quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Argélia se sente ameaçada pela revolução na Líbia

bdelaziz Bouteflika é quem das as cartas
atualmente na Argélia
Com a chegada da esposa e de três filhos do coronel Gaddafi em suas terras, a Argélia terá dificuldades para desmentir as acusações de conluio com o antigo regime líbio lançadas pelo Conselho Nacional de Transição (CNT). Oficialmente, Safia, acompanhada de Mohammed, Hannibal e Aisha, os menos influentes dos descendentes de Muammar Gaddafi, atravessaram a fronteira entre a Argélia e a Líbia na segunda-feira (29) às 8h45, segundo comunicado do ministério argelino das Relações Exteriores.

Pouco antes, soube-se que havia sido fechada a fronteira entre a Argélia e a Líbia, com 2.000 quilômetros de extensão. Já no sábado, a agência egípcia Mena mencionava a passagem, na véspera, de um cortejo de Mercedes blindadas, tendo a bordo talvez o coronel Gaddafi, suscitando um desmentido categórico por parte de Argel.

Isso não ajudará nas relações já execráveis entre o CNT e o governo argelino. Os revolucionários líbios exigiram, na segunda-feira à noite, que os membros da família Gaddafi refugiados na Argélia lhes fossem entregues a fim de serem julgados. Argel fala em uma medida “humanitária” e “transitória”.

Apesar da queda do regime Gaddafi, Argel ainda não reconheceu o órgão político da rebelião líbia, ao contrário de seu rival marroquino. Essa reticência irrita o CNT, a ponto de seu porta-voz militar, o coronel Ahmed Omar Bani, declarar no domingo que os dirigentes argelinos “deverão responder por sua atitude algum dia”.

Argel lembrou que se ateria a uma “estrita neutralidade”. Foi nesse contexto de tensão e de acusações que o “primeiro-ministro” líbio e o chefe da diplomacia argelina, Mourad Medelci, se encontraram na segunda-feira, no Cairo, sem nada declarar.

Desde a tomada de Trípoli, Argel se encontra sob forte pressão. Os dirigentes do CNT não se esqueceram de que a Argélia – junto com o Sudão, a Síria e o Iêmen – haviam votado contra o apoio da Liga Árabe à resolução 1973 do Conselho de Segurança da ONU, que abriu as portas para a operação aérea da Otan. Por diversas vezes, os rebeldes acusaram Argel de deixar entrar armas e mercenários destinados às forças pró-Gaddafi, ou até de levá-los através de voos noturnos ou de barco.

Embora essas acusações nunca tenham sido provadas, Argel nunca escondeu suas reservas contra a revolução líbia, que abriu a porta para a Otan fora de sua área de ação habitual. No entanto, o coronel Gaddafi nunca foi amigo da Argélia. “As relações entre os dois países são muito ruins desde os anos 1970”, ressalta Akram Belkaid, jornalista e ensaísta argelino.

As ambições do Guia líbio no Sahel, onde se instituiu “protetor” das rebeliões tuaregues no Mali e em Níger, essas interferências no Grande Sul argelino e suas intervenções pró-Polisário no caso do Saara ocidental irritavam profundamente os generais argelinos, que consideram essas zonas como seu quintal.

O mais grave é que o coronel Gaddafi foi acusado diversas vezes pela imprensa argelina de entregar armas para os islamitas durante a guerra civil dos anos 1990.

Para Akram Belkaid, três razões explicam esse apoio paradoxal do governo argelino além do tradicional princípio de não-ingerência respeitado por Argel: “Primeiro, é sintomático de um país estagnado, cuja diplomacia está paralisada pelas lutas de clã em vista da sucessão do presidente [Abdelaziz] Bouteflika. Em segundo lugar, uma parte do governo argelino está realmente convencida de que o CNT está infiltrado pelos islamitas. Por fim, esse regime é contra qualquer ideia de mudança, de democratização ou de revolução, ainda menos pela violência.”

Para permanecer afastado do vento de protestos que tem soprado no mundo árabe, o governo argelino esbanjou desde o início do ano.

Paralelamente, o impressionante atentado contra a academia militar de Cherchell, o mais mortífero em anos, que causou a morte de dezesseis oficiais e de dois civis na sexta-feira, confirma os temores argelinos sobre a ascensão do jihadismo.

Além disso, o comunicado de reivindicação da Al Qaeda no Magreb Islâmico (AQMI) justifica seu ataque pelos “apoios [de Argel] ao regime de Gaddafi”.

Outra fonte de preocupação: as informações que revelam entregas de armas pesadas, a partir da Líbia, para os combatentes da AQMI instalados no norte do Mali, perto da fronteira argelina. Sem contar as centenas de combatentes tuaregues, de volta à terra natal depois de terem combatido como mercenários a serviço do coronel Gaddafi.

“Com a Otan na Líbia e o exército francês presente na Mauritânia para lutar contra a AQMI, a Argélia se sente sitiada”, observa Akram Belkaid. A imprensa e os partidos de oposição argelinos não se privaram de criticar a covardia do governo. “A Argélia tem o dever de estar ao lado da revolução líbia”, afirma o Movimento dos Direitos e das Liberdades (MDL). “Onde está a Argélia nesse encontro histórico? Ausente, tomada pela letargia!”, exclama o jornal “El Watan”.

Paradoxalmente, os duros ataques do CNT e a pilhagem da embaixada da Argélia em Trípoli, na noite de 21 de agosto, correm o risco sobretudo de unir a opinião pública argelina contra seu governo.

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