quarta-feira, 21 de maio de 2014

Dinastia política da Índia sofre derrota paralisante

Narendra Modi
As autoflagelações ritualísticas são um elemento essencial da vida política da Índia e, uma reunião realizada na semana passada pelo partido do Congresso Nacional Indiano, convocada três dias após a pior derrota da história da agremiação, parecia clamar por uma reação espetacular.

Cerca de 200 jornalistas passaram a tarde acampados em frente à sede do partido, localizada no número 24 da Akbar Road, espiando através dos arbustos o bangalô onde, presumivelmente, os próceres do partido determinavam quais cabeças estavam prestes a rolar.

Depois de uma campanha que claramente fracassou em se conectar com um grande contingente de eleitores jovens cuja mentalidade está voltada para o crescimento do país, a representação do partido na câmara baixa do parlamento foi reduzida de 206 cadeiras para 44 – um revés chocante para um partido cuja história é parte integrante da narrativa de fundação da Índia.

O sol já estava quase se pondo por entre as árvores quando os membros da comissão surgiram, com expressões sombrias, e deram a notícia do que havia ocorrido dentro do bangalô: nada.

A presidente do partido, Sonia Gandhi, e seu filho, Rahul Gandhi, se ofereceram para renunciar a suas posições ao reconhecerem seu papel na desastrosa campanha eleitoral. Mas os membros da comissão foram unânimes ao votarem pela rejeição da renúncia dos dois, demonstrando sua confiança inabalável nessa família – família que, em Nova Déli, de alguma maneira, sempre é grafada com um "F" maiúsculo.

"Eu não acho que devemos fazer o que Shakespeare disse, e 'jogar fora a pérola'", disse um membro sênior do partido, Mani Shankar Aiyar, quando questionado sobre a decisão, durante um programa de entrevistas da NDTV. "A família Gandhi é a nossa pérola".

Dessa maneira, o partido repetiu um ritual previsível e consagrado pelo tempo. Há muitos anos, os líderes da família Gandhi têm demonstrado ambivalência em relação a seus papéis, e os membros leais ao partido têm respondido com aplausos cada vez mais altos: dez anos atrás, quando Sonia Gandhi se recusou a aceitar o cargo de primeira-ministra, funcionários do Congresso Nacional Indiano se reuniram diante de sua residência e alguns deles escreveram súplicas com sangue ou ameaçaram cometer suicídio caso ela não mudasse de ideia. Gritos de protesto foram ouvidos no início deste ano, quando Sonia Gandhi anunciou que Rahul, 43, não seria formalmente nomeado candidato a primeiro-ministro.

Mas havia uma familiaridade frustrante em relação aos resultados da reunião da Comissão de Trabalho do Congresso, cujos membros foram nomeados por Sonia Gandhi. Muitos partidários estavam ansiosos por sinais de que o Congresso Nacional estava preparado para enfrentar as deficiências que surgiram – entre eles, o mau desempenho de Rahul Gandhi como candidato e a ênfase no bem-estar social, que não chegou a impressionar os indianos mais jovens e mais cheios de aspirações.

Um comunicado divulgado pela comissão no final de segunda-feira apontou para esse segundo fato e sinalizou que, em parte, "nós não conseguimos interpretar os profundos desafios que se apresentaram ao país durante o período de 10 anos" em que coalizão liderada pelo partido do Congresso Nacional esteve no poder.

Durante a reunião, no entanto, Gandhi foi uma entre os vários membros da agremiação a destacar a estratégia de comunicação do partido. Segundo ela, "a mensagem do Congresso Nacional se perdeu em meio ao barulho feito pela campanha agressiva e polarizadora travada por nossos adversários, que foi respaldada por recursos ilimitados e por uma mídia hostil".

Renúncias ritualísticas, que costumam ser rejeitadas, ocorrem regularmente na política indiana e servem como garantia de que os líderes "não perderam a confiança e a fé dos 'insiders' do partido", disse Milan Vaishnav, analista do Carnegie Endowment for International Peace, um centro de pesquisa de Washington. Mas essas renúncias fingidas não são capazes de convencer o público de que os dirigentes partidários assumiram suas responsabilidades.

"É uma espécie de teatro Kabuki", disse ele. "Há uma fachada de prestação de contas, mas normalmente isso é apenas uma maneira de reforçar a sua posição".

A derrota do partido do Congresso Nacional foi, de certa maneira, previsível. O partido comandava o país havia 10 anos, e há uma lei não escrita em ciência política segundo a qual nas democracias os detentores do poder são duramente pressionados para se reeleger pela terceira vez. A inflação provocada pelos preços dos alimentos está alta na Índia. Mas nem mesmo os pessimistas teriam previsto um resultado de 44 cadeiras no parlamento para o Congresso Nacional, disse Neerja Chowdhury, analista política que chamou a situação atual de "um momento perigoso".

"Suponhamos que eles não consigam se recuperar. Se isso ocorrer, é possível que o partido do Congresso se divida, que ocorra uma erosão e que as pessoas dos estados comecem a buscar pastos mais verdes", disse ela. Em uma democracia, acrescentou ela, "você precisa de uma oposição saudável".

Ondas de comentários começaram a se espalhar, começando pelo óbvio: confrontado por um forte adversário, personificado por Narendra Modi e sobrecarregado pelas críticas segundo as quais o partido estava à deriva, o Congresso Nacional Indiano ainda não nomeou um candidato a primeiro-ministro, provavelmente para proteger Rahul Gandhi – que é um candidato visivelmente relutante – de um impasse traumático. E, para os eleitores jovens, que cada vez mais se mostram obcecados pelo crescimento econômico do país, a mensagem do Congresso Nacional estava concentrada demais na defesa dos programas de subsídios.

"A verdadeira lição que deve ser tirada disso é uma lição ideológica. A ideologia redistributiva não é mais suficiente", disse Rajiv Desai, um executivo de relações públicas e conselheiro de longa data da família Gandhi. Ele disse que o partido do Congresso poderia facilmente ter se apresentado como um porta-estandarte da reforma econômica caso seus líderes, incluindo Sonia Gandhi, não tivessem insistido em uma mensagem criada sob medida para os mais pobres.

"O partido do Congresso Nacional precisa de um líder, e a líder mais óbvia é Sonia", disse ele. "Eles precisam dizer a ela: 'você perdeu esse trem'. O que eu diria é: "sua política funcionou. As pessoas das áreas rurais ficaram ricas e, portanto, cheias de aspirações. E é por isso que você perdeu".


3 comentários:

  1. Eu tenho uma questão talvez despropositada mas digamos mais uma curiosidade ! Este presidente será digamos mais chegado com a russia ou com o ocidente ? O ex presidente na minha opinião era bem mais ocidental . Muito obrigado caro michel e já agora o sr disse que posta bastantes mais vídeos no Facebook gostaria se possível ter o seu link .

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    1. Ele tem pensamentos radicais e é nacionalistas, logo não vejo ele próximo ao ocidente. Manmohan Singh também não era fã dos EUA.

      https://www.facebook.com/blogoinformante

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    2. Caro Michel muito obrigado pelo esclarecimento e desde jjá digo a página de Facebook tá ainda mais bacana :)

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