terça-feira, 4 de junho de 2013

Iêmen cumpre promessa da Primavera Árabe

Num hotel de luxo nos arredores de Sanaa, a capital do Iêmen, 565 pessoas representativas dos diversos setores da população nacional vêm se reunindo, há mais de dois meses, tentando definir a forma que vai assumir o futuro governo do país.

As discussões são conhecidas como a Conferência de Diálogo Nacional. São o que mais perto há, em relação às revoluções árabes de 2011, de uma transição pacífica, de base ampla, do despotismo para a democracia.

"É a única transição negociada que existe no contexto da Primavera Árabe", comentou Jamal Benomar, assessor especial das Nações Unidas para o Iêmen.

Quando, recentemente, o presidente Obama anunciou estar levantando a suspensão de libertações contra iemenitas detidos na prisão de Guantánamo, o fato foi visto no Iêmen como uma ratificação do progresso de diálogo nacional na criação de mais estabilidade política. Obama impôs a suspensão depois de a Al Qaeda na Península Arábica, um grupo militante com sede no Iêmen, ter reivindicado a tentativa de explodir um avião de passageiros com destino a Detroit, em 2009.

No Iêmen, otimistas saúdam o processo de diálogo como uma tentativa bem-sucedida, embora desorganizada, de criar um sistema político mais representativo. Os pessimistas temem que o diálogo não passe de uma fase de calmaria na violência que assolou o país até um ano atrás. "Ainda não chegamos a uma solução", comentou Abdulghani al-Eryani, assessor da conferência. Mas, disse ele, o diálogo "modificou a dinâmica política e o equilíbrio de poder no país".

Ele e outros acreditam que o diálogo pode funcionar no Iêmen, apesar de ter fracassado em outros países, como na Síria.

Para começar, a fragmentação do poder era tão grande, especialmente entre as Forças Armadas, que nenhuma facção isolada acreditou que conseguiria sair vencedora. Em segundo lugar, um grupinho de líderes respeitados persuadiu as diversas facções a evitar uma guerra civil. Em terceiro, os países árabes do Golfo e a comunidade internacional se uniram com relação ao Iêmen. O Conselho de Segurança da ONU se envolveu desde o início e ameaçou de modo unânime aplicar sanções internacionais a qualquer facção que colocasse em risco a transição pacífica.

"Finalmente tivemos algum benefício do fato de sermos pobres e insignificantes", comentou Eryani. "A comunidade internacional não está se digladiando em torno de interesses no Iêmen."

Mas os problemas da pobreza, da marginalização, da corrupção, do desemprego e dos serviços governamentais insuficientes ou inexistentes, que levaram a revolução a explodir em primeiro lugar, não desapareceram, e atores poderosos não saíram de cena.

A capital sofre cortes de eletricidade frequentes porque tribos indignadas com a falta de serviços públicos cortam os cabos elétricos. Bilhões de dólares em ajuda prometida pelo Kuait, pelo Qatar e pelos Emirados Árabes Unidos não foram dados.

O diálogo nacional começou em 18 de março. A ideia original era que tratasse de todos esses problemas em seis meses. Uma sessão plenária para rever os avanços conquistados está programada para 8 de junho. Muitos preveem que o processo seja prorrogado por mais quatro a seis meses.

O maior problema que dificulta o diálogo é o fato de que a maioria dos principais líderes políticos do sul, que até a unificação, em 1990, era um país independente e marxista, busca a separação do Iêmen e está boicotando o diálogo.

Entre os atores políticos, o ex-presidente Ali Abdullah Saleh, que governou o Iêmen por mais de três décadas, ainda chefia o Congresso Geral do Povo, o antigo partido governista. Analistas creem que o ex-presidente, que ganhou imunidade por ter renunciado ao cargo, esteja tramando seu retorno.

Além disso, o acordo de partilha de poder entre as duas facções principais, que abriu o caminho para o diálogo nacional, acabou por gerar uma forma de paralisia.

Cada facção quer uma parcela igual de cargos governamentais, o que significa que muitos embaixadores, por exemplo, ainda não foram nomeados, devido às discussões intermináveis.

Iemenitas e analistas temem que antigos donos do poder barrem a entrada de novos atores no diálogo nacional, incluindo mulheres, jovens e representantes de minorias. Mas, até agora, o diálogo vem nivelando os interesses conflitantes.

"Os participantes não estão atirando uns nos outros nem gritando uns com os outros. Isso é um bom começo", comentou Fazli Corman, o embaixador turco no país.

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