terça-feira, 14 de maio de 2013
Ovelha negra da UE, Romênia dá exemplo no combate à corrupção
A Romênia tem fama de ovelha negra da União Europeia, mas sua legislação poderá servir de exemplo no debate sobre a moralização da vida pública. Frequentemente acusada de corrupção endêmica entre sua classe política e sua administração, o país possui uma das legislações mais rigorosas em matéria de transparência. As medidas que a França está tentando implantar para tornar a vida política mais transparente foram adotadas pela Romênia já em 2007.
Querendo ou não, e sobretudo sob pressão da Comissão Europeia, o Parlamento romeno acabou aprovando a lei 144/2007 a favor da criação da Agência Nacional de Integridade (ANI). Essa instituição pública é encarregada de monitorar o patrimônio de todos os funcionários da administração central e local. Todos os anos, estes devem fazer uma declaração de seu patrimônio, que a ANI publica.
Essa obrigação é imposta ao chefe do Estado e seus conselheiros, aos parlamentares, ao chefe do governo, a seus ministros e a todo o aparelho do Estado: chefes de serviços de inteligência, prefeitos, conselheiros regionais e locais. Em suma, toda a administração central e local deve passar por essa prova de transparência imposta pela lei.
"Nós trabalhamos muito para criar esse mecanismo, ainda mais porque não existia nenhum modelo similar em outro lugar," afirma o diretor da ANI, Horia Georgescu, um jurista de 36 anos. "Nossa agência é fruto do trabalho coletivo de uma equipe de jovens especialistas. Nós sofremos pressões constantemente. Alguns políticos nos criticam sem parar, nosso orçamento foi reduzido e nossos fiscais às vezes são ameaçados. Mas não vamos ceder".
A classe política romena bem que dispensaria a ANI e seus jovens inspetores, mas ela cedeu à pressão da Comissão Europeia. A Romênia havia iniciado negociações de integração à União Europeia (UE) em 2000, mas só conseguiu ingressar em 2004, junto com outros dez países da Europa Central e os países bálticos.
O grande obstáculo era a reforma do Judiciário exigida pela Comissão Europeia. Bucareste se comprometeu junto a Bruxelas em resolver esse complicado problema em um prazo de três anos para garantir sua adesão à UE em 2007, ao lado da Bulgária. Essa difícil missão foi confiada à advogada Monica Macovei, que na época era conhecida como a guardiã dos direitos humanos na Romênia.
Estabelecida no Ministério da Justiça em 2005 e auxiliada por uma jovem equipe, ela começou uma reforma radical do sistema judiciário. Principal objetivo: combater a corrupção por todos os meios, dar um máximo de poderes aos procuradores e lhes garantir total independência. Sob sua direção, a Procuradoria Nacional Anticorrupção (DNA) desencadeou a operação "mãos limpas", visando personagens-chave nas altas esferas do poder.
Foi uma revolução, num país onde os políticos são intocáveis. Eleita deputada europeia em 2009, Monica Macovei é um pesadelo para boa parte da classe política romena.
Diversas condenações
Mas o sistema instaurado pela "amazona" da justiça romena resistiu às pressões políticas e surtiu resultados inesperados. No dia 20 de junho de 2012, para surpresa geral, o ex-premiê socialista Adrian Nastase, que exerceu a função entre 2000 e 2004, foi condenado a dois anos de reclusão por um caso de corrupção. Ele foi solto no dia 18 de março de 2013 por comportamento exemplar na prisão.
Nos últimos anos, os procuradores anticorrupção conseguiram a condenação de vários secretários de Estado, deputados, governadores, generais e outros personagens públicos de alto escalão. O mais recente peixe gordo a cair nas redes da DNA foi o senador socialista Catalin Voicu, que se gabava de controlar a justiça romena e acaba de ser condenado a sete anos de prisão no dia 23 de abril. No dia seguinte, a Agência Nacional de Integridade anunciou a incompatibilidade de vários dirigentes dos principais partidos romenos com suas funções.
Os acusados tinham ligações de negócios com empresas privadas que assinavam contratos com as instituições que eles dirigiam. "No entanto, o grosso da corrupção acontece em nível local", explica Horia Georgescu. "Milhares de vereadores assinam contratos com suas próprias empresas. Boa parte das pessoas empregadas nessas empresas depois vai para equipes que administram os projetos financiados pelos fundos europeus. Esse problema é apontado constantemente nos relatórios feitos pela Comissão Europeia como parte do mecanismo de cooperação e verificação".
A praga da corrupção está longe de ser erradicada da Romênia, e instituições como a ANI e a DNA ainda têm um longo caminho pela frente. Mas o processo de faxina foi iniciado por uma geração jovem que sonha com uma Romênia diferente. Cerca de quatro milhões de declarações de patrimônio de altos funcionários agora são públicas e podem ser consultadas no site da ANI. Uma mina de ouro para os jornalistas investigativos e procuradores.
Enquanto a França sofre o abalo do caso Cahuzac, a Romênia teve sete ministros demitidos após investigações da ANI. Pela primeira vez, a ovelha negra da UE está dando o exemplo.
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