).
No entanto, pelo menos desde 2013 a polícia antiterrorista estava a par do dossiê sobre Chérif Kouachi e Amedy Coulibaly. A administração penitenciária não reportou nada sobre abusos dos dois durante a passagem deles pela prisão. E embora a DGSI tivesse condições de fornecer os endereços de possíveis esconderijos durante a fuga dos irmãos Kouachi e de Coulibaly, nenhum alerta foi dado antecipadamente sobre a iminência do ataque efetuado por eles.
Cooperação difícil
O nível de vigilância sobre essa rede estava ainda mais baixo pelo fato de que a cooperação entre as agências de segurança francesas continua difícil.
"Após a tentativa de atentado de Djamel Beghal contra a embaixada dos Estados Unidos em Paris no ano de 2001, a CIA veio à França fazer uma síntese dos elementos em posse de três agências francesas diferentes, a contraespionagem francesa, a Inteligência Geral e a Direção Geral de Segurança Externa. Antes disso, cada um guardava suas informações para si", lembra Bernard Squarcini, diretor da DCRI entre 2007 e 2012.
Então se a cooperação interna ainda deve ser aperfeiçoada, essa conduta com outros países sofreu com certos acontecimentos, como a "primavera árabe" de 2010. "De repente", diz ainda Squarcini, "não tínhamos mais contato com nossos colegas tunisianos, líbios e egípcios, e depois sírios, nossa visão se reduziu."
Por falta de informações os departamentos do Estado não tiveram elementos o suficiente para detectar a iminência de um ataque. Essa é uma tarefa cada vez mais difícil com o número crescente de indivíduos sem um verdadeiro projeto político e de psicologia instável.
"A verdadeira questão que surge para nossas democracias é como argumentar com razão contra uma lógica milenarista", desabafa um conselheiro ministerial.
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