sexta-feira, 16 de novembro de 2012

"Príncipes" do Partido Comunista ganham importância na política chinesa


Quando os maoístas tentaram manter o controle da China nos anos 70, um poderoso general do sul saiu em auxílio aos moderados, ajudando a prender os radicais e a colocá-los na prisão. As ações ousadas do general Ye Jianying abriram o caminho para a mudança do país para uma economia mais orientada ao mercado e criaram uma dinastia política que ainda coroa reis, é capaz de influenciar as políticas nacionais e protege seu vasto império de negócios no sul da China.

Ao longo do último ano, segundo pessoas de dentro do partido familiarizadas com a situação, os filhos de Ye –o general morreu em 1986 aos 89 anos– ajudaram a organizar encontros para criticar o atual curso do país, influenciaram importantes promoções militares e trabalharam para impedir que um forte reformista econômico ingressasse no Comitê Permanente do Politburo, o pequeno e poderoso grupo no topo da hierarquia do partido, por sentirem que ele não dava atenção aos seus interesses.

A ascensão dos chamados “príncipes”, como os da família Ye, culminará nesta semana, quando Xi Jinping, ele próprio filho de um pioneiro do Partido Comunista, for apresentado como líder da China na conclusão do 18º Congresso do Partido. Xi provavelmente será acompanhado por pelo menos dois outros príncipes no Comitê Permanente de sete membros.

Apesar da crescente controvérsia em torno do papel de destaque deles no governo e nos negócios –acentuado pelos recentes casos de corrupção, incluindo o que levou à queda de Bo Xilai, o antes poderoso príncipe cuja esposa foi considerada culpada de assassinato– os príncipes da China, que chegam às centenas, estão despontando como a classe aristocrática que tem uma importância cada vez maior no governo do país.

Apesar de brigarem e disputarem entre si, muitos príncipes já deixaram sua marca na ordem estabelecida, exercendo papéis importantes nos negócios, especialmente nas empresas estatais. Outros estão altamente envolvidos nas finanças e lobby, área onde os contatos pessoais são importantes.

Muitos dos mais velhos entre eles –aqueles que agora assumirão o poder– compartilham algo mais: uma criação durante alguns dos anos mais difíceis da China. Muitos eram crianças durante o Grande Salto à Frente, quando até 30 milhões de pessoas morreram de fome de 1958 a 1962, e adolescentes durante a Revolução Cultural, de 1966 a 1976, um período passado por muitos como párias ou no exílio, depois de seus pais terem sido atacados por maoistas radicais.

“Essa é uma geração volátil, uma que não teve uma educação sistemática e via frequentemente o pior lado da revolução comunista”, disse um importante jornalista do partido, que cresceu com alguns dos príncipes e pediu anonimato, por causa da pressão do aparato de segurança da China. “Eles aprenderam uma coisa, que você só pode contar com sua família.”

Os príncipes são diferentes dos atuais governantes da China, cuja maioria deve sua fidelidade às instituições do Partido Comunista. O secretário-geral do partido de saída, Hu Jintao, ascendeu por meio da Liga Jovem Comunista, um dos corpos-chave do partido.

Igualmente, o primeiro-ministro Wen Jiabao, que deixará o cargo no ano que vem, é um homem de organização, com poucas fontes externas de poder.

A legitimidade de Hu vem de ter sido nomeado por Deng Xiaoping, o último líder que teve um papel central na Revolução Chinesa e que foi uma figura dominante até sua morte, em 1997. Deng teve uma série de secretários-gerais e primeiros-ministros demitidos por ele até se fixar em Jiang Zemin, depois do levante de Tiananmen, em 1989. Posteriormente, ele deu sua aprovação a Hu como sucessor de Jiang.

“Sem Deng para resolver as questões, há a disputa pelos cargos mais altos”, disse um comentarista político chinês independente que falou sob a condição de anonimato, por estar sob observação da polícia durante o congresso. “Nós não temos eleições e não temos um sistema, então eles procuram pela pessoa com mais contatos.”

Isso ficou evidente cinco anos atrás, quando Xi foi escolhido para ser o sucessor de Hu. Inicialmente, o principal candidato era um dos protegidos de Hu, Li Keqiang. Mas Xi obteve um posto mais elevado, com a ajuda de outro príncipe, Zeng Qinghong, o então vice-presidente e filho de um ministro da segurança.

A carreira de Xi reflete seu status. Seu pai foi um alto líder do partido por meio século: comissário militar, governador, vice-primeiro-ministro e pioneiro das reformas econômicas, um retrospecto que ajudou a criar uma rede de apoio para Xi.

Seu pai arranjou uma vaga para ele em uma universidade durante a Revolução Cultural, quando poucos eram autorizados a estudar, depois garantiu emprego para ele como secretário pessoal de um importante líder militar do país. Posteriormente, quando ele estava trabalhando em um governo local e entrou em conflito com um líder provincial, sua família conseguiu que ele fosse transferido para uma província administrada por um amigo de seu pai.

Li, por sua vez, contava principalmente com suas afiliações partidárias formais e com o apoio de Hu, mas não com uma rede profundamente enraizada de poder familiar. Isso provou ser decisivo quando ele teve que competir com Xi pelo alto cargo. (Li deverá substituir Wen como primeiro-ministro.)

“Os líderes produzidos pelo 18º Congresso do Partido são a primeira geração que não foi nomeada” por uma figura como Deng, disse Zheng Yongnian, um cientista político da Universidade Nacional de Singapura.”É a primeira geração nomeada por disputa política.”

Os príncipes estão longe de formar um bloco uniforme. Muitos cresceram nos “grandes jardins” de Pequim –as amplas residências de ministros e organizações do Partido Comunista que definiram a capital nos anos 50, 60 e 70. Os filhos dos altos líderes estudavam juntos, brincavam juntos e, durante a Revolução Cultural, lutavam uns contra os outros nas facções da Guarda Vermelha, que lembravam gangues de cidades ocidentais.

Muitas dessas tensões repercutem até hoje. No ano passado, a família Ye ajudou a organizar um encontro dos príncipes cujos pais participaram na prisão em 1976 da Gangue dos Quatro, o grupo de maoístas que dominou a política nos últimos anos de vida de Mao Tse-tung e ameaçou manter o controle após a morte do ditador. Com a meia-irmã de Xi tomando nota, a família Ye e outros príncipes se reuniram para criticar a direção atual da China, dizendo que o Partido Comunista se tornou corrupto e distante do povo.

Mas a reunião ficou centrada na questão sobre quão longe poderia-se pressionar por mudanças políticas. As pessoas próximas de Hu Deping, o filho de Hu Yaobang, o secretário-geral reformista deposto por Deng nos anos 80, exigiam um relaxamento do domínio do partido sobre o governo e as empresas. Outras pessoas, incluindo as da família Ye, refletem a crença de seu patriarca no controle do partido e temem que mudanças possam minar seus laços lucrativos de negócios.

Esses laços são extensos, principalmente em Guangdong, perto de Hong Kong, onde estão em conflito parcial com o secretário do partido na província, Wang Yang, que prega contra a corrupção e o nepotismo.

Apesar de Wang, filho de um operário, não ter investigado a família Ye ou desafiado seu status, pessoas de dentro do partido disseram que ele não se preocupou o suficiente com os interesses dela para satisfazer a família. Desde o ano passado, alguns familiares começaram a sussurrar que Wang não era politicamente confiável, segundo membros do partido que falaram sob a condição de anonimato, por causa da natureza delicada da informação. Em parte por consequência dessa campanha, Wang não deverá estar no Comitê Permanente durante seu anúncio hoje.

Mas o corpo de governo da China estará repleto de príncipes.

Yu Zhengsheng, atualmente o secretário do partido em Xangai, tem um cintilante currículo familiar, que inclui parentes que serviram aos imperadores Qing e ao governo Kuomintang, assim como altos líderes na República Popular. Outro membro esperado, Wang Qishan, é casado com a filha de um líder poderoso, Yao Yilin. Um terceiro membro provável do Comitê Permanente, Zhang Dejiang, é filho de um general do exército, o que alguns analistas dizem que também o qualifica ao status de príncipe.

Os amplos contatos de Xi nas forças armadas e na burocracia podem lhe permitir agir de modo mais vigoroso do que Hu. Mas alguns analistas alertam que seus contatos com outros príncipes poderiam dificultar ações ousadas.

“Há muitos príncipes que se beneficiam com o sistema”, disse Zhang Lifan, um historiador em Pequim e filho de um ex-ministro. “Logo, há vários deles que não querem mudanças.”

Defensores da reforma do sistema, como Zhang, olham com desconfiança para a ascensão dos príncipes. Nos tempos do império, quando os imperadores e seus parentes governavam o país, o nepotismo era predominante.

Quando o Partido Comunista assumiu, os idealistas esperavam que ele acabaria com isso. “Mas por algum motivo, nós agora voltamos ao nepotismo”, disse Zhang. “E o país é governado por poucas famílias.”

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