terça-feira, 16 de agosto de 2011

Engenheiro que trabalhou em quatro túneis de fuga no Muro de Berlim conta sua história

Muro de Berlim em 1989
Ulrich Pfeifer, um engenheiro que trabalhou em quatro túneis de fuga no Muro de Berlim, para se vingar do regime que prendeu sua namorada, lembra-se da indignação que sentiu quando o muro foi construído há 50 anos. Em sua opinião, o fato de as pessoas hoje posarem para fotos com uniformes falsos da Guerra Fria é de mau gosto.

Em 12 de agosto de 1961, a noite em que o Muro de Berlim foi construído, Ulrich Pfeifer, que morava do lado leste da cidade, estava passando a noite em Berlim Ocidental com sua namorada. Eles foram ao cinema no boulevard Kurfürstendamm, e voltaram para casa de trem, passando pelo cruzamento da fronteira em Friedrichstrasse por volta da meia-noite.

Eles não faziam ideia de que algumas horas mais tarde, veriam a si mesmos presos atrás de uma barreira de concreto que acabaria por separá-los, levando Pfeifer a arriscar sua vida construindo túneis de fuga numa busca pessoal por vingança contra o regime comunista.

Naquela noite, ainda era fácil passar entre os distritos leste e oeste da cidade, e os guardas de fronteira restringiam-se a checar aleatoriamente os passaportes.

“Nós não percebemos nada incomum. Não havia sinais do que estava prestes a acontecer algumas horas mais tarde”, disse Pfeifer, hoje com 75 anos, à Spiegel Online. “Quando eu acordei na manhã seguinte, um domingo, e ouvi as notícias no rádio, fiquei totalmente horrorizado. Eu achava que haveria um movimento de protesto como o de 17 de junho”, a revolta de 1953 na Alemanha Oriental na qual mais de 50 pessoas foram mortas.

“Então fui para o Portão de Brandenburgo com minha namorada”, lembra-se. “Mas não havia protesto, apenas muitos soldados e tanques nas ruas. As pessoas ficaram muito intimidadas para fazer qualquer coisa.”

“Pensamos em pular o arame farpado, mas não tivemos coragem. Voltamos para casa e passamos as próximas semanas procurando formas de sair.”

“Você não pode reconstruir o horror daquela época”

Pfeifer participará da principal cerimônia no sábado para celebrar o 50º aniversário daquele dia, quando soldados da Alemanha Oriental, a polícia e trabalhadores começaram a selar a fronteira entre Berlim Oriental e Ocidental para fechar a última abertura na Cortina de Ferra – uma medida desesperada para impedir um êxodo de jovens para o oeste.

Os eventos para marcar o dia foram encobertos por controvérsia quanto a Berlim estar se transformando no que os críticos chamam de uma “Disneylandia da Guerra Fria”, com atores com uniformes falsos de guardas da Alemanha Oriental posando para fotos em lugares como o Posto de Checagem Charlie no cruzamento da fronteira, a praça Potsdamer Platz ou o Portão de Brandemburgo. Políticos e historiadores estão reclamando de que essas atividades turísticas menosprezam a trágica história da divisão de Berlim.

Houve pedidos para que parte do Muro seja reconstruído, completo com todas as suas fortificações, para lembrar os berlinenses e turistas da sombria história da estrutura de 165 quilômetros responsável pela morte de centenas de pessoas.

“Acho de mau gosto a forma como as pessoas se vestem naqueles uniformes, mas é preciso ser tolerante, não é nada dramático. Não vejo motivo para proibir isso”, disse Pfeifer. “Mas não acho que devam reconstruir partes do Muro. Você não pode reconstruir o horror daquela época. Temos algumas partes originais do muro ainda em pé, e deveríamos deixar desse jeito. Se eles reconstruírem, isso de fato seria uma Disneylandia.”

Na noite de sábado, Pfeifer comparecerá a uma reunião de pessoas que fugiram da Alemanha Oriental e de outras como ele que permitiram que elas passassem o resto de suas vidas em liberdade.

Vingança contra o sistema

Pfeifer ajudou a construir quatro túneis sob o Muro. Era sua forma de se vingar da ditadura da Alemanha Oriental por ter prendido sua namorada.

Nas semanas depois de 13 de agosto de 1961, à medida que o muro estava gradualmente tomando forma, Pfeifer ouviu sobre uma forma de os dois fugirem para o oeste – através do sistema de esgoto da cidade. Naqueles primeiros dias, a Stasi, polícia secreta da Alemanha Oriental, não havia ainda conseguido fechar todas as rotas de fuga subterrâneas.

Funcionou para Pfeifer, que conseguiu fugir pelo esgoto com cinco outros em setembro. Mas o grupo foi limitado a apenas seis pessoas, então sua namorada teve que ficar para trás e se preparar para juntar-se a outro grupo alguns dias depois. Naquele momento, entretanto, a Stasi havia descoberto sobre a rota subterrânea, e a segunda fuga falhou. Duas pessoas foram pegas no subterrâneo. Sua namorada conseguiu sair e voltar para casa. Mas ela foi presa alguns dias depois, julgada e condenada a sete anos de prisão.

“Foi uma sentença insana”, lembra-se Pfeiffer. Depois ela foi comutada para três anos. Mas ele não a viu durante os próximos 27 anos. Depois, em 1988, ela se casou com outro homem e constituiu uma família no leste.

Em 1961, Pfeifer tinha 26 anos e era um engenheiro civil formado. Hoje morador do oeste de Berlim, ele decidiu colocar suas habilidades em prática para se juntar a um grupo de estudantes que cavava túneis para o leste.

Três iniciativas de túneis foram traídas e fracassaram. Mas uma foi espetacularmente bem sucedida. Ela foi concluída em setembro de 1962, depois de três meses difíceis cavando o solo argiloso, com um túnel que tinha 145 metros a partir de uma fábrica inativa no lado ocidental da Bernauer Strasse até o porão de um prédio de apartamentos no número 7 da Schönholzer Strasse do lado oriental.

Tensão e Medo

Pfeifer nunca se esquecerá de como se deitou no túnel apertado e úmido, rezando para que suas medições estivessem corretas e passou dez minutos desesperadamente tensos esperando a abertura do túnel do lado oriental – a parte mais arriscada da operação. Será que eles sairiam no prédio certo? Quando eles retirassem o último tijolo, será que estariam olhando para os canos das armas de agentes da Stasi esperando?

Sua pesquisa foi precisa. Ele ficou conhecido como “Tunel 29” porque 29 pessoas, principalmente amigos e parentes de 40 escavadores, escaparam por ele.

O túnel ganhou as manchetes mundiais e a Stasi só o encontrou 11 dias depois quando o o solo cedeu em algumas partes. Mas os escavadores só o utilizaram por dois dias, temendo que ele fosse rapidamente descoberto e porque ele estava se enchendo de água rapidamente por conta de um cano estourado.

“Foi uma sensação de alegria incrível. Senti tanta satisfação por ter feito algo contra um sistema que eu odiava”, disse Pfeifer.

Ele contará sua história numa sala de aulas no mês que vem. Ele quer ajudar a manter viva a memória daquela época, e acha a nostalgia que alguns ex-orientais ainda sentem pelo sistema que encarcerou e espionou seu povo “ridícula e triste”.

“Todo o período está desaparecendo na história. Mesmo a queda do Muro já tem 22 anos. Muitos jovens não a testemunharam”, disse Pfeifer. “Eu de fato espero que ela continue a ser ensinada nas escolas para que este período não seja esquecido.”

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