sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Tropas americanas no Afeganistão focam esforços contra ações da rede Haqqani

O primeiro helicóptero pousou na escuridão azul acinzentada antes do amanhecer. Mais de 20 membros de um pelotão de reconhecimento norte-americano e soldados afegãos que os acompanhavam correram através da poeira que se levantava, em direção a uma floresta com cheiro de sálvia e pinho.

Três outros helicópteros chegaram na sequência, e logo cerca de cem soldados estavam no chão deste vale elevado na província de Paktika, próxima à fronteira com o Paquistão. Eles estavam iniciando sua parte na operação para desfazer a rede Haqqani, o grupo insurgente que colabora com o Taleban e a Al Qaeda e se tornou o principal foco dos esforços contraterrorismo dos EUA desde que Osama bin Laden foi morto.

O grupo, com base na fronteira noroeste do Paquistão, envia guerrilheiros para o Afeganistão e já orquestrou uma longa campanha de guerrilha e ataques terroristas contra o governo afegão e seus aliados norte-americanos.

Suas ligações estreitas com o serviço de inteligência paquistanês, e a falta de disposição do Paquistão para tomar uma atitude contra a sede do Haqqani em Miram Shah, uma cidade não muito distante da fronteira afegã, foram condenadas por Washington e aumentaram as tensões entre os dois países que oficialmente eram parceiros no contraterrorismo.

Nesse contexto, o ataque de helicópteros em Charbaran na semana retrasada revelou tanto os falsos começos quanto o último conjunto de metas urgentes que orientam o envolvimento militar norte-americano no Afeganistão.

O Pentágono planeja retirar a maior parte de suas forças do país até 2014. As conversas entre muitos oficiais mudaram muito, passaram de discussões sobre estabelecer uma democracia afegã ou um governo robusto para uma ambição militar realista e pragmática: fazer o que pode ser feito no pouco tempo que resta.

O sentido tático, isso se traduz em tarefas diretas para as unidades que estão na linha de frente da segurança ao longo da fronteira. Enquanto ainda estão no pico em termos de número de soldados, os comandantes norte-americanos estão tentando acabar com o mais forte dos grupos armados antigoverno e colocar mais milhares de policiais e soldados afegãos nas áreas disputadas.

A ambição a longo prazo é que as forças afegãs terão a habilidade e a firmeza de se erguerem diante dos insurgentes quando os norte-americanos saírem.

E ainda assim, mesmo olhando para além de 2014, as unidades dos EUA precisam lutar uma guerra dia a dia.

Um elemento está em tentar evitar mais ataques cuidadosamente planejados como os que estremeceram Cabul, a capital afegã, várias vezes este ano. Os ataques – atingindo alvos importantes, desde o principal hotel da capital até a Embaixada dos EUA – foram com frequência organizados pelos Haqqani, e demonstraram a vulnerabilidade do governo afegão e a resiliência dos insurgentes.

O tenente coronel John V. Meyer, que comanda o Segundo Batalhão do 28º Regimento de Infantaria, que usou duas companhias para cercar o Vale Charbaran e uma terceira para varrer os vilarejos, chamou a operação de “um ataque agressivo para prevenir um ataque espetacular na área de Cabul”. O ataque também tem a intenção, diz ele, de reunir informações de inteligência.

O Vale Charbaran se tornou uma das principais rotas para os guerrilheiros Haqqani entrarem no Afeganistão. Eles normalmente chegam a pé, dizem oficiais norte-americanos, depois de passar a noite em casas seguras e acampamentos, e abrem caminho até Cabul ou outras áreas para onde são enviados para lutar.

Líderes Haqqanis de nível médio também se encontram nos vilarejos do vale, dizem oficiais norte-americanos, inclusive perto de uma escola abandonada e nas ruínas de um centro do governo que os Estados Unidos construíram no início da guerra mas que os guerrilheiros locais destruíram em 2008.

Em 2010, a última unidade convencional entrou no vale. A companhia de infantaria pousou de helicóptero e ficou presa num tiroteio de duas horas ao ir embora.

Quando os soldados norte-americanos e afegãos se espalharam desta vez, sua missão enfrentava uma lei familiar da guerra de guerrilha: quando as forças convencionais chegam em peso, as guerrilhas costumam se dispersar, deixando as armas de lado para ver os soldados passarem.

A operação provavelmente não foi nenhuma surpresa para os guerrilheiros Haqqani no vale, dizem os oficiais norte-americanos, porque durante os dias de preparação alguns dos soldados afegãos provavelmente deixaram escapar a informação de que o ataque estava prestes a acontecer.

À medida que os soldados subiam os morros, carregados com coletes de proteção e mochilas pesadas com água e munição – quase que imediatamente encontraram sinais da presença de guerrilheiros.

Na primeira casa que entraram, não longe da zona de aterrissagem, apenas duas mulheres e várias crianças estavam em casa. Os homens haviam todos saído.

Dentro, os soldados afegãos encontraram uma caixa de munição que serve tanto para metralhadoras PK quanto rifles Dragunov. Eles também encontraram duas bandoleiras e munição calibre 303 para os antigos rifles Lee-Enfield que continuam sendo uma arma comum entre os insurgentes.

O capitão Nicholas C. Sinclair, comandante da companhia, ordenou que os soldados afegãos confiscassem a munição. A mulher jovem protestou alto.

“Muitos soldados norte-americanos já estiveram aqui, e eles sempre deixaram tudo”, disse ela.

Isso muito provavelmente é uma mentira, disseram os norte-americanos. Um policial afegão embrulhou a munição. A companhia saiu da casa.

Mais tarde, a escola agora abandonada, que os Haqqani e guerrilheiros do Taleban obrigaram a fechar, os soldados foram recebidos por um bilhete escrito com giz branco acima da entrada principal.

“O Taleban é bom”, dizia o bilhete, em inglês.

Segundo os soldados, a escola era uma prova de uma derrocada anterior. De acordo com aqueles que implantaram a doutrina de contrainsurgência que passou pelo serviço militar norte-americano há alguns anos, construir escolas deveria ajudar a mudar a posição de vales como este.

Em vez disso, a escola foi fechada pelos mesmos guerrilheiros que ocuparam o centro do governo e espantaram a polícia para longe. Ela está vazia – um projeto de boas intenções que mudou de rumo, e de tempo e recursos perdidos antes que este último batalhão herdasse deveres na província.

Mais sinais dos guerrilheiros apareceram logo. No final do mercado de Charbaran, onde dizem que os guerrilheiros Haqqani e Taleban se reúnem, o 2º tenente Mark P. Adams, oficial de apoio ao fogo, bateu o olho numa pilha de madeira que estava sendo usada para camuflar uma bomba improvisada.

A arma – construída a partir de morteiros de 120 milímetros e 82 milímetros ligados a cerca de 4,5 quilos de explosivos caseiros – era poderosa o suficiente, mas não estava armada. Ela aparentemente havia sido escondida lá, mas com a intenção de ser levada para uma rua frequentada por soldados afegãos e norte-americanos.

O sargento Robert Blanco, especialista em explosivos, colocou uma pequena carga de explosivos contra ela e detonou a bomba no lugar.

Logo os soldados subiram uma montanha, juntando-se ao resto do batalhão, para dormir numa encosta mais alta e relativamente segura.

Na manhã seguinte, quando a vistoria foi retomada, um idoso, Ghul Mohammad, sentou-se com o tenente Tony E. Nicosia, líder do pelotão dos EUA, enquanto os soldados norte-americanos e afegãos vasculhavam as lojas pela segunda vez.

Há uma familiaridade ritual nesse encontro, fruto de uma guerra que já está entrando em sua segunda década.

“Quando vocês vêm aqui, isso é um grande problema para nós”, disse o ancião. “Porque depois que vocês vão embora, o Taleban chega e pergunta de vocês, e eles levam nossos alimentos sem pagar nada.”

Só a conversa não é suficiente para saber se isso é verdade; muitos moradores apoiam os guerrilheiros Haqqani e do Taleban, disseram soldados afegãos e norte-americanos.

Os soldados também disseram que pelo menos alguns dos homens reunidos em torno deles eram guerrilheiros, pelo menos parte do tempo, que deixaram suas armas de lado durante o breve período em que os norte-americanos tiveram uma presença forte no vale.

“Nós entendemos suas preocupações e esperamos trazer alguma segurança para cá”, disse Nicosia educadamente.

Ghul Mohammad assentiu. “Não posso fazer nada quanto a isso”, disse ele. “Quero que Deus traga segurança para cá.”

Os norte-americanos carregaram seu equipamento e começaram a andar em direção aos próximos prédios, do lado oposto do vale.

Durante a operação, guerrilheiros escondidos eram ouvidos ocasionalmente através do rádio que os intérpretes afegãos monitoravam em busca de informações de inteligência. Os guerrilheiros ameaçaram fazer uma emboscada contra a companhia de reconhecimento.

Depois que os soldados norte-americanos e afegãos chegaram à encosta oposta, os guerrilheiros organizaram seu próprio ataque: eles lançaram morteiros desde o lado de fora do cerco.

Os morteiros explodiram bem atrás dos soldados, perto da escola abandonada, não causando nenhum dano, mas deixando claro que Charbaran, que havia ficado praticamente em silêncio enquanto a companhia passou, continua fora das mãos do governo.

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