segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Política americana de hoje é uma "farsa cansativa"

O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, e o vice, Joe Biden, se pronunciam após a aprovação pela Câmara de projeto destinado a cancelar os efeitos do chamado "abismo fiscal"

O anúncio de Barack Obama sobre o fechamento de um acordo para evitar o "abismo fiscal" foi recebido como uma vitória para o presidente democrata. Os editorialistas alemães, contudo, têm menos certeza. Eles advertem que a amarga briga política em Washington provavelmente prejudicará o país no longo prazo.

Depois de uma batalha longa e rancorosa em torno da política fiscal, o presidente Barack Obama anunciou, no final desta terça-feira (1º), que o Congresso dos Estados Unidos aprovou uma lei para evitar o temido "abismo fiscal".

Se os legisladores em Washington não conseguissem alcançar um acordo, haveria uma grande escalada no imposto de renda para a classe média e enormes cortes de gastos para o governo, o que provavelmente levaria o país a uma nova recessão. Cerca de 24 horas depois da aprovação pelo Senado, o acordo foi aprovado pela Câmara por 257 votos a 167, evitando a implementação automática de aumentos de impostos resultantes da expiração dos cortes instalados pelo presidente George W. Bush. Uma série de republicanos da oposição, temerosos que sua teimosia fosse culpada pelo "abismo fiscal", votaram pelo acordo, considerado uma vitória do presidente Obama que concorreu à reeleição defendendo um aumento de impostos para os ricos.

"Uma promessa central da minha campanha para presidente era reformar a cobrança de impostos, que beneficiava muito os ricos às custas da classe média trabalhadora norte-americana", disse Obama em curto pronunciamento à imprensa. "Hoje, nós fizemos isso".

Quando Obama sancionar a lei, o país não terá mais que enfrentar os US$ 500 bilhões (em torno de R$ 1 trilhão) em aumentos de impostos e US$ 109 bilhões de cortes de gastos internos e de defesa. Em vez disso, a lei garante a continuação dos alívios fiscais para a maior parte das pessoas, enquanto aumenta o índice para rendas anuais acima de US$ 400 mil por indivíduo e US$ 450 mil para casais, dos atuais 35% para 39,6%. Os impostos sobre dividendos, ganhos de capital e heranças também vão aumentar para os ricos.

Ainda assim, nenhum dos dois lados do corredor ficou particularmente satisfeito com o acordo, que é visto como mero adiamento de maiores negociações orçamentárias que ocorrerão nos próximos dois meses, depois que o novo Congresso se reunir. Enquanto os republicanos foram forçados a aceitar maiores impostos de renda para os ricos e menores cortes de gastos do que exigiam, os democratas esperavam aumentar os impostos para rendas acima de US$ 250 mil.

Nesta quarta-feira (2), tanto os mercados europeus quanto os asiáticos pareceram reagir positivamente à notícia do acordo, que reduziu o risco da maior economia do mundo entrar em recessão.

Os editoriais alemães foram menos otimistas, porém, e alegaram que os jogos políticos em Washington estão prejudicando o país.

O jornal conservador "Frankfurter Allgemeine Zeitung" escreve:

"O rito anual de prazos expirando e acordos no meio da noite há muito se tornou uma farsa cansativa que ninguém mais está interessado em ver. O teatro político está prejudicando o país tanto internamente quanto no exterior. As queixas e a revolta estão crescendo entre as pessoas porque a liderança nacional em Washington não está conseguindo resolver os maiores problemas do país: a montanha de dívidas, o déficit orçamentário, o desemprego, a crise na educação, a decadência da infraestrutura e a explosão dos custos da saúde e previdência. Essa paralisia política pode sufocar a recuperação econômica. A dívida nacional, que hoje excede a produção do país, também ameaça a segurança nacional. O primeiro mandato do presidente Obama foi caracterizado pela procrastinação e pela retirada em política de segurança e política externa –do Iraque ao Afeganistão, da Líbia à Síria. E o que acontecerá  com o ‘processo de paz’ no Oriente Médio a com a primavera Árabe sem a liderança de Washington? Além do abismo o mundo enfrenta mais adversidade com uma potência mundial se abstendo da geopolítica."

O jornal conservador "Die Welt" escreve:

"Os políticos americanos gostam de fazer drama. Mas este drama não é apenas resultado de um teatro para mostrar para a base eleitoral que eles tentaram de tudo e que só cederam para evitar a catástrofe. De fato, os problemas fiscais dos EUA são tão complexos, e a divisão entre democratas e republicanos é tão profunda, que um acordo amplo nem foi possível no curto prazo após a eleição.

A questão do orçamento dos EUA não pode de fato ser resolvida apenas com aumentos de impostos para os ricos. Também exigirá cortes nas áreas de maiores gastos, que além dos militares envolvem os custos galopantes dos benefícios sociais. Em 2012, 44% do orçamento dos EUA serão destinados a pagar os benefícios sociais, seguros de saúde de aposentados (Medicare) e para os pobres (Medicaid). Como a população norte-americana está envelhecendo e cada vez mais pessoas entrarão para o Medicare, esse sistema não pode mais ser financiado na mesma escala que no passado. Essencialmente, os EUA estão mais europeus do que pensam os europeus ou os americanos. Por todo o Atlântico, a crise econômica abriu déficits estruturais de longo prazo. E aqui também, o mesmo fenômeno está emergindo: nas democracias pós-modernas ocidentais, o desejo dos cidadãos de receber benefícios sociais é mais pronunciado do que seu desejo de financiá-los com impostos mais altos.

O reconhecimento que as coisas não podem continuar sem que haja uma redução dos gastos sociais até agora foi evitado por Obama e seu partido. Agora, os democratas têm dois meses para serem francos com seus eleitores e acostumá-los a um fato simples: ou seja, que diante do que a maior parte das pessoas está disposta a pagar, o atual nível de gastos não é financeiramente possível."

O jornal de esquerda "Die Tageszeitung" escreve:

"Quase nada foi obtido, particularmente no que concerne a implementação da plataforma pela qual Barack Obama foi reeleito em novembro –mesmo que os republicanos não acreditem. …Em Washington hoje, a principal missão política é a obstrução. Todos os lados estão agindo como se a única forma concebível de política fosse constantemente depender de medidas de emergência em uma situação de pânico.

Será um pequeno milagre político se outros meios forem usados para resolver a próxima fase nos próximos dois meses, que envolve os cortes de orçamento e o aumento no teto da dívida. Talvez a queda no abismo pudesse ter ajudado as coisas nisso. Mas os políticos sabiam como impedir que isso acontecesse."

O "Berliner Zeitung", que tende à esquerda, escreve:

"Com certeza, Obama conseguiu salvar os benefícios para desempregados de longo prazo e evitou cortes de benefícios sociais e de saúde por enquanto, com o acordo do abismo fiscal. Mas a decisão final sobre os cortes está longe de ser feita. Haverá agora um ano de negociações sem fim sobre o teto da dívida e sobre as questões não resolvidas do orçamento. Os republicanos resolutos e fiscalmente conservadores continuam combatendo o presidente ainda hesitante, que continua sonhando com uma cooperação entre os partidos. Mas mesmo que Obama esteja finalmente determinado a combater a obsessão deles em cortar gastos, ele ainda terá que ajustar-se a governar com menos dinheiro em breve."

Um comentário:

  1. A cada dia que o poder econômico dos EUA encolhe, se tornam mais brutais no uso da força com medo de perderem espaço/moral/mando financeiros. Direitos Humanos se tornaram os maiores q não desrespeitam seus princípios, ou seja, se vc não os obedece vai para vala. Falar dos desrespeitos é perda de tempo, pq estão todos aí para quem quiser ver, mas internamente a coisa vai de mal a pior. Para contribuir c/a farsa não faltam atores, globo/abril/folha/estadão estão aí mesmo, mesmo assim encobrindo o descalabro econômico e não escrevem uma linha como esses jornais alemães. Mui amigos! " Política americana de hoje é uma "farsa cansativa" , muito bom o título, aliás em tudo que os EUA participam atualmente é uma grande farsa.

    ResponderExcluir