Na Rússia, um empresário tem mais chances que um ladrão comum de acabar no sistema de colônias penais antes conhecido como gulag.
Mais de 110 mil pessoas estão cumprindo pena pelo que a Rússia chama de "crimes econômicos", isso em uma população de 3 milhões de profissionais autônomos e donos de pequenas e médias empresas. Outras 2.500 estão presas, aguardando julgamento por essa categoria criminal, que abrange fraude, desfalque, falsificação e sonegação de impostos. Mas, com a economia russa estagnada, o presidente Vladimir Putin criou um plano: oferecer anistia a alguns dos empresários e executivos encarcerados.
"A medida pode ser compreendida dentro do contexto russo", disse Boris Titov, ombudsman de Putin para os direitos dos empreendedores, aludindo à ideia.
A anistia é necessária, disse Titov, porque o governo "reagiu de maneira exagerada" à ameaça do crime organizado, às iniquidades da privatização e ao excesso de processos legais contra empreendedores durante os primeiros 12 anos de Putin no poder, como presidente e premiê.
A economia russa realmente precisa de ajuda. O crescimento caiu para 1,6% no primeiro trimestre devido ao nivelamento dos preços do petróleo. Poucos russos parecem dispostos a correr o risco de abrir novos empreendimentos que possam gerar empregos e receita tributária para o governo.
Em 2010, a polícia investigou um total de 276.435 casos de crimes econômicos, segundo a Procuradoria-Geral russa. As cifras indicam que furtos e roubos são menos visados pela Justiça que os crimes econômicos.
Na "zona", como são conhecidos os campos de prisioneiros, os empresários vivem em alojamentos de madeira ou de tijolos, como vivem quase todos os detentos russos. De acordo com eles, é um mundo sombrio e violento em que doenças proliferam.
Os novos detentos são, em sua maioria, não violentos. Em entrevistas, vários indicaram que se saíram bem na prisão por possuírem habilidades que fazem adiferença nesse ambiente: facilidade para mandar nos outros detentos, para evitar abusos e para negociar com os carcereiros pequenos "extras", como travesseiros ou pontas de cigarro.
No primeiro mês do programa de anistia, em vigor há seis meses, os tribunais libertaram 13 detentos. A lei de anistia se aplica a 27 crimes, incluindo a fraude de crédito, e cobre pessoas que foram condenadas uma vez ou que se confessaram culpadas antes de seu processo ir a julgamento e concordaram em pagar danos.
Um dos empresários libertados foi Ruslan V. Tyelkov, moscovita de 32 anos que abriu uma empresa de estofados ao atacado.
Em 2010, Tyelkov pagou US$ 31 mil por 23 mil metros de tecido de fabricação chinesa com estampa de leopardo, próprio para estofar sofás e poltronas. A polícia chegou a seus armazéns de surpresa e levou embora todos os rolos de tecido, entregando-os a um concorrente de Tyelkov, supostamente para que os guardasse.
Então a polícia prendeu o empresário, que passou um ano detido antes de ir a julgamento. Seu crime? Segundo a polícia, ele é suspeito de infração de copyright. "No início, foi engraçado", comentou Tyelkov. "Perguntei: 'De quem é o copyright, de um leopardo?'."
Mais tarde, uma investigação de Titov confirmou que a polícia aliou-se a um concorrente de Tyelkov para apreender a mercadoria sob pretexto de uma investigação criminal.
Seu negócio foi arruinado, mas Tyelkov disse que conseguiu usar seus dons para fazer frente aos pequenos desafios da vida na prisão. Ele desenhou cenas da vida carcerária e se tornou líder informal da cela que dividiu com um assassino, um militante e vários dependentes de drogas.
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