terça-feira, 31 de janeiro de 2012

"Não superestime o pacto fiscal"


Em entrevista ao “Spiegel”, o chanceler austríaco Werner Faymann , 51, expressa dúvidas sobre a estratégia da Alemanha para combater a crise do euro, discute a possível necessidade de um pacote de resgate maior para a Grécia e diz que o Banco Central Europeu (BCE) talvez tenha que contribuir para o alívio da dívida de Atenas.

Werner Faymann


Pergunta: Senhor chanceler, a diretora do Fundo Monetário Internacional, Christine Lagarde, pediu que o fundo permanente de proteção do euro, o chamado Mecanismo de Estabilidade Europeu (MEE), fosse aumentado. A chanceler alemã Angela Merkel acha que é desnecessário. Quem está com a razão?


Faymann: Eu certamente não prometeria ao meu parlamento que podemos resolver tudo com $500 bilhões de euros. Meu governo está preparado para que o atual fundo de resgate Fefe e o MEE se combinem de forma que possamos erguer uma salvaguarda maior. Meu ministro de finanças, incidentalmente, concorda e, como Merkel, ela pertence ao conservador Partido do Povo Europeu.

Pergunta: O senhor quer que os bilhões que restam no Fundo de Estabilidade Financeira Europeu EFSF sejam combinados com o ESM?


Faymann: Devemos avançar nessa direção. Dessa forma podemos chegar aos $750 bilhões de euros. Os mercados financeiros estão nos vigiando de perto e julgam nossa situação pela altura de nossas proteções. Se forem baixas demais, então daremos aos mercados razão para especularem contra nós.

 Pergunta: Na reunião de cúpula da União Europeia em dezembro, o senhor disse que o Banco Central Europeu (BCE) deve ganhar “maior flexibilidade” para a intervir no mercado. O que o senhor quis dizer exatamente?


Faymann: Se conseguirmos aprovar os freios para a dívida nas constituições dos Estados membros e se mantivermos controles mais estritos em política orçamentária, então precisaremos dar o próximo passo e erguer maiores salvaguardas. Portanto, sou a favor que o MEE receba uma concessão bancária, permitindo que se refinancie com o BCE.

Pergunta: O governo alemão é veementemente contra.


Faymann: Tenho uma opinião diferente. É preciso dizer aos países que foram forçados a apertar os cintos quais serão os benefícios da proteção coletiva.

Pergunta: Para que a restrição da dívida seja ancorada na Constituição, como a Alemanha exigiu de todos os Estados membros da zona do euro, o senhor precisará do apoio da oposição.


Faymann: Nós aprovamos a restrição da dívida com maioria simples e acreditamos que a oposição, ou seja, os Verdes, estão fundamentalmente prontos para dar status constitucional à restrição da dívida.

Pergunta: Dentro da Comissão Europeia, diz-se que 95% das regras do pacto fiscal já podem ser resolvidas com a lei comum da UE. O pacto fiscal que está sendo promovido principalmente pelos alemães é meramente simbólico?


Faymann: Para mim é mais do que um símbolo. Mas mesmo que seja o caso, o fator decisivo é se tem as metas corretas. Queremos reforçar a competitividade e criar um crescimento duradouro. Queremos combater o desemprego entre os jovens. Ainda assim, não se deve superestimar o pacto fiscal. Com o espartilho apertado criado pelo Tratado de Lisboa, não se pode alegar que estamos reinventando a zona do euro.

Pergunta: Com essa agenda social-democrática, o senhor está em minoria entre os Estados da UE e os chefes de governo.


Faymann: De fato, essa agenda deve ser consistente com os valores cristãos democráticos ou socialistas cristãos. Vejo maiores diferenças com os neoliberais.

Pergunta: Em Davos, a chanceler Merkel disse que medidas mais rígidas são necessárias na Europa. Parece mais uma punição do que solidariedade.


Faymann: As regras não são positivas ou negativas. É tudo conteúdo. Eu acharia bom se regulássemos os mercados financeiros mais estritamente, cortássemos a especulação e fundássemos uma agência de classificação europeia. Sim, nossas altas dívidas nos tornam vulneráveis, mas os especuladores intensificaram a crise. Portanto, na forma do imposto de transação, eles também devem estar envolvidos na superação da crise.

Pergunta: Os bancos austríacos incorreram em perdas primariamente especulando na Europa Oriental. A Europa terá que intervir e ajudar?


Faymann: Na Áustria, nós também disponibilizamos capital aos bancos. Isso nos custou dinheiro, mas com tamanha crise, o Estado tem que intervir. Mas nós simultaneamente nos comprometemos a reforçar os controles para evitar uma próxima crise.

 Pergunta: É possível salvar a Grécia?


Faymann: Sim, mas apenas se o governo, o parlamento e o público grego quiserem. Se o país quiser continuar na zona do euro, devemos apoiá-lo. Isso não serve apenas para a Grécia, mas para todos. Precisamos evitar uma insolvência desordenada a todo custo. Nós austríacos já vimos recentemente como o efeito dominó pode se desenvolver rapidamente. Uma das três agências de classificação de risco nos rebaixou e fez uma referência explícita ao desenvolvimento da Europa como um todo.

Pergunta: Ninguém defende uma insolvência desorganizada, mas o que o senhor tem contra uma insolvência controlada?


Faymann: Todos os especialistas com quem converso dizem que não é possível prometer confiavelmente uma insolvência ordenada. O risco de contágio é incalculável. Poderia ser um experimento na vida real, e não devemos nos envolver em algo assim.

Pergunta: Os líderes da UE já estão negociando um segundo pacote de resgate para a Grécia. Não está na hora de ser verdadeiramente honesto com os cidadãos e dizer que os gregos não terão sucesso?


Faymann: Sou a favor de dizer aos gregos como podem resolver o problema. Nas conversas entre Atenas, a Comissão Europeia, o FMI e o BCE, todas as possibilidades estão sendo exploradas, especialmente o envolvimento de credores privados.

Pergunta: Mesmo que a Grécia e os bancos concordem com um alívio da dívida de 80%, os $130 bilhões de euros do segundo pacote de resgate não serão suficientes, porque os gregos estão atrasados em suas reformas. Vocês estariam dispostos a aumentar o pacote de resgate novamente?


Faymann: Não quero esvaziar as negociações. Mas é verdade que precisamos explorar reformas realistas. Não será de ajuda se definirmos o envolvimento do setor privado como objetivo político e ninguém executar isso no final. É por isso que tudo está sendo tão intensamente negociado. A decisão sobre os próximos fundos para a Grécia será tomada, no máximo, até meados de março. Mas eu não prometeria que não vamos precisar de mais fundos para a Grécia.

Pergunta: O comissário de assuntos monetários e econômicos europeu, Olli Rehn, disse que o pacote de resgate com certeza teria que ser aumentado. Os credores privados podem ter concluído do comentário que não terão que contribuir tanto. O senhor achou o comentário de Rehn útil?


Faymann: O que é mais produtivo é encontrar uma solução e depois apresentá-la. Eu teria preferido isso neste caso também. Por isso não identifiquei antes quantos pontos percentuais ou bilhões eu considero necessários.

Pergunta: O FMI exige que o BCE contribua para o alívio da dívida para a Grécia. O senhor concorda?


Faymann: Não acho que isso possa ser eliminado. Mas até que o cenário esteja completo, não faz sentido discutir cada peça do mosaico.

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