terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Onda de refugiados sírios foge do combate em Aleppo

Centenas de milhares de civis sírios fugiram nas últimas semanas das partes controladas pelos rebeldes da cidade de Aleppo, que estão sob bombardeio aéreo pesado por parte do governo sírio. Bairros inteiros foram esvaziados e deu-se um dos maiores fluxos de refugiados de toda a guerra civil, segundo membros da assistência humanitária.

Os refugiados, que chegam a 500 mil até o momento, segundo a ONU, dirigiram-se para o campo, inchando as populações de comunidades agredidas pela guerra que já estão com pouco espaço e comida, e para a Turquia, em uma viagem que muitos descreveram em entrevistas como atormentada, que os deixou em condição de desespero, quebrados, com fome e, em muitos casos, doentes ou feridos.

Grande parte da maré humana que sai pelo norte da Síria recai sobre esta cidade, outrora pacata, na fronteira, onde os sírios agora quase superam os 90.000 habitantes originais turcos.

Suas calçadas estão cobertas de sírios carentes vendendo biscoitos, café e cigarros, e os aluguéis dispararam com a ocupação por famílias sírias. Ambulâncias passam regularmente de sirenes ligadas pela cidade, transportando as vítimas da guerra às instalações médicas sobrecarregadas da cidade.

Nas últimas semanas, os bombardeios em Aleppo se aceleraram, enquanto as negociações internacionais que visam acabar com a guerra estão paralisadas, e o governo Obama já começou a rever sua política na Síria de forma a encontrar novas maneiras de pressionar o governo do presidente Bashar al-Assad.

Enquanto os Estados Unidos considera a adoção de novas estratégias, dizem os analistas, Assad está avançando com a sua: expulsando os civis de distritos controlados pelos rebeldes ou usando meios militares para tornar a vida dos que permanecem ainda pior.

A agência de direitos humanos da ONU alertou na semana passada sobre o que chamou de "um padrão" de ataques do governo que viola as leis da guerra, mas a estratégia parece estar funcionando para Assad, drenando o poder de rebeldes próximos a Damasco e permitindo que as suas forças avancem em torno de Aleppo.

O que está causando grande parte do êxodo é o uso pesado pelo governo de bombas de barril, recipientes grandes cheios de explosivos e fragmentos de metal que explodem com o impacto, mutilando e matando pessoas dentro de um grande raio, derrubando edifícios e, muitas vezes, deixando corpos enterrados nos escombros.

"Um barril caiu sobre a casa do nosso vizinho e misturou as pessoas com os tijolos", disse Mustafa Toameh, 43, sentado no chão da estação de ônibus nesta cidade turca fronteiriça, onde tinha passado as duas noites anteriores. Ao redor dele estavam 10 membros de sua extensa família, que ele tirou da Síria, e alguns sacos de grãos cheios de pertences reunidos apressadamente.

"Não conheço ninguém aqui; se tivéssemos algum lugar para ir, iríamos", disse ele.

Aleppo tem sido a cidade mais atacada, mas os helicópteros sírios também lançaram bombas de barril em Yabroud, uma cidade da oposição perto de Damasco, empurrando milhares de refugiados para o Líbano.

Mas a maior parte dos novos refugiados está indo para a Turquia, pressionando os serviços médicos e sociais já desgastados.

Nas últimas semanas, os casos de emergência no principal hospital de Kilis subiram para 20 a 30 por dia, disse o médico supervisor Mehmet Beyazit. Enquanto alguns pacientes são combatentes rebeldes feridos em confrontos com extremistas islâmicos, a grande maioria é de civis feridos por bombas de barril. Após os tratamentos iniciais, os pacientes são transferidos para clínicas em outros lugares na cidade que se dedicam aos feridos de guerra.

Em uma tarde recente, os médicos em uma clínica sofreram ao ouvir os gritos de um menino de 12 anos que havia perdido a perna com uma bomba de barril enquanto mudavam o curativo em seu coto.

"Ele estava na feira, quando o barril caiu e arrancou sua perna", disse a avó do menino, Fátima Abtini, fazendo um movimento de guilhotina com a mão.

Na época, a família vinha debatendo se havia se tornado muito perigoso permanecer na cidade, contou ela.

"Nós ficávamos dizendo, 'vamos amanhã', e nos organizávamos, mas então o barril chegou e nós corremos para a fronteira", disse ela.

Em uma audiência fechada na semana passada, Valerie Amos, coordenadora de assistência da ONU, disse ao Conselho de Segurança que a estimativa é que 500.000 pessoas fugiram de Aleppo nas últimas semanas e que o dobro disso pode acabar preso na cidade com o avanço das batalhas.

Em suas observações, obtidas pelo "The New York Times", ela disse que os comboios de ajuda iam entrar na área esta semana, mas que os novos combates tornaram esses esforços "extremamente precários".

Emile Hokayem, analista do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos, disse que o deslocamento de civis permite que Assad coloque um enorme fardo sobre os rebeldes, sobre os países vizinhos e sobre as organizações de ajuda humanitária. A destruição de bairros da oposição também elimina essa ameaça para Assad no futuro.

"Assad está tentando retomar territórios importantes, mas não a população", disse Hokayem. "Ele não precisa manter as habitações, porque o objetivo não é permitir que os moradores voltem. É uma espécie de limpeza".

Enquanto o governo sírio vem usando bombas de barril há meses, nas últimas semanas sua utilização foi intensificada em zonas controladas pelos rebeldes, matando mais de 450 pessoas este mês, disse Rami Abdul Rahman, do Observatório Sírio de Direitos Humanos.

A maioria dos que fugiram da cidade mantiveram-se dentro da Síria, superlotando cidades pobres e dormindo em barracas maltrapilhas, sem acesso à eletricidade ou à água corrente.

"Muitas famílias abrigaram as pessoas, mas elas não têm como alimentá-las", disse Muhannad Najjar, ativista de uma cidade ao norte de Aleppo que recebeu milhares de refugiados nas últimas semanas.

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