sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Para ex-chefe da Liga Árabe, democracia no Egito já está sob risco


Amr Moussa
Milhares de manifestantes tomaram novamente as ruas do Cairo na terça-feira (27), em protesto contra os amplos novos poderes que o presidente Mohammed Morsi concedeu a si mesmo. O ex-secretário-geral da Liga Árabe, Amr Moussa, disse à “Spiegel Online” que o processo democrático em seu país está em grave perigo.

Spiegel Online - O senhor tinha agendado uma visita a Hamburgo na segunda-feira (26), para um evento conjunto com a “Spiegel” e a Fundação Körber para discutir a situação política em seu país. Por que o senhor cancelou?
Moussa - Eu peço desculpas por não poder ir. Mas a crise que o Egito está experimentando no momento está se agravando. Em um momento como esse, eu não posso deixar meu país. O Egito nunca esteve em um estado tão crítico em toda a minha vida.

Spiegel Online - O que o senhor considera mais desconcertante?
Moussa - Por exemplo, o fato do presidente Mohammed Morsi ter emitido um decreto constitucional saído do nada, que contradiz o processo democrático e lhe concede poderes quase ditatoriais. Outro exemplo, apesar de termos uma assembleia constituinte que supostamente deve escrever a nova Constituição do Egito, ela está dividida em dois campos fundamentalmente opostos: um islamita e outro composto por patriotas e democratas. O segundo se tornou muito menor porque quase todos os liberais abandonaram a assembleia em protesto.

Spiegel Online - O senhor anunciou sua intenção de criar uma frente coletiva de oposição a Morsi.
Moussa - Sim. No fim de semana, eu me reuni com vários líderes da oposição. Eles aceitaram minha proposta de criar uma Frente de Salvação Nacional, que lançamos oficialmente no sábado.

Spiegel Online - A revolução egípcia fracassou?
Moussa - Eu diria o seguinte: o que está acontecendo atualmente no Egito representa um grave risco para o processo de democratização em nosso país. A opinião pública nunca esteve tão polarizada quanto no momento.

Spiegel Online - O senhor chegaria a dizer que o Egito está caminhando para uma nova ditadura?
Moussa - Não parece que já tenha chegado tão longe. Mas alguns dos decretos emitidos pelo presidente são extremamente problemáticos e lhe concedem uma quantidade preocupante de poder.

Spiegel Online - Dada a situação, e dado que a oposição egípcia costuma ser profundamente dividida, quão promissor é o novo esforço para criar um movimento conjunto?
Moussa - Nós estamos no início, mas as chances são boas. Há um provérbio egípcio: “Alguns problemas são úteis”. O dilema atualmente enfrentado pelo país também oferece uma oportunidade.

Spiegel Online - Quais o senhor acha que são os motivos por trás da decisão do presidente?
Moussa - Essa é uma questão difícil. Nós não sabemos. Foram seus conselheiros? Foi a liderança da Irmandade Muçulmana? Ou foi ele próprio que teve essa ideia vergonhosa de colocar em risco a separação dos poderes? Eu espero que ele recobre o juízo porque, como presidente, ele já deve ter percebido as consequências de seus decretos.

Spiegel Online - As ações dele foram previsíveis?
Moussa - Não, nem um pouco. Eu me encontrei recentemente com o presidente Morsi e não vi nada que indicasse uma ação nessa direção. Outros que se encontraram recentemente com ele disseram o mesmo.

Spiegel Online - As mulheres egípcias devem temer agora a perda de seus direitos?
Moussa - As mulheres no Egito estão muito preocupadas com os valores políticos extremamente conservadores defendidos pelos islamitas. Os debates na assembleia constituinte são um bom exemplo dessa mudança de valores: eles estão discutindo, por exemplo, se as mulheres devem ser legalmente subordinadas aos homens.

Spiegel Online - O presidente, como ele afirma, realmente se desligou da Irmandade Muçulmana?
Moussa - Morsi continua sendo um membro da Irmandade Muçulmana. Mas ele também é o presidente e, desse modo, deve permanecer neutro. Como cidadãos egípcios, nós esperamos que ele seja capaz de reconhecer quais devem ser suas prioridades.

Spiegel Online - O senhor compartilha a opinião do ganhador do Nobel, Mohamed ElBaradei, de que “uma guerra civil pode estourar no Egito” caso os poderes moderados não tenham uma voz, como ele disse nesta semana à “Spiegel”?
Moussa - Alguns egípcios acreditam que uma guerra civil já começou. Mas gostaríamos de evitar esse cenário a todo custo. O presidente do país é responsável pela segurança geral. Ele deve demonstrar que é presidente de todos os egípcios e não privilegiar uma parte da população em detrimento de outra.

Spiegel Online - O senhor acredita que os protestos se tornarão violentos?
Moussa - Eu espero que o bom senso prevaleça. Nossa plataforma de oposição, de qualquer forma, pede por manifestações pacíficas; nós somos contrários à violência em todas as suas formas.

Spiegel Online - Que papel o Ocidente deve exercer?
Moussa - O Ocidente deve permanecer em segundo plano. Esta é uma crise puramente egípcia que nós egípcios devemos solucionar sozinhos.

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