sexta-feira, 8 de julho de 2011

Taleban ameaça preencher vazio deixado com saída de soldados americanos

No Vale de Kunar, as retiradas anunciadas são bem aceitas, embora a qualidade das tropas de transição afegãs suscite dúvidas

O coronel Colin Tuley, com cabelo à escovinha, carrega seu ar afável por todo o posto avançado e olha com um ar melancólico o circo de montanhas que cerca a bacia. Desses flancos de pedras secas ouvem-se regularmente rajadas de metralhadoras PKM, versão modernizada da kalashnikov. Há talebans escondidos atrás de saliências rochosas. Os tiros estão distantes demais para mirar com precisão, mas são frequentes e destruidores o suficiente para lembrar os ocupantes da COP (combat outpost) Honeker-Miracle, escondida ao pé do maciço de Abas Ghar, na província oriental de Kunar, que eles estão em território inimigo.

Neste fim de mês de junho, agora que o presidente americano Barack Obama acaba de anunciar o início da retirada das tropas americanas a partir do verão, a guerra do Afeganistão continua em Honeker-Miracle. Teria o sul do país se estabilizado, relativamente? Novas frentes se abrem no oeste, ao norte, ou se aguçam no leste fronteiriço do Paquistão.

Nos vales cercados ou nas encostas de montanha da província de Kunar, os talebans consolidam suas posições, inexoravelmente. Oficial leal, o coronel Tuley não vai buscar ali material para contestar a decisão do presidente Obama, ao contrário de certos militares que consideram excessivos o porte (30 mil homens) e o ritmo (em doze meses) da retirada. “Era esperado”, diz ele, espalhando geleia em seu pão, durante o jantar no refeitório.

Esse início de retirada anuncia a transferência progressiva das tarefas de segurança para as forças afegãs, a exemplo do que aconteceu no Iraque. Por todo o país, as forças da Otan estão cercadas por unidades do exército e da polícia afegã. E estariam estas últimas prontas para assumir em breve, sozinhas, a segurança do Afeganistão?

Há uma metáfora que o coronel Tuley, chefe do batalhão Cacti da 25ª divisão de infantaria – normalmente com base no Havaí – adora: a da criança na bicicleta. “Você começa colocando as duas rodinhas de apoio, e depois as tira para que ela encontre sozinha o equilíbrio”, ele explica. “É isso o que está acontecendo aqui. Somos as rodinhas de apoio, e em breve seremos retirados. Se os afegãos estarão prontos até 2014 [fim do processo de retirada]? Acho que sim. Mas se continuarmos aqui, eles nunca estarão prontos. Tem um momento em que é preciso deixá-los, mesmo que às vezes seja difícil.”

O Exército Nacional Afegão já recuperou posições até então ocupadas pelos americanos por todo o Vale de Pech (Camp Blessing, Able Main) antes que este fosse evacuado pelas forças da Otan em 2010. A entrada do Vale de Pech está lá, bem perto. Uma brecha no maciço de Abas Ghar, um leito de cascalho polido pelas neves derretidas abrindo para um outro mundo: o Afeganistão das montanhas, isolado, resistente às ingerências do governo central. As notícias que chegam desses poucos postos avançados deixados para o exército afegão levam ao ceticismo. Os soldados sairiam pouco, enclausurados em sua casamata, e estariam sofrendo de falta de fundos. Correm boatos de que eles teriam vendido arame farpado e outros equipamentos deixados pelos americanos para cobrir suas necessidades mais urgentes. O coronel Tuley admite a dificuldade: “Se os afegãos estiverem com falta de recursos, então ali haverá um verdadeiro problema para manter a segurança.” E essa questão dos “recursos” corre o risco de se acentuar a médio prazo.

Isso explica o pessimismo de um suboficial, que falou sob anonimato. “Depois que sairmos”, ele diz, “as forças afegãs não resistirão, elas serão sobrepujadas pelos talebans. As únicas unidades que resistirão seriamente serão as forças especiais, mas não o resto do exército”. Para eles, a sorte já está lançada: “Obama fazer um discurso sobre a retirada quer dizer que perdemos a guerra.”

Ele também considerou “sábia” a decisão do presidente americano, pois ela reconhece a realidade. “Um certo número de nossos militares diz que é necessário tempo antes de se retirar, que ainda precisamos de um ou dois anos de contra-insurreição para consolidar nossas conquistas. Isso não mudaria nada. A verdade é que seria preciso permanecer pelo menos trinta anos. Mas a comunidade internacional não está disposta a um comprometimento como esse.”

Então sairão, mas e depois? Antes da evacuação do Vale de Pech, os americanos haviam se retirado do Vale de Korengal. Os talebans preencheram o vazio deixado. E nos confins do norte da província de Kunar vem amadurecendo um outro perigo, a província montanhosa do Nuristão, sobre a qual circulam os rumores mais alarmistas de um possível retorno da Al-Qaeda através do Paquistão. “Sim, no Nuristão há combatentes estrangeiros, árabes, mas eles não são mais do que algumas dezenas”, relativiza uma fonte da inteligência americana.

De acordo com a Otan, a evacuação desses vales distantes, indefensáveis diante de uma guerrilha que dispõe da vantagem das alturas, tem sua lógica: concentrar-se na defesa das cidades e dos grandes eixos viários. Na província de Kunar, o que importa para a Otan é a proteção da capital: Assadabad. “A partir de lá, podemos prever o surgimento de um perigo. A capacidade de previsão pode substituir a presença no local”, explica o coronel Tuley. Ou se as forças especiais têm condições de substituir os postos avançados evacuados. E como enterrar as ilusões do passado.

Um comentário:

  1. ate o seu totonho ja sabia disso,so que os americanos insistem em tentar enganar a opiniao publica mundial(incluindo eles proprios).

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