segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Nazistas mataram 165 por dia na Itália na 2ª Guerra, diz relatório

Monumento em memória das vitimas do nazismo na Itália em Sant'Anna di Stazzema

Cerca de 165 homicídios por dia. Essa é a terrível conclusão alcançada por uma comissão histórica que recebeu a tarefa de explorar toda a extensão dos crimes de guerra nazistas cometidos na Itália na Segunda Guerra Mundial. A identidade de muitos dos assassinos há muito é conhecida, mas até hoje pouco havia sido feito para levá-los à justiça.

Roberto Oligeri ainda mora na pequena aldeia na Toscana onde sua família foi dizimada. Os matadores entraram no pequeno vilarejo no dia 19 de agosto de 1944. Seu pai, que tinha uma pequena estalagem, foi forçado a servir uma refeição ao Strumbahnführer Walter Reder e seus homens. Enquanto jantavam um frango assado e vinho da região, os soldados da 16ª Divisão de Infantaria Mecanizada da SS vasculhavam a aldeia e a região reunindo mulheres, crianças e alguns idosos. Quando Reder acabou de jantar, ele deu a ordem para que todos fossem mortos.

"Naquele dia, 160 pessoas de nossa aldeia foram assassinadas, inclusive meus cinco irmãos –dois irmãos e três irmãs. O mais velho tinha 19, e a mais nova, apenas três", diz Oligeri.

Aldeias vizinhas passaram pela mesma experiência quando as tropas da SS espancaram, mataram e queimaram homens, mulheres e bebês naquele mês de agosto de 1944. Cerca de 560 pessoas morreram na aldeia Sant’Anna di Starzzema, só no dia 12 de agosto.

Os crimes nunca foram reparados, nem adequadamente estudados pelo Judiciário. Uma corte italiana sentenciou 10 dos brutamontes da SS envolvidos no massacre de Sant`Anna di Stazzema à prisão perpétua in absentia, mas a Alemanha nunca os extraditou. Recentemente, uma corte em Stuttgart recusou-se a perseguir o caso, dizendo que a intenção de matar não poderia ser provada.

A decisão irritou Oligeri, assim como uma série de fracassos similares da justiça o irritaram antes. Ele diz que os sobreviventes do massacre tiveram que lidar sozinhos com sua dor e seus pesadelos, enquanto os perpetradores voltaram para casa para uma vida normal e pacífica. Ele levou o caso a várias instâncias, mas nunca teve sucesso. Ele também escreveu inúmeras cartas a políticos e jornais. "Não queremos vingança", diz ele. "Queremos justiça".

Assassinos brutais
Talvez isso ainda demore. Na quarta-feira (19/12), um novo relatório foi divulgado sobre os crimes cometidos pela Alemanha durante sua ocupação da Itália pouco antes do final da Segunda Guerra Mundial. Historiadores dos dois países passaram quatro anos examinando fontes originais para determinar exatamente o que aconteceu na Itália depois que o governo fascista do país –até então aliado da Alemanha nazista- mudou de lado em setembro de 1943 e negociou uma trégua com os aliados.

Quanto mais difícil ficava a situação para as tropas alemãs na Itália, mais brutal se tornava seu comportamento assassino. Eles declararam mais de 600.000 soldados italianos "presos militares", negando-lhes o status de prisioneiros de guerra,  e os enviaram para a Alemanha ou os Bálcãs para fazerem trabalho forçado. Milhares morreram.

Os alemães também se lançaram sobre a população civil italiana com ferocidade homicida. Um exemplo é a "operação vingança" do dia 24 de março de 1944: cerca de 335 pessoas foram arrastadas para as grutas Ardeatinas perto de Roma e assassinadas. Depois, explodiram as grutas. Até hoje as vítimas estão enterradas ali.

Um historiador estima que, entre 8 de setembro de 1943 e 8 de maio de 1945, os alemães mataram em média 165 pessoas por dia, entre civis, prisioneiros de guerra e presos militares. Esse número não inclui vítimas de emboscadas entre o exército alemão e soldados ou guerrilheiros italianos. "O massacre foi organizado e seguiu um procedimento militar rígido", de acordo com Carlo Gentile, professor de história italiana da Universidade de Colônia. Os perpetradores são conhecidos, assim como suas unidades, seus comandantes e outras informações. E ainda assim, até hoje, há muito poucas condenações.

Por anos depois da guerra, interesses políticos ditaram que a questão, em grande parte, fosse ignorada na Itália. No conflito do pós-guerra entre o Leste e o Oeste, a Alemanha seria rearmada para que tivesse um papel significativo na nova Organização do Tratado do Atlântico Norte. Voltar a atenção para os crimes de guerra da Alemanha teria gerado substancial oposição entre a população italiana.

Sem veredito
Somente muito tempo depois, a pressão pública significativa forçou Roma a começar meia dúzia de inquéritos –e alguns perpetradores alemães finalmente foram punidos. Erich Priebke, por exemplo, um dos oficiais da SS que participou do massacre das grutas Ardeatinas foi condenado à prisão perpétua. Aos 99 anos de idade, ele ainda está vivo e está em prisão domiciliar em Roma.

Na Alemanha, contudo, nem um único veredito relacionado aso crimes de guerra cometidos na Itália foi executado.

O ressentimento na Itália ocasionalmente transborda. Esse foi o caso há quatro anos, quando a Alemanha recusou-se a pagar reparações aos parentes dos civis mortos em um caso na Corte Europeia de Justiça. Os Estados são "imunes" a tais cobranças civis, argumentaram com sucesso os advogados de Berlim.

Os italianos ficaram revoltados, e o governo alemão fez um esforço para demonstrar alguma compreensão. "O passado não resolvido da Segunda Guerra Mundial tem potencial para estremecer as relações entre a Alemanha e a Itália", disse Michael Steiner, que na época era embaixador alemão em Roma. Mas moralidade e justiça não devem ser confundidas, disse ele. Em uma tentativa de acalmar a situação, uma comissão histórica foi nomeada pra começar um "diálogo intenso de confiança".

Na quarta-feira (19), quando o relatório foi apresentado, o ministro de relações exteriores da Alemanha, Guido Westerwelle, disse que sentia profundamente pelos "crimes de guerra terríveis" cometidos pelos alemães na Itália. Ele também expressou compreensão pela revolta do público italiano sobre a decisão no caso contra os assassinos em Sant’Anna di Stazzema, disse ele.

Agora há planos para se fazer um memorial no lugar do campo de trabalho forçado no distrito de Niederschöneweide, em Berlim, em homenagem aos soldados italianos capturados pelos nazistas. Seria criado também um pequeno memorial na Itália.

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