terça-feira, 23 de abril de 2013

Passado deu rigidez à líder sul-coreana

Park Geun-hye

Sua mãe foi morta num assassinato político. Seu pai, ditador anticomunista ferrenho, morreu da mesma maneira. Ela própria foi agredida com facadas no rosto, mas sobreviveu.

A nova presidente da Coreia do Sul, Park Geun-hye, foi criada de uma maneira que a converteu numa líder austera e intransigente. Hoje no centro de uma crise crescente com a Coreia do Norte, Park, 61, é a primeira mulher que já liderou seu país, fato que Pyongyang já citou com desdém.

As histórias sobre sua intransigência são lendárias. Ao ser informada da morte de seu pai, sua primeira preocupação foi saber se a Coreia do Norte preparava uma invasão. A primeira pergunta que ela fez ao despertar de uma cirurgia depois de ter o rosto cortado com uma lâmina, em 2006, ataque que lhe deixou uma cicatriz no maxilar, foi sobre como estava indo a campanha de seu partido.

Park é tão autoritária que até mesmo na Coreia do Sul, uma das sociedades mais patriarcais da Ásia, a questão de seu gênero deixou de ser mencionada depois de alguns questionamentos iniciais.

"No passado, durante a campanha eleitoral, foram levantadas dúvidas quanto à atuação de uma presidente mulher em tempos de crise", comentou Choi Jin, diretor do Instituto de Liderança Presidencial, em Seul. "Mas, ao longo do atual impasse com a Coreia do Norte, Park vem desfazendo quaisquer dúvidas sobre isso, deixando claro que é uma líder forte."

No entanto, agora que a economia sul-coreana parece estar abalada por meses de crise, os críticos e os partidários da presidente questionam se ela não terá ido longe demais no esforço de se mostrar uma líder intransigente.

Park tomou posse em 25 de fevereiro, já disposta a se impor. Nomeou ex-generais para cargos de segurança em seu gabinete e em sua equipe presidencial e não ofereceu qualquer concessão real enquanto a Coreia do Norte não recuasse. É uma mudança de postura em relação a governos passados.

Em março, Pyongyang disse que "o movimento venenoso da saia" de Park era o culpado pelas tensões -alusão a uma antiga expressão coreana usada para designar mulheres que esquecem qual é seu devido lugar.

Park e seus militares vêm enfrentando as ameaças norte-coreanas de holocausto nuclear com declarações agressivas. Recentemente, os militares sul-coreanos ameaçaram "varrer da face da terra" a dinastia comunista se ela ousasse lançar um ataque nuclear.

Park disse a seus generais que, se a Coreia do Norte iniciar um ataque, mesmo que limitado, eles devem contra-atacar "sem levar considerações políticas em conta" e sem esperar sua aprovação.

A presidente tem razões pessoais para querer esfriar a Coreia do Norte. Comandos norte-coreanos chegaram muito perto da sala de trabalho de seu pai, em 1968, antes de serem interceptados. O atirador que matou sua mãe também teria sido enviado pela Coreia do Norte para matar seu pai (que foi morto alguns anos depois por seu próprio chefe de espionagem).

Num país com tão poucas mulheres em cargos de liderança e onde a disparidade de renda entre homens e mulheres é uma das maiores no mundo em desenvolvimento, os sul-coreanos explicam sua relativa indiferença ao sexo de Park dizendo que a elegeram por sua origem e formação política.

A presidente é vista como digna de seu pai, praticamente reproduzindo a férrea determinação dele de enfrentar o inimigo ao norte, algo que o levou a falar abertamente em "exterminar" comunistas.

Apesar de seu histórico de violações dos direitos humanos, o ex-ditador Park Chung-hee ainda é tido em alta consideração no país, principalmente por ter ajudado a fortalecer a economia sul-coreana e por ter construído uma das histórias de sucesso econômico mais notáveis no mundo.

Refletindo uma visão comum no país, Bong Young-shik, pesquisador sênior do Instituto Asan de Estudos de Política, em Seul, comentou: "Ela não é uma mulher. É Park Chung-hee encarnado num corpo de mulher."

Não obstante sua intransigência, a presidente também revela um lado pragmático. Em 2002, quando seu país ensaiava uma aproximação com o Norte, ela reforçou sua presença política, visitando Pyongyang e o filho do possível mandante do atentado que matou sua mãe.

Durante sua campanha, Park disse que ofereceria ajuda humanitária à Coreia do Norte mas não faria grandes concessões enquanto o Norte não abrisse mão de suas armas nucleares. Diante das ameaças de Pyongyang, a oferta foi retirada. Neste mês, a presidente abrandou a linha dura, mas apenas depois de uma queda na Bolsa de Valores e de um líder empresarial estrangeiro ter questionado se a Coreia do Sul continuará a ter estabilidade suficiente para justificar investimentos.

Com o legado econômico de seu pai a proteger, Park tentou interromper a escalada de ameaças de ambos os lados, fazendo uma oferta vaga de negociações.

A expectativa é que, a não ser que a economia piore muito, Park se mantenha firme, procurando forçar a Coreia do Norte a recuar.

Especialistas observam que a determinação ferrenha é algo herdado. Quando sua mãe foi baleada num teatro, seu pai discursava sobre o palco. Depois da mãe ser levada embora, sangrando, o presidente voltou-se para a plateia e retomou seu discurso.

Dias depois, Park Geun-hye, então uma jovem de 22 anos, assumiu as funções de primeira-dama.

Quase 40 anos depois, voltou a entrar na Casa Azul, dessa vez como presidente.

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