sexta-feira, 5 de julho de 2013

Situação do Egito inspira vizinhos e põe Tunísia em estado de choque

Salaheddine, um jovem simpatizante do partido islamita tunisiano Ennahda, que foi testemunha de uma cena de estupro coletivo durante uma breve passagem pela praça Tahrir, no Cairo, repleta de manifestantes, voltou apavorado na terça-feira (2). Ficou chocado também pela cena de egípcios fazendo filas nos postos de gasolina, e mais ainda pelo clima de violência. "É um cenário na linha da Argélia que está sendo preparado", ele previa.

Na quarta-feira (3) à noite, após o anúncio da destituição do presidente egípcio Mohamed Mursi pelo exército, Salaheddine estava mais soturno do que nunca, enquanto a direção do Ennahda, reunida a portas fechadas, discutia os acontecimentos. Tarde da noite, militantes ainda se encontravam reunidos diante da sede do partido, comentando entre si "o golpe de Estado militar e o infortúnio" egípcio. A poucos metros de lá, em frente à embaixada do Egito, uma centena de pessoas comemorava a queda da Irmandade Muçulmana.

A imprensa tunisiana dedicou suas manchetes a isso na quinta-feira de manhã, relegando para segundo plano a primeira visita oficial do presidente François Hollande, prevista para o mesmo dia. "O regime islamita caiu, o povo está contente", escreveu o "Echourouk", a maior tiragem em língua árabe, enquanto o jornal francófono "La Presse" especulava sobre um possível "contágio, sobretudo se considerarmos que os erros cometidos pela Irmandade Muçulmana egípcia se somaram àqueles nos quais  incorreu o governo" tunisiano, dominado pelo Ennahda.

"O islamismo político não tem futuro"
Afif Fehri, um aposentado membro do partido Al-Massar (progressista), veio na noite de quarta-feira com a família para a frente da embaixada do Egito e não escondia sua alegria. "O islamismo político não tem futuro, esperamos que François Hollande compreenda isso!", ele exclamava. "Inspiramos os egípcios a fazer a revolução, agora esperamos que o contrário aconteça", concordava ao seu lado sua esposa. O Ennahda, oriundo da esfera da Irmandade Muçulmana assim como Mohamed Mursi, e que chegou ao poder em outubro de 2011 após a queda do regime de Zine el-Abidine Ben Ali, permaneceu calado.

Há vários dias, a Tunísia tem vivido como os egípcios. Em um comunicado divulgado no dia 1o de julho, após as manifestações maciças anti-Mursi no Egito, o presidente do Ennahda, Rached Ghannouchi, correu em socorro ao partido irmão: "O Egito continua sendo o coração da Umma [a comunidade muçulmana]. Originadas na Tunísia, as revoluções árabes se tornaram uma primavera após a gloriosa revolução egípcia. Não há alternativa ao diálogo entre egípcios (…) respeitando a legitimidade democrática."

Os islamitas tunisianos tentaram diversas vezes exercer um papel de mediação. Amer Larayedh, presidente do braço político do Ennahda, ainda estava no Cairo no mês de junho. Em vão. "Na Tunísia, quisemos redigir com calma uma Constituição sem confiá-la a especialistas, no Egito eles não concordaram com esse pacto, foi aí que as divergências começaram", tentava se tranquilizar, na terça-feira, Meherzia Labidi, vice-presidente (Ennahda) da Assembleia Nacional Constituinte.

Sem candidatos do Ennahda na eleição presidencial
O governo tunisiano, ao sentir que a maré estava virando, tentou se adiantar. Foram abertos pontos de venda direta para tentar estabilizar os preços. Foram tomadas medidas para evitar os habituais cortes de água e de luz no verão. Acima de tudo, foram resolvidos debates internos. Assim, o Ennahda não deverá apresentar nenhum candidato na próxima eleição presidencial.

As manifestações de rua continuam limitadas, mas a pressão vem crescendo sensivelmente ali também. As recentes declarações do chefe do estado-maior do exército tunisiano, Rachid Ammar, quando este se aposentou, voltaram à tona. Considerado como um "herói" no momento da revolução em 2011, o general mencionou, durante um discurso na TV,  um risco de "somalização" da Tunísia.

Na manhã de quarta-feira, um grupo de jovens anunciou a criação do Tamarod Tunisie ("Rebelião"), calcada no modelo egípcio, e começou a circular um abaixo-assinado para pedir "novas eleições livres". "No espaço de uma semana, já coletamos 176 mil assinaturas", garante Hana Abdelaani. "Os islamitas no poder vieram para dividir o povo, mas o povo no Egito soube se reapropriar de sua revolução. Isso nos encoraja", comemorou, na noite de quarta-feira, o porta-voz do movimento, Mohamed Bennour, de 27 anos.

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