sexta-feira, 5 de julho de 2013

Fracasso dos islamitas no poder marca virada nas revoluções árabes

Depois da "primavera árabe" e do "inverno islamita", seria a vez do "verão pretoriano"? O "golpe de Estado democrático" do exército contra o presidente Mohammed Mursi, que foi tanto o primeiro civil eleito para o comando do Egito quanto o primeiro islamita a dirigir o país mais populoso do mundo árabe, certamente terá repercussões sobre o Oriente Médio e os processos revolucionários em andamento. Por causa de seu peso demográfico, de sua "centralidade" e de sua proximidade com Israel, o Egito vale como exemplo.

O destino de Mursi, que veio da matriz da Irmandade Muçulmana  --o braço egípcio da confraria foi criado em 1928 pelo pai fundador, Hassan al-Banna--, marca primeiramente um grave revés para o islamismo político. Após a queda dos tiranos (Ben Ali, Mubarak, Gaddafi) que os haviam perseguido durante décadas, os islamitas emergiram como os mais legítimos dos opositores, os menos implicados e, acima de tudo, os mais bem organizados, por causa das necessidades da luta clandestina.

Também por causa de seu trabalho profundo na área de caridade e de sua credibilidade religiosa em sociedades ainda muito conservadoras, os islamitas logicamente conquistaram amplas vitórias nas primeiras consultas verdadeiramente democráticas organizadas após a queda dos regimes autoritários. Com a exceção notável da Líbia,  onde liberais e forças tribais suplantaram a Irmandade Muçulmana, a maior parte deles tendo retornado do exílio. Na Síria, onde a revolução virou uma sangrenta guerra civil, a Irmandade Muçulmana domina as instâncias representativas da oposição, o Conselho Nacional Sírio e a Coalizão.

Mas a incapacidade dos islamitas de administrar situações econômicas desastrosas, sua vontade de governar sozinhos, sua mania de perseguição e sua agenda sectária os isolaram da sociedade e das forças liberais e revolucionárias bem mais rapidamente que o previsto. A ponto de uma ampla maioria de egípcios preferir confiar a questão ao exército em vez de esperar por uma mudança através das urnas. É uma aposta arriscada, pois deslegitimiza a prática democrática, assim como a Irmandade Muçulmana egípcia fez ao recorrer a poderes extraordinários para impor uma Constituição repleta de ambiguidades.

Será que o modelo egípcio pode contaminar a Tunísia, onde a população anda irritada com a alta dos preços e o desemprego, além da interminável discussão sobre o projeto de Constituição? O exército tunisiano não tem a mesma tradição de intervenção no campo político que seu correspondente egípcio, ainda que a popularidade de seu ex-chefe do Estado-maior aposentado, Rachid Ammar, permaneça intacta.

Guerrilha islamita
Esse revés para a Irmandade Muçulmana veio agora que seu principal patrocinador regional, o pequeno e riquíssimo emirado do Qatar, acaba de passar por uma sucessão que deverá resultar em um relativo apagamento diplomático e um apoio menos visível a regimes que se tornaram muito impopulares. O primeiro-ministro turco, Recep Tayyip Erdogan, também enfraquecido por uma revolta interna, não pode mais se colocar como modelo de sucesso do islamismo político.

Em compensação, o presidente sírio, Bashar al-Assad, com o qual Mursi havia rompido recentemente nas relações diplomáticas, só pode comemorar a queda de seu homólogo. "Quem quer que se sirva da religião no campo político para favorecer um grupo em detrimento de outro cairá, em qualquer lugar do mundo", ele declarou em um comunicado oficial, acrescentando: "O resumo daquilo que está ocorrendo no Egito é a queda do que se chama de islamismo político". Há algo de irônico e chocante nessa declaração por parte de um homem que só atiçou ódio entre religiões em seu país, para transformar uma revolução pacífica e pluralista em uma guerrilha islamita.

Se Bashar al-Assad, seus aliados russos e os nostálgicos do antigo regime no Egito só querem ver na intervenção do exército no Cairo a restauração de um poder autoritário, eles estão enganados. A mais recente reviravolta egípcia também mostrou a força do movimento revolucionário, tanto no Egito como em outros países.

Os revolucionários, rapidamente enterrados após suas derrotas eleitorais, recorreram à melhor arma que têm: o povo. O exército egípcio também não deve se esquecer disso. Assim como ele não pode pensar em voltar à época das grandes blitzes anti-islamitas e das eleições fraudulentas. O caminho é estreito para os novos donos do jogo.

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